Na terça-feira (20), o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, anunciou acordo para a compra de 46 milhões de doses da vacina desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, que tem como fiador o governador de São Paulo, João Doria (PSDB).
Nesta quarta-feira (21), porém, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que o protocolo para compra do imunizante seria cancelado. Por meio das redes sociais, o chefe de Estado disse que "o povo brasileiro não será cobaia de ninguém" e "não se justifica um bilionário aporte financeiro num medicamento que sequer ultrapassou sua fase de testagem".
A VACINA CHINESA DE JOÃO DORIA
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) October 21, 2020
- Para o meu Governo, qualquer vacina, antes de ser disponibilizada à população, deverá ser COMPROVADA CIENTIFICAMENTE PELO MINISTÉRIO DA SAÚDE e CERTIFICADA PELA ANVISA.
- O povo brasileiro NÃO SERÁ COBAIA DE NINGUÉM. (continua).
Mais tarde, após visitar instalações da Marinha em Iperó, em São Paulo, ele confirmou que mandou cancelar o acordo, afirmando que não abria mão de sua autoridade.
Para o virologista Raphael Rangel, pesquisador do Núcleo de Doenças Infectocontagiosas da Unigranrio (Universidade do Grande Rio), a produção de uma vacina não deveria envolver questões políticas.
"As pessoas estão polarizando a doença. Na verdade, já está polarizada. Quando estamos na bancada desenvolvendo uma vacina ou algum tipo de pesquisa, fazemos isso única e exclusivamente para salvar vidas, e não com partidos políticos", disse o professor do curso de Biomedicina do IBMR (Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação).
Pressão de apoiadores
Segundo reportagem publicada no jornal Folha de S.Paulo, inicialmente Bolsonaro não se opôs ao acordo para a compra da vacina CoronaVac. No entanto, teria mudado de posição após repercussão negativa de seus apoiadores nas redes sociais.
"Essa polêmica só atrapalha o trabalho dos profissionais de saúde e os cientistas. Tudo que está ao nosso alcance com relação aos esforços para que as vacinas cheguem de forma segura à população estamos fazendo", criticou o virologista.
Rangel disse ainda que quando uma vacina chega à fase três de testes, como é o caso da CoronaVac, significa que ela "já é eficiente" e capaz de "produzir resposta imunológica".
Segundo ele, a vacina produzida pela Sinovac em parceria com o Butantan "tem mostrado resultados excelentes", com "pouquíssimas e brandas reações adversas".
"É uma vacina que usa uma metodologia que nós já conhecemos. A forma dela ser produzida usamos em outras vacinas. É uma vacina bem simples, que tem se mostrado eficiente", garantiu o pesquisador.
Vacinas russa e de Oxford
Rangel afirmou também que a vacina produzida pelo laboratório AstraZeneca, em parceria com a Universidade de Oxford, "enfrentou alguns problemas na fase três, mas já retomou os testes e está avançando". O governo federal assinou um acordo com a farmacêutica anglo-sueca para produção da vacina na Fiocruz.
Nesta quarta-feira (21), a Anvisa informou que um brasileiro que participava dos testes da vacina contra a COVID-19 morreu. O voluntário era médico e tinha 28 anos de idade. Segundo o jornal O Globo, ele teria tomado um placebo.
Outra vacina que está em testes no Brasil é da Sputnik V, desenvolvida na Rússia pelo Centro Nacional de Pesquisa de Epidemiologia e Microbiologia Gamaleya, com financiamento do Fundo Russo de Investimentos Diretos (RFPI, na sigla em russo).
Os governos do Paraná e da Bahia assinaram acordo com o RFPI, prevendo ensaios clínicos com voluntários e o fornecimento de milhões de doses da vacina. Na segunda-feira (19), o Fundo e a farmacêutica União Química celebraram acordo para permitir que a empresa produza no Brasil, ainda neste ano, a Sputnik V.
Primeira leva em maio e abril
Segundo previsão de Rangel, as primeiras doses de uma vacina contra o coronavírus começarão a ser aplicadas no Brasil em maio e abril do ano que vem.
"Tendo uma aprovação de vacina para os próximos meses e início de 2021, a vacinação vai ter o mesmo calendário da vacinação da gripe: idosos, população de risco e profissionais de saúde. Dificilmente conseguiremos vacinar a população inteira no ano que vem, isso vai ser um processo de 2,5 a três anos", disse o virologista.