Na quinta-feira (7), em conversa com grupo de apoiadores na porta do Palácio da Alvorada, em Brasília, o presidente Jair Bolsonaro disse que a falta de confiança nas eleições levou "a este problema que está acontecendo" nos Estados Unidos e que, no Brasil, "se tivermos voto eletrônico" em 2022, "vai ser a mesma coisa".
Na quarta-feira (6), a sessão de certificação do resultado da eleição de novembro foi interrompida após apoiadores do presidente Donald Trump invadirem o Capitólio. O episódio deixou cinco mortos e vários manifestantes foram detidos.
Para o cientista político, Paulo Silvino Ribeiro, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), a declaração de Bolsonaro é "infeliz" e "equivocada".
"Nas entrelinhas ela está estimulando e provocando as pessoas que se sentem minimamente encorajadas a fazerem uma loucura como essa que aconteceu essa semana", afirmou.
Chance de invasão ao Capitólio se repetir no Brasil 'é grande'
Diversas autoridades brasileiras se manifestaram sobre a invasão do Capitólio dos EUA.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), classificou a situação como um ato de desespero. O presidente do Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (DEM-AP), disse que o episódio merece "o repúdio e a desaprovação de todos os líderes com espírito público e responsabilidade".
Já o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que "apoiadores do fascismo mostraram sua verdadeira face: antidemocrática e truculenta".
Além das condenações públicas feitas por líderes políticos brasileiros e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a avaliação feita por vários deles nos bastidores, conforme publicou o blog do jornalista Valdo Cruz no G1, é que a invasão ao Capitólio dos Estados Unidos é um sinal de alerta para o Brasil evitar que o mesmo aconteça aqui.
Paulo Silvino Ribeiro disse que "todo país que tiver alguma manifestação de grupos que flertem com o autoritarismo corre o risco de ter um episódio como o que aconteceu nos Estados Unidos".
"No caso brasileiro, para ser mais específico, acredito que a chance seja grande. Haja vista o número de manifestações absolutamente antidemocráticas, como a gente viu e tem visto. Nós vimos várias manifestações contra instituições democráticas, contra o próprio Supremo Tribunal Federal, contra o Congresso Nacional, essa chance infelizmente existe para qualquer democracia contemporânea", declarou.
Em 2016, um grupo com cerca de 50 pessoas invadiu o plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília pedindo por intervenção militar. Houve tumulto e a sessão teve que ser suspensa e o local fechado.
Manifestantes pedem "general aqui, general aqui". Grupo invadiu plenário da Câmara e pede intervenção militar no Brasil pic.twitter.com/Xy1kFyL8wZ
— George Marques - #TheTrator 37 🇧🇷 (@GeorgMarques) November 16, 2016
'Autoridades brasileiras precisam ser firmes'
"As autoridades brasileiras precisam ser firmes, cumprirem a lei, defenderem a Constituição, e fazerem aquilo que reza a própria Carta Magna. Mais do que isso, elas precisam se fortalecer pela defesa da autonomia dos Poderes. As instituições não podem se constranger", disse.
Declaração de Bolsonaro 'estimula situação de anomia social'
Logo após a invasão do Capitólio dos EUA, Bolsonaro disse na quarta-feira (6) que é "muito ligado ao Trump".
"Eu acompanhei tudo hoje. Vocês sabem que eu sou ligado ao Trump, né? Então vocês já sabem qual a minha resposta", afirmou o presidente.
Para Paulo Silvino Ribeiro, as falas de Bolsonaro sobre a invasão do Capitólio não devem constranger as autoridades brasileiras, mas elas ajudam a criar uma divisão na sociedade que não é positiva para a democracia no país.
"A minha preocupação não é com as instituições democráticas em si, claro elas precisam ser preservadas, a questão é a sociedade civil. Os discursos de ódio levam também ao discurso da negação da política e que vai, portanto, estimulando candidaturas como as que a gente viu em 2018", declarou.
Segundo o cientista político, a declaração de Bolsonaro é "maléfica à democracia" e estimula a população a agir de maneira truculenta.
"A gente precisa tirar o Bolsonaro dessa posição de algo jocoso porque ele não é só isso. O que ele fala é perigoso, o que ele fala é ruim, estimula uma situação de anomia social", afirmou.