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Analista: Bolsonaro promoveu Lira a 'primeiro-ministro' e terá que dividir poder com centrão

© Folhapress / Pedro LadeiraO presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, em Brasília
O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, em Brasília - Sputnik Brasil, 1920, 03.02.2021
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Longe de ser uma vitória de Bolsonaro, a nova configuração do Congresso tende a fortalecer o centrão, grupo para o qual o presidente deverá perder poder em nome da governabilidade nos próximos anos, avalia cientista político ouvido pela Sputnik.

Nesta semana, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados definiram a composição de suas mesas diretoras para o biênio 2021-2022. Esses parlamentares ajudarão os presidentes das duas casas, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e Arthur Lira (PP-AL), no comando dos trabalhos no Congresso Nacional ao longo desse período. Mas tanto em uma como na outra, as definições desses cargos ocorreram em meio a polêmicas e disputas entre partidos da base e também de oposição.

Na Câmara, após assumir a presidência, Lira tomou como primeira medida desintegrar o bloco formado por dez partidos que apoiou o seu adversário, Baleia Rossi (MDB-SP), na disputa pelo cargo, alegando atraso na formalização do grupo. Como a distribuição das vagas da mesa é feita de acordo com o tamanho dos partidos e dos blocos, a medida reconfigurou a divisão das cadeiras.

Assim, a eleição para compor a Mesa Diretora da Casa, que seria realizada na segunda-feira (1º) e depois foi adiada para terça-feira (2), acabou ocorrendo apenas nesta quarta-feira (3), após um acordo selado pelo presidente da Câmara com a oposição para evitar que esta travasse as votações. Desta forma, a composição da mesa — cujas atribuições incluem gestões administrativas e orçamentárias — ficou da seguinte forma:

1ª vice-presidência: Marcelo Ramos (PL-AM);
2ª vice-presidência: André de Paula (PSD-PE);
1ª secretaria: Luciano Bivar (PSL-PE);
2ª secretaria: Marília Arraes (PT-PE);
3ª secretaria: Rose Modesto (PSDB-MS);
4ª secretaria: Rosângela Gomes (Republicanos-RJ);
Suplentes de secretários: Eduardo Bismarck (PDT-CE), Gilberto Nascimento (PSC-SP), Alexandre Leite (DEM-SP) e Cássio Andrade (PSB-PA). 

​No Senado, embora tenha sido costurado um acordo para preencher quase todas as vagas da Mesa Diretora da Casa, foi necessário realizar uma eleição, na última terça-feira (2), para definir o primeiro-vice-presidente. Isso porque o MDB, na qualidade de dono da maior bancada, defendia o direito de ter um senador do partido ocupando esse cargo. No entanto, o PSD, partido do último primeiro-vice, Antonio Anastasia (MG), reivindicou o direito de manter o espaço que já tinha na gestão anterior, levando em consideração também o fato de ter sido um dos primeiros partidos a apoiar a candidatura de Rodrigo Pacheco

Por conta dessa disputa, foi realizada então uma votação entre Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) e Lucas Barreto (PSD-AP), vencida pelo emedebista com 40 votos. Com isso, ficou desta forma a composição no Senado:

1ª vice-presidência: Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB);
2ª vice-presidência: Romário (Podemos-RJ);
1ª secretaria: Irajá (PSD-TO);
2ª secretaria: Elmano Férrer (PP-PI);
3ª secretaria: Rogério Carvalho (PT-SE);
4ª secretaria: Weverton (PDT-MA);
Suplentes de secretários: Jorginho Mello (PL-SC), Luiz do Carmo (MDB-GO) e Eliziane Gama (Cidadania-MA). A última vaga ainda não foi definida. 

'Bolsonaro comprou um primeiro-ministro'

Apesar das disputas e divisões envolvidas nas eleições para presidentes das casas legislativas, a expectativa para a Câmara dos Deputados é a de que a cisão observada nos últimos dias fique rapidamente para trás, com Arthur Lira e o chamado centrão conseguindo ditar o rumo das pautas. Essa é a visão do cientista político Márcio Coimbra, professor-coordenador da Pós-Graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie em Brasília.

"Tudo leva a crer que nós teremos uma união forte desses 302 parlamentares [que votaram em Lira] em torno das pautas do centrão. Dentro especialmente dessa coabitação que vai haver entre centrão e governo Jair Bolsonaro em alguns cargos da administração pública", afirma o especialista em entrevista à Sputnik Brasil, destacando que partes do MDB e de outros partidos tendem a se juntar a esse grupo em vários temas. 

A liderança de Lira, na opinião do professor, pode ser descrita como uma "acomodação" que consolidou a sua capacidade de "entregar suas promessas" e uma maior "organicidade" e força da Câmara dos Deputados frente ao governo e às pautas desses tantos parlamentares que decidiram apoiá-lo.

"Rodrigo Maia [ex-presidente da Câmara] foi traído de certa forma, mas foi uma traição anunciada. Porque ele já sabia, de antemão, que não conseguiria liderar esse número de deputados que estavam apoiando Baleia Rossi."

Considerando as novas configurações de poder no legislativo, Coimbra pontua que, ao contrário do que alguns possam imaginar, que essa composição representaria uma grande vitória do presidente Bolsonaro, o que deve acontecer na prática é uma concentração maior de poder nas mãos do centrão. 

​"Dentro desse jogo político que nós vemos no Brasil, quem ganha é o centrão e quem perde são as pessoas que votaram em Jair Bolsonaro pensando que ele defenderia pautas mais alinhadas com aquilo que se imaginava, que ele prometeu em campanha. Por exemplo, uma não coabitação com o centrão, uma aproximação com os Estados Unidos, uma defesa da Lava Jato... Ou seja, uma série de promessas que Jair Bolsonaro não conseguiu cumprir dentro da sua presidência."

Para o cientista político, cada vez mais, Bolsonaro perderá forças justamente para seus aliados do centrão. 

"Ao centrão, é um jogo que muito lhe interessa. Porque é melhor Bolsonaro não sofrer um impeachment, não ficar fraco demais a ponto de cair, mas não forte demais a ponto de enfrentar o centrão. Ao balizar esse cálculo, o centrão consegue se fortalecer e se transformar no maior instrumento da governabilidade e da estabilidade do governo Jair Bolsonaro nos seus últimos dois anos."

Nesse sentido, a expectativa do professor é a de que o Planalto tenha um relacionamento mais tranquilo com o Congresso daqui em diante, desde que Bolsonaro cumpra as promessas feitas a esse grupo político

"Portanto, Jair Bolsonaro comprou uma sociedade, uma coabitação e, mais do que isso, Jair Bolsonaro comprou um primeiro-ministro, a existência de um primeiro-ministro indemissível. Ou seja, hoje, o poder no Brasil não está plenamente nas mãos de Jair Bolsonaro, mas dividido entre ele e Arthur Lira. O presidente, que gosta de dizer que sua caneta sempre tem muita tinta, pode dizer hoje que a sua caneta perdeu um pouco de tinta e que essa tinta se transferiu para a caneta do presidente da Câmara dos Deputados."  

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