Após o colapso do sistema de saúde do Amazonas, em 17 de janeiro, com a escassez de oxigênio nos hospitais, o governo do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (sem partido), buscou doações do insumo por nove dias junto aos EUA. Conforme publicou o jornal Folha de São Paulo na terça-feira (26), o esforço com os norte-americanos ainda não obteve êxito.
Ao longo desse período de negociação com os EUA, porém, a Venezuela enviou três remessas de oxigênio líquido para Manaus. Os envios foram autorizados pelo presidente venezuelano Nicolás Maduro, desafeto de Bolsonaro.
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Para Rafael Araújo, professor de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e especialista em política e história da Venezuela, as doações venezuelanas têm objetivos políticos ao mesmo tempo que refletem uma visão particular sobre as relações internacionais.
"É uma tentativa de Maduro de transparecer para a opinião pública brasileira e latino-americana uma outra imagem, desconectada daquela imagem de ditador que ganhou forma, em especial na nossa mídia, nos últimos dois anos", avalia o professor em entrevista à Sputnik Brasil.
"Ao mesmo tempo, em termos políticos, se insere em uma visão acerca das relações internacionais que, de certa forma, sempre pairou no governo venezuelano de Hugo Chávez e que se perpetua no governo do Maduro: a ideia da integração", afirma.
Os pedidos sem sucesso de ajuda aos EUA, teriam também influência do momento de mudança de governo no país, o que coloca "freios" sobre algumas negociações diplomáticas, segundo o professor. No dia 20 de janeiro, Joe Biden assumiu a Casa Branca no lugar de Donald Trump.
"Além disso, há toda uma questão de logística. De fato, em termos de logística, é mais fácil o oxigênio vir da Venezuela do que dos Estados Unidos", acrescenta Araújo.
Gesto de Maduro não mudará postura do governo Bolsonaro com a Venezuela
O professor da UERJ recorda que as tratativas com a Venezuela têm acontecido sem a intervenção do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, um dos órgãos de governo mais críticos do país em relação ao presidente Nicolás Maduro. O pesquisador lembra que o atual chanceler brasileiro é um dos ministros mais alinhados à chamada ala ideológica do governo Bolsonaro.
"Como o Brasil não reconhece também o governo de Nicolás Maduro, isso coloca o Brasil em uma sinuca de bico, vamos colocar assim. Como receber oxigênio de um governo com o qual o Brasil não dialoga e não reconhece a legitimidade? É uma situação sine qua non que a gente está vivendo nesse apoio da Venezuela ao estado do Amazonas", diz o professor.
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Para o pesquisador, o gesto humanitário do governo de Maduro não causará aproximações entre os países, uma vez que Bolsonaro tem na narrativa contra a Venezuela um dos pilares do apoio de suas bases políticas.
"As rusgas entre os dois mandatários tendem a se perpetuar, inclusive, pela postura de Jair Bolsonaro, que até agora não agradeceu a Nicolás Maduro pelo apoio. E vendo o Bolsonaro nesses dois anos de mandato, acho pouco provável que ele em algum momento agradeça à Venezuela", avalia o pesquisador.