Segundo estudo da rede de entidades internacionais Fair Finance, o setor financeiro europeu, principalmente Noruega, Alemanha e Holanda, investe mais de R$ 60 bilhões em 26 empresas do setor agropecuário brasileiro.
De acordo com o levantamento da Fair Finance, essa injeção de dinheiro está em risco, pois muitas dessas empresas poderiam contribuir para o desmatamento no Brasil. A entidade alerta que aumento dos incêndios no país pode contribuir não só para o aumento das barreiras aos produtos brasileiros, mas também para uma diminuição dos investimentos.
Por outro lado, a advogada ambiental Maria Cristina Gontijo, professora da Unisanta (Universidade Santa Cecília) em Santos, afirma ser preciso levar em consideração que muitos países têm interesse em uma campanha para "deslegitimar a sustentabilidade do produto brasileiro".
"Vamos lembrar que o Brasil ainda é um país responsável por grande parcela da agricultura sem desmatar sua área, o que não foi feito por países da Ásia e da Europa", afirmou a professora.
O argumento é parecido ao já usado pelo presidente Jair Bolsonaro para repudiar as críticas à política ambiental do governo. Em julho, em transmissão ao vivo nas redes sociais, ele disse que a "Europa é uma seita ambiental", onde "não preservaram nada". Segundo o presidente, os ataques de nações do continente ao Brasil eram injustos e frutos de "uma briga comercial".
'Brasil precisa cumprir acordos'
Por outro lado, Gontijo disse que o Brasil, "como Estado, firmou acordos internacionais de preservação da Amazônia, da biodiversidade e de diminuição da propagação de gases de efeito estufa".
"O Brasil precisa cumprir esses acordos, e a pressão internacional, se ela existir, vai existir para que cumpra esses acordos e prove que os está cumprindo. Se não cumprir, fato é que vai sofrer sanções internacionais", avaliou a advogada.
A especialista opina que, apesar da "tentativa" de associar o "produto brasileiro" ao desrespeito ao meio ambiente, "em realidade o empresário brasileiro quer cumprir" com normas de boas práticas no setor.
"Outra situação é o Brasil, como poder público, não auxiliar o seu empresariado a cumprir, ao exigir que as políticas públicas de preservação sejam cumpridas para respeitar esses acordos internacionais firmados", disse Gontijo.
'Incêndios não são todos criminosos'
Segundo a rede Fair Finance, 90% da vegetação primária perdida no Brasil nos últimos 35 anos foi devido a atividades agropastoris. Em contrapartida, o grupo aponta que, atualmente, estudo recente identificou que 62% do desmatamento ilegal na Amazônia está concentrado em 2% das propriedades rurais, embora o modelo predominante ainda seja o de expandir a área de pasto e plantação em detrimento do aumento de produtividade, o que preservaria a floresta.
Para Gontijo, o governo brasileiro "precisa de uma melhor comunicação com os países estrangeiros", para demonstrar "que vem tomando as medidas necessárias" para manter a biodiversidade do país. Segundo ela, é preciso "provar" essas ações e "reafirmar seu compromisso de preservação da floresta". Caso contrário, o Brasil "vai pagar por isso" e pode perder investimento internacional.
"É importante constar que os incêndios que estão ocorrendo e ocorreram no Pantanal e na Amazônia não são todos criminosos. Há sim incêndios criminosos, que precisam ser apurados, precisam ser combatidos, como vêm sendo combatidos, principalmente na região do Pantanal, por parte das autoridades", disse a professora.
'Mídia precisa auxiliar governo'
A advogada diz ainda que a mídia precisa ajudar o governo a divulgar as ações corretas que estaria praticando para a preservação do meio ambiente, o que não seria noticiado, segundo ela, por questões "ideológicas".
"O governo brasileiro precisa não só dar uma resposta para a comunidade internacional, mas reafirmar esse compromisso de preservação ambiental, comprovar que está tomando as medidas adequadas, e isso a mídia precisa auxiliar o governo também, porque, por conta de questões partidárias ou ideológicas, muitas vezes a mídia não noticia isso. E governo precisa estar alinhado para poder justamente blindar o empresário brasileiro que tem boas práticas ambientais, que não é um desmatador, que tem a sua produção certificada, que se utiliza de compliance ambiental na logística da entrega do seu produto", afirmou Maria Cristina Gontijo.