Os dados são da Federação Europeia dos Ciclistas. Lisboa aparece em quarto lugar, atrás da capital italiana, Roma, de Vaud, na Suíça, e de Bolonha, também na Itália.
Morando em Lisboa desde o ano passado, a geógrafa cearense Yumê Mota sempre utilizou a bicicleta como meio de transporte principal e diz perceber as mudanças na cidade. "Antes, eu ia disputando com carro, moto e elétrico. Agora não, tem a ciclovia que eles fizeram. Acho que as pessoas estão andando mais, o governo também está incentivando. Do ano passado pra cá melhorou", conta à Sputnik Brasil.
A ciclovia a que Yumê se refere fica na avenida Almirante Reis, uma das principais vias urbanas de Lisboa. A implantação da faixa exclusiva para bicicletas, no mês de julho, gerou muita polêmica. Enquanto os ciclistas comemoram, motoristas reclamam do menor espaço para o trânsito dos carros.
Controvérsias que poderiam ser resolvidas se houvesse uma "maior participação" de entidades ligadas ao ciclismo junto aos processos de definição e implantação das ciclofaixas, diz Pedro Sanches, da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta (MUBI).
"Com esse executivo temos visto a melhora da qualidade das ciclovias que vêm sendo construídas. Ainda assim há sempre coisas a melhorar. É neste sentido que achamos que poderíamos contribuir. Poderíamos opinar um bocadinho melhor sobre os tipos de solução que podem ser implantadas. Temos consciência que são pessoas competentes, mas enquanto associação teríamos todo gosto em ter uma participação mais ativa nas definições", diz Sanches à Sputnik Brasil.
Para a MUBI, o executivo municipal de Lisboa tem acompanhado a tendência de crescimento do número de usuários de bicicleta na cidade. "Este é um fenômeno, como dizemos, bola de neve. À medida em que as infraestruturas vão sendo criadas, os ciclistas vão aparecendo, porque sentem que há mais segurança no seu percurso. O aumento do número de ciclistas aumenta a necessidade de criarem mais ciclovias. De um modo geral vemos que a procura está a aumentar e a Câmara tem feito ações nesse sentido", analisa Pedro Sanches.
"A procura está gigante. Há um modelo específico de bicicletas elétricas que estão para chegar 25 unidades e já estão todas vendidas", conta à Sputnik Brasil Hugo Mendes Dias, vendedor da E-Bike Lovers, uma das lojas conveniadas ao programa.
Dias afirma que "a bicicleta veio ser o veículo da pandemia". Além da alta procura por novas, "muitas pessoas que tinham a bicicleta parada na garagem trazem para consertar".
O comerciante avalia que o momento é "excelente" para o setor, mas antecipa problemas. "A procura tem sido tanta que não há como dar conta. Os fabricantes estão condicionados pela compra de levas de material. Até agora estamos a usufruir do que havia em estoques. Grande parte do material de bicicletas não vem da Europa. Portugal é um grande fabricante e montador de bicicletas, mas as peças vêm de fora".
De acordo com dados do Eurostat, Portugal foi o maior fabricante de bicicletas da União Europeia em 2019, com 2,7 milhões de unidades fabricadas, quase um quarto de toda a produção dos 27 Estados-membros.
Durante a Semana da Mobilidade Europeia, realizada este mês de setembro, as autoridades portuguesas reforçaram o comprometimento com a relação entre mobilidade alternativa e redução da emissão de gás carbônico, mas especialistas questionam a execução das políticas.
"Existe vontade e algumas medidas estão sendo levadas à prática, nomeadamente em Lisboa e noutras cidades do interior. Mas se pensarmos que, no âmbito do Roteiro Carbónico apresentado à Comissão Europeia, o governo assumiu o objectivo de reduzir as emissões carbónicas dos transportes em mais de 40% até 2030, como meta intermédia para alcançar praticamente a neutralidade em 2050, vemos que falta ainda muito para fazer", afirma à Sputnik Brasil o pesquisador Nuno Bento, do Centro de Estudos Sobre a Mudança Socioeconómica e o Território do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa.
Nuno Bento é um dos autores de um estudo internacional publicado em abril na revista Science que mostra que tecnologias simples, como uso de bicicletas, são mais efetivas para se atingir a descarbonização.
"O estudo demonstra que as tecnologias mais granulares têm estado associadas nomeadamente a processos de difusão mais acelerados, mais rápida aprendizagem, menor risco e incerteza, e maior aceitação social. Isso são características importantes para a descarbonização. As bicicletas e as e-bikes são exemplos de tecnologias granulares. Elas podem ajudar a acelerar a transição sustentável pelo potencial que têm para uma rápida difusão, contornar o bloqueio ao sistema actual baseado no uso do automóvel individual e legitimidade social", explica o pesquisador.
*A reportagem preserva a ortografia do português europeu