Estes documentos revelam que, em novembro de 1973, a rainha temia que um projeto de lei permitisse que civis examinassem suas finanças, uma vez que esta legislação visava à transparência das participações das empresas.
Em particular, o projeto pretendia evitar que os investidores acumulassem secretamente participações consideráveis nas empresas cotadas na bolsa, adquirindo suas ações através de companhias fantasmas. Incluía uma cláusula que concedia aos diretores o direito de que qualquer nominado que possuía ações em nome de terceiras pessoas revelasse a identidade de seus clientes.
Levando em consideração a existência deste projeto de lei, a monarca enviou seu advogado privado para que pressionasse o governo, obrigando-o a introduzir certas mudanças, escreve o jornal britânico. Matthew Farrer, que na época era sócio do escritório de advocacia Farrer & Co, foi quem visitou os funcionários do Departamento de Comércio e Indústria para discutir as medidas de transparência propostas na lei.
Depois da intervenção da rainha, escreve The Guardian, o governo britânico introduziu uma cláusula que conferiu a faculdade de excluir as empresas utilizadas pelos chefes de Estado de vigência das novas medidas de transparência.
"Com ajuda do Banco da Inglaterra, meu departamento desenvolveu as seguintes soluções, que aparecerão no projeto de lei", escreveu o então secretário de comércio, Geoffrey Howe, a um ministro.
Como resultado das negociações, os lados criaram a corporação Bank of England Nominees Limited operada por altos funcionários do Banco da Inglaterra. Esta corporação teria colocado um véu de secretismo sobre as participações e os investimentos da rainha.
Além do mais, Elizabeth II podia recorrer a um procedimento parlamentar arcano, conhecido como o consentimento da rainha, para influenciar a formação das leis britânicas. Diferia-se da aprovação real com o fato de dever ser solicitado antes de o Parlamento dar luz verde.
Como regra, ministros alertavam a rainha quando uma legislação poderia afetar a prerrogativa real ou os interesses privados da coroa.
Em fevereiro de 1974, o então primeiro-ministro Edward Heath convocou eleições gerais que acabaram suspendendo toda a legislação que estava sendo debatida no Parlamento. A proposta foi ressuscitada pelo posterior governo de Harold Wilson e foi convertida em lei em 1976.
Acredita-se que as ações que pertenciam à rainha foram transferidas a Bank of England Nominees Limited em abril de 1977, segundo livro do jornalista Andrew Morton de 1989.
A extensão ajudou supostamente a esconder a fortuna privada de Elizabeth II, que poderia ter aumentado em centenas de milhões de dólares até 2011. Naquele ano, o governo britânico revelou que já não cobria esta entidade, que foi fechada cerca de seis anos mais tarde. Até agora, não está claro o que exatamente aconteceu com as ações que esta corporação dirigia em nome de seus clientes privados.
Thomas Adams, especialista em direito constitucional da Universidade de Oxford, que viu os documentos consultados por The Guardian, ressaltou que se revela "um nível de influência com o que os grupos de pressão apenas poderiam sonhar".
O Palácio de Buckingham não respondeu a nenhuma pergunta quanto à pressão exercida por parte da rainha e relembrou que o processo relacionado ao consentimento da rainha limita o papel de Elizabeth II à pura formalidade.
"O consentimento da rainha é um processo parlamentar, com papel de soberania puramente formal. Consentimento é sempre garantido pela monarca quando requerido pelo governo. É o Parlamento que decide quando é necessário o consentimento da rainha [...] em assuntos que afetariam os interesses da coroa, incluindo os bens e os interesses pessoais da monarca", assegurou o porta-voz de Elizabeth II, citado pelo The Guardian.