A análise é feita pelos especialistas Robson Valdez, pesquisador do Núcleo de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Brasília, e Gisele Ricobom, professora de direito internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
"A América Latina tem sido, até hoje, uma prioridade secundária para a política externa norte-americana, pois eles [norte-americanos] efetivamente enxergam a região como sua área de influência regional. Ou mais precisamente: seu quintal", afirma Valdez, em entrevista à Sputnik Brasil.
A porta-voz do Departamento de Estado norte-americano para a América Latina, Kristina Rosales, afirmou que o Brasil "é um aliado" dos Estados Unidos, e que os dois países mantêm "uma amizade bem firme". As declarações foram feitas em entrevista à BBC Brasil, publicada nesta quinta-feira (11).
Valdez avalia que a relação entre Brasil e EUA é, de fato, uma relação de proximidade, construída em parceria ao longo dos anos, sempre sendo observado cada momento histórico. No atual momento, Bolsonaro, que sempre mostrou sua predileção aos EUA na política externa, terá de fazer vista grossa para as diferenças que apresenta com Biden em diversas agendas, como a ambiental e a de direitos humanos.
"É provável que o governo brasileiro sinta-se compelido a aderir a determinadas alianças ou acordos. Trata-se do poder relativo, de coerção política e econômica, dos EUA que se explica pela sua capacidade de fazer com que um país faça algo que normalmente não faria", explica Valdez.
Além da entrevista de Rosales, outros sinais de aproximação dos EUA em relação ao Brasil foram demonstrados nesta semana. Nesta segunda-feira (8), a secretária de Imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, afirmou que o governo Biden pretende aumentar os laços comerciais dos EUA com o Brasil nos próximos meses.
Já o chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, postou nesta quinta-feira (11) um tweet em que fala sobre uma "longa e positiva conversa" com o secretário de Estado norte-americano Antony Blinken.
Tive hoje longa e produtiva conversa com o Secretário de Estado Antony Blinken. Agenda 100% positiva. Ficou claro que há excelente disposição e amplas oportunidades para continuarmos construindo uma parceria profunda entre o Brasil e os Estados Unidos.
— Ernesto Araújo (@ernestofaraujo) February 11, 2021
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Ricobom destaca que "a política externa dos Estados Unidos sempre será de defesa dos interesses nacionais". Por isso, ela argumenta que estratégias de aproximação como estas são para fortalecer as áreas norte-americanas de influência, em especial visando a guerra comercial contra a China.
"Não se pode esperar uma resistência mais aberta ao governo autoritário do Bolsonaro, mas apenas críticas pouco contundentes da questão ambiental como já sinalizado na campanha presidencial de Biden", diz Ricobom, em entrevista à Sputnik Brasil.
'A relevância do 5G no Brasil pode se sobrepor às demais agendas'
Um importante capítulo da guerra comercial entre Estados Unidos e China está no leilão da rede 5G brasileira, que ocorrerá neste ano. A chinesa Huawei desponta como favorita – mas os Estados Unidos não devem jogar a toalha facilmente. Valdez avalia que, como estratégia para manutenção de influência no Brasil, a guerra tecnológica com a China pode ganhar ainda mais força.
"Como as agendas entre os dois países são interdependentes (comércio, investimento, segurança, etc.), o sucesso de uma agenda conjunta pode depender da negociação estabelecida em outra agenda. Nesse sentido, a relevância do 5G no Brasil pode se sobrepor sobre às demais agendas entre os dois países", avalia o especialista.
Nesta sexta-feira (12), os Estados Unidos demonstraram estar em alerta com o avanço diplomático de países rivais em diferentes áreas. Na vacinação contra a COVID-19, por exemplo, dezenas de países adquirem as vacinas da Rússia e da China, levando a porta-voz do governo Biden a dizer que a Casa Branca observa "essas ações com preocupação".
Já no setor tecnológico, os Estados Unidos acusam a China de manter uma conduta "predatória" e até de interferir na democracia de outros países.