Produzido pelo laboratório Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, em São Paulo, o imunizante está na fase três de testes. No entanto, ao anunciar o calendário do plano nacional de imunização contra o coronavírus, na terça-feira (1º), o Ministério da Saúde não citou a CoronaVac entre as candidatas ao uso no país.
"Poderemos iniciar um programa em janeiro, acredito, de vacinação. E espero [que] com o apoio do ministério, apesar de todas essas declarações que não citam nominalmente a vacina do Butantan", disse o diretor do instituto, segundo o portal G1.
Para o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto, ex-diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a vacina, realmente, "tem tudo para estar pronta".
"Todas essas vacinas que estavam sendo testadas em território brasileiro têm tudo para estarem prontas no final de dezembro e início de janeiro, não há dúvida disso", disse à Sputnik Brasil o professor da Faculdade de Saúde Pública da USP.
Importantes fábricas de vacina no Brasil
De acordo com o governo federal, existem quatro estudos clínicos de vacinas no Brasil: além da CoronaVac, da Universidade de Oxford, em parceria com a farmacêutica britânica AstraZeneca; da Jansen-Cilag, divisão da farmacêutica americana Johnson&Johnson; e da americana Pfizer, em parceria com o laboratório alemão BioNTech.
Além disso, os governos do Paraná e da Bahia assinaram acordo para a realização de testes com a vacina russa Sputnik V.
Para o ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão, o Brasil tem forte tradição em políticas de vacinação, com um dos melhores programas de imunização do mundo, com bons exemplos no combate à H1N1, à poliomielite e à varíola, por exemplo.
"O Brasil usa 300 milhões de doses por ano no nosso programa de vacinação, temos duas das mais importantes fábricas de produção de vacina em termos globais, o Butantan e a Fiocruz", afirmou à Sputnik Brasil o médico sanitarista.
'Absoluta falta de coordenação'
No entanto, ele julga que a falta de coordenação, estratégia e a excessiva militarização do ministério, com "perda no foco da saúde pública", podem contribuir para o atraso do calendário de vacinação no país.
"O que estou percebendo é a absoluta falta de condução e coordenação da pasta em relação a todo esse processo, que está sendo mal dirigido e planejado desde o início. Como nós temos quatro vacinas sendo testadas no Brasil, há muitos meses nós deveríamos estar trabalhando [em] uma integração, [em] uma articulação dessas vacinas, no sentido de compor um portfólio de vacinas candidatas, que tão logo recebessem o registro da Anvisa, pudessem ser colocadas à disposição da população brasileira", disse Temporão, que esteve à frente da pasta de Saúde de 2007 a 2011.
São Paulo pode iniciar vacinação antes do país
Apesar de o diretor do Instituto Butantan acreditar que a CoronaVac estará pronta em janeiro, ao anunciar o calendário com as quatro fases de imunização contra a COVID-19, o Ministério da Saúde disse que o processo de vacinação só deve começar em março.
Para Temporão, será possível um cenário em que São Paulo inicie a vacinação antes do restante do país.
"Podemos correr o risco de São Paulo decidir imunizar sua população com a vacina do Butantan, com o governo federal desconsiderando o restante do contexto nacional, o que seria um disparate total. É um risco que se corre diante da falta de pulso, coordenação e legitimidade do ministro Eduardo Pazuello, que é totalmente estranho à saúde pública", afirmou Temporão.
Registro emergencial
O diretor do Butantan, Dimas Covas, também disse que a CoronaVac pode, inclusive, obter o registro sanitário completo, e não apenas o emergencial, até janeiro.
Na quarta-feira (2), a Anvisa disse que vai aceitar empresas desenvolvedoras de vacinas contra a COVID-19 solicitarem o uso emergencial no Brasil. Neste caso, a aplicação do imunizante é permitida, mas a vacina não pode ser vendida para a iniciativa privada.
O médico Gonzalo Vecina Neto acha que, devido à quantidade necessária de testes para formalizar o registro padrão, até janeiro só seria possível obter o registro emergencial. Isso, no entanto, não impediria a realização de um plano de vacinação.
Resistência à vacina chinesa
Sobre o fato do ministério não ter mencionado a vacina chinesa ao anunciar o calendário - o presidente Jair Bolsonaro vem criticando a CoronaVac e chegou a dizer que não compraria o imunizante - o especialista afirma que existem formas de pressionar o governo para usá-lo.
"Se, por acaso, a Anvisa atrasar a concessão de um registro, emergencial ou não, se com a documentação apresentada resolver procrastinar a emissão do registro, a lei será acionada e a agência terá que cumprir com sua obrigação", disse o ex-diretor e um dos fundadores da Anvisa.
Já o ex-ministro José Gomes Temporão afirma que o presidente diz "sandices o tempo todo", um "motivo de vergonha para o Brasil", mas que elas devem ser "ignoradas".
"Se a vacina obtiver registro da Anvisa, tem total condição de ser colocada à disposição dos cidadãos. Temos longa experiência em campanhas de vacinação em massa", disse o médico.