No ano que vem, a União Europeia entrará em um debate que pode trazer consequências para o Brasil.
Os deputados do Parlamento Europeu propõem obrigar qualquer empresa que exporte produtos para a União Europeia que prove que "seus produtos não vêm de terras desmatadas" e que forneça informações "transparentes" aos consumidores quanto ao cumprimento dos direitos humanos na cadeia produtiva, segundo noticiado pela AFP.
Helena Margarido Moreira, professora de relações internacionais e pesquisadora de política ambiental global, trata a medida como positiva e acredita que ela vai trazer mais pressão sobre o governo brasileiro quanto à proteção ambiental.
"[Esta pressão] vem crescendo à medida que as taxas de desmatamento da Amazônia, e outros biomas, também crescem. Temos tido notícias há algum tempo de boicotes de mercados europeus a produtos brasileiros advindos de desmatamento [...]. Isto, até o momento, não foi suficiente para fazer com que o governo brasileiro mudasse o rumo de sua política ambiental, que coleciona retrocessos", disse a especialista à Sputnik Brasil.
O relatório do Parlamento Europeu sobre a medida a ser discutida põe foco, inclusive, na devastação dos incêndios na Amazônia. Além disso, cita a importação de, entre outros produtos, soja e carne de boi – duas das principais commodities vendidas pelo Brasil à Europa.
"Mais de 60% da soja brasileira é exportada para a China, o que mostra que a pressão pode ter mais resultados se vinda em conjunto dos nossos maiores importadores de commodities", acrescenta Moreira.
O desmatamento da Amazônia apresentou uma alta de 9,5% no último ano. Segundo o Observatório do Clima, levando-se em conta a média dos dez anos anteriores à posse de Jair Bolsonaro, o desmatamento cresceu 70%.
'Não é simplesmente uma questão de subterfúgios para práticas protecionistas'
A especialista até considera que a possível medida possa demonstrar sinais de protecionismo europeu. Ela lembra que a Europa já utilizou "barreiras fitossanitárias" (o impedimento da entrada de um produto em um país alegando contaminação por bactérias e fungos, por exemplo) como forma de proteger a produção agrícola interna.
No entanto, a professora opina que, neste caso, a preocupação ambiental é o fator primário para a discussão da medida. Ela acredita, inclusive, que a relação entre meio ambiente e questões econômicas é uma tendência que veio para ficar.
"O mundo caminha, de uma forma geral, para economias menos intensivas no uso de combustíveis fósseis. Altas taxas de desmatamento de florestas e mudanças no uso da terra causadas pelas atividades agropecuárias vão na contramão desta tendência. Então creio que não é simplesmente uma questão de subterfúgios para práticas protecionistas, mas sim de uma reorientação das atividades econômicas", avalia Moreira.
A especialista acrescenta ainda que a "defesa da soberania nacional", frequentemente utilizada pelo governo federal como defesa para os ataques em relação à política ambiental, não está sob ameaça.
"[A soberania] não está sob questionamento, não se trata disso. Trata-se de definir alocação de investimentos, inovação tecnológica, adoção de padrões mais altos de sustentabilidade", finaliza Moreira.