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Sem Trump, Brasil se prepara para ser pária internacional, dizem especialistas

© AP Photo / Manuel Balce CenetaEm Washington, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (à esquerda), e o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (à direita), conversam na Casa Branca em 19 de março de 2019.
Em Washington, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (à esquerda), e o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (à direita), conversam na Casa Branca em 19 de março de 2019. - Sputnik Brasil
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Caso Donald Trump perca as eleições norte-americanas, o governo brasileiro pode acabar isolado externamente e enfraquecido internamente, acreditam especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil.

Nesta terça-feira, pesquisas de intenção de voto indicaram vantagem de 9,1 pontos percentuais ao candidato à presidência do Partido Democrata, Joe Biden, em relação a seu opositor e atual presidente dos EUA, Donald Trump.

De acordo com o portal especializado FiveThirtyEight, essa é a vantagem mais expressiva entre dois candidatos a uma semana das eleições presidenciais norte-americanas em 24 anos.

Nesse contexto, o governo brasileiro se prepara para eventualmente perder nos EUA uma administração que considera sua aliada.

O que o governo Bolsonaro tem a perder com uma eventual vitória de Biden? Quais serão os impactos para as relações entre Brasil e EUA? A Sputnik Brasil conversou com especialistas para saber a resposta a essas perguntas.

Alinhamento com os EUA

Para a doutora em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (UNESP/UNICAMP/PUC-SP) Lívia Milani, "há uma tentativa intensa de aproximação com os EUA por parte do governo Bolsonaro".

"Nos tornamos um aliado dos EUA extra-OTAN, o que formalizou nossa aliança militar-estratégica", explicou Milani à Sputnik Brasil.

Nesse processo, "assinamos acordo de salvaguardas tecnológicas para permitir a utilização da base espacial de Alcântara por empresas dos EUA", medida que seria "impensável" em governos anteriores.

© AP Photo / Eraldo PeresBrasileira realiza ato em apoio ao presidente e candidato à reeleição nos EUA, Donald Trump, na frente da Embaixada dos EUA em Brasília, 4 de outubro de 2020
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Brasileira realiza ato em apoio ao presidente e candidato à reeleição nos EUA, Donald Trump, na frente da Embaixada dos EUA em Brasília, 4 de outubro de 2020

Além disso, "o Brasil enviou um militar para trabalhar junto com o Comando Sul dos EUA, iniciativa que deve ser mantida se Biden chegar ao poder".

Para o professor da UFABC e coordenador do Observatório da Política Externa e da Inserção Internacional do Brasil (OPEB), Giorgio Romano, "as relações militares não devem sofrer impacto" em caso de mudança de governo nos EUA.

"O governo republicano atual dos EUA é muito carregado ideologicamente e o Brasil está alinhado a ele como nunca", disse a professora e coordenadora do programa de mestrado em Segurança da Universidade Torcuato Di Tella, Monica Hirst, à Sputnik Brasil.

© REUTERS / Nacho DoceMoradores de rua dormem embaixo do Minhocão próximo a grafite representando os presidentes de EUA e Brasil, São Paulo, 22 de julho de 2019
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Moradores de rua dormem embaixo do Minhocão próximo a grafite representando os presidentes de EUA e Brasil, São Paulo, 22 de julho de 2019

Esse alinhamento seria "feito dentro de uma nuvem ideológica, e não de um processo de negociações e de reciprocidades, que normalmente estão presentes em um alinhamento", acredita Hirst.

"É um alinhamento cego, que não tem fundamentação em interesses concretos", acredita Hirst, autora do livro "Brasil–Estados Unidos: desencontros e afinidades".

'Eu te amo'

Para os especialistas, a eventual saída de Trump da presidência poderá ter impacto na sustentação ideológica do governo brasileiro.

"Na pauta ideológica, Bolsonaro se espelha, se inspira e apoia os posicionamentos do Trump", disse Romano. "Bolsonaro parece estar sempre atento às ideias e posições do Trump para depois importá-las para o Brasil."

Durante a campanha eleitoral brasileira, Bolsonaro teria feito "conexões muito importantes com a direita estadunidense e com pessoas que eram próximas ao Trump".

"A própria escolha dos EUA como parceiro preferencial é motivada pela crença de que eles fazem parte do mesmo movimento global de ascensão da extrema direita", acredita Milani.

© AP Photo / Silvia IzquierdoManifestante usa máscara do presidente americano, Donald Trump, durante manifestação de apoio a Jair Bolsonaro no Rio de Janeiro (foto de arquivo)
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Manifestante usa máscara do presidente americano, Donald Trump, durante manifestação de apoio a Jair Bolsonaro no Rio de Janeiro (foto de arquivo)

Apesar da identificação mútua, o esforço de aproximação foi realizado com mais vigor por Bolsonaro em relação a Trump do que o contrário.

Essa assimetria teria ficado evidente "durante a Assembleia Geral da ONU [de 2019] quando o presidente do Brasil disse para o Trump que o amava", lembrou Milani.

Para Romano, o Ministério das Relações Exteriores formula a política externa brasileira com base na tese de que o país integra uma onda conservadora cristã liderada pelo atual presidente dos EUA.

"Com a saída de Trump, perde-se o líder, perde-se o farol", disse o professor.

Isolamento internacional

Com a perda de apoio dos EUA nas pautas mais conservadoras na arena internacional, o país corre o risco de ficar isolado.

"Quando um país como os EUA contesta a ordem liberal internacional, isso pode de fato gerar mudanças nessa ordem. Mas quando um país semiperiférico como o Brasil faz isso, o resultado é que esse país se transforma em um pária internacional", explicou Milani. "E isso não seria interessante para o Brasil de forma alguma."

Ela lembra que o Brasil já se encontra isolado na América Latina, uma vez que é "um dos poucos países sendo governado pela extrema direita na região".

"Vemos alguns indícios na região de que a extrema direita não conseguiu se consolidar, como as recentes eleições na Bolívia e a volta dos peronistas na Argentina", notou Milani.

© Foto / Reprodução InternetEm transmissão ao vivo no Facebook, Bolsonaro assiste pronunciamento de Trump
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Em transmissão ao vivo no Facebook, Bolsonaro assiste pronunciamento de Trump

Para Hirst, a eventual eleição de Joe Biden não deve aprofundar o isolamento internacional do Brasil.

"Já estamos muito isolados. Retoricamente, entrou para a ordem do dia de que ser pária não é um problema", comentou Hirst.

Caso queira evitar o isolamento, o Brasil poderá "amenizar sua política externa" para evitar "se contrapor" a uma possível administração Biden.

"Caso Biden ganhe as eleições e o governo Bolsonaro opte por uma amenização de sua política externa é inclusive possível que haja uma mudança na liderança do Ministério das Relações Exteriores", apostou Milani.

Brasil fora de foco

As especialistas concordam que o Brasil não será prioridade na política externa norte-americana em um eventual governo Biden.

"Do ponto de vista da política regional, o foco vai estar na América Central, na questão migratória e de segurança", disse Hirst.

Na América do Sul, Biden deve focar os esforços norte-americanos na Colômbia e na política de mudança de regime na Venezuela.

"O Biden é um dos formuladores do Plano Colômbia e tem conhecimento sobre a questão do narcotráfico, por isso terá uma relação importante com Bogotá", acredita Hirst.

© AP Photo / Eraldo PeresHomem participa de ação em apoio ao presidente dos EUA, Donald Trump, em frente à embaixada americana em Brasília, 4 de outubro de 2020
Sem Trump, Brasil se prepara para ser pária internacional, dizem especialistas - Sputnik Brasil
Homem participa de ação em apoio ao presidente dos EUA, Donald Trump, em frente à embaixada americana em Brasília, 4 de outubro de 2020

Segundo ela, "o Brasil é muito útil para os EUA nessa cartada da Venezuela e da Colômbia e tem sido funcional nesse sentido".

Se Trump perder as eleições, o maior prejuízo para governo Bolsonaro será na política interna, acredita Hirst.

"Para segmentos que apoiam Bolsonaro, perceber que a grande estrela internacional do atual governo caiu em desgraça pode ser um elemento que enfraqueça o governo internamente", disse a professora.

As eleições norte-americanas serão celebradas no dia 3 de novembro. Mais de 70 milhões de norte-americanos optaram pelo voto antecipado e 46,7 milhões votaram pelo correio, o que pode atrasar a divulgação dos resultados do pleito.

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