Os números revelam que a COVID-19 voltou a crescer consideravelmente no Brasil. A ocupação de UTIs chegou a marca de 80% em mais da metade dos estados brasileiros.
Temendo pelo pior, o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Carlos Lula, divulgou ontem (1º) uma carta com sugestões de medidas urgentes contra o iminente colapso das redes pública e privada de saúde.
Para compreender o atual cenário pandêmico no Brasil, assim como o que pode ser feito para evitar uma catástrofe, a Sputnik Brasil conversou com exclusividade com o especialista em segurança pública José Ricardo Rocha Bandeira, que também é presidente do Conpej (Conselho Nacional de Peritos Judiciais).
Para ele, não há mais tempo para pensar em alternativas, o "Brasil precisa de um lockdown nacional" antes que entre em colapso total.
O toque de recolher do Executivo
O Conass sustenta que o Brasil vive pior momento da pandemia, com patamares altos em todas as regiões. A entidade também defende que seja criado um Plano Nacional de Comunicação para esclarecer a população da gravidade da situação.
O especialista ouvido pela Sputnik Brasil concorda com as demandas do órgão, e defendeu a instituição de um lockdown como medida efetiva no combate à disseminação do vírus.
Segundo ele, "concordo com essa preocupação dos secretários estaduais de saúde, e concordo que devemos efetuar esse recolhimento, tendo em vista que, todos os países que estão sofrendo ondas graves da pandemia, têm tomado esta decisão, e ela se mostra extremamente eficaz no combate à pandemia do coronavírus. Não existe outra forma mais eficaz e efetiva de combater a COVID-19 do que com um lockdown e um toque de recolher".
SUS a beira do colapso
A carta do Connas foi divulgada no momento em que o país bate recordes consecutivos de mortes e casos, e dias depois de o presidente Jair Bolsonaro ter criticado o uso de máscaras como medida de prevenção ante a COVID-19.
Para José Ricardo Rocha Bandeira, a ideia do Conass pode afastar a possibilidade de colapso iminente do sistema de saúde "porque, ao reduzir e impedir a circulação, a gente diminui a carga de contato, e consequentemente as pessoas contaminadas".
"O objetivo do isolamento é sempre esse: evitar que uma grande demanda de pessoas recorra aos serviços de saúde ao mesmo tempo", sentenciou o especialista.
Para ele, é urgente a necessidade do Brasil em reduzir a demanda dos órgãos de saúde. "Dentro de algumas semanas, isso alivia a sobrecarga e permite que o sistema de saúde se reestruture para receber novos pacientes", afirmou.
O polêmico lockdown nacional
O presidente Jair Bolsonaro, em mais de uma ocasião, enfatizou que está de mãos atadas ante uma decisão do Supremo Tribunal Federal sobre medidas de isolamento social ficarem à cargo de governadores e prefeitos.
O vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) disse nesta terça-feira (2) que "não adianta" implementar um isolamento nacional para frear avanço da COVID-19 no Brasil. Segundo Mourão, a realidade de cada local deve ser avaliada no momento de decretar um possível lockdown.
José Ricardo Rocha Bandeira, no entanto, entende esta questão de modo distinto. Para ele, "as medidas nacionais são importantíssimas para conter a pandemia, tendo em vista que não se pode ter ações isoladas de cada estado".
Ele defendeu que "é necessário ter um plano nacional para que a gente tenha uma maior eficiência no combate à COVID-19. Não adianta um estado realizar determinadas medidas de contenção, e o estado vizinho não seguir estas medidas. A mesma coisa acontece com municípios vizinhos. Um plano nacional é fundamental porque homogeniza o combate ao coronavírus. Ou seja, todos os estados atuariam em conjunto, de modo que um cidadão não possa passar de um estado para o outro".
Quem controlará o toque de recolher?
Após ter explicado a importância de medidas nacionais para conter a pandemia da COVID-19, o entrevistado foi confrontado com uma pergunta importante: quem será capaz de controlar e fazer valer um toque de recolher?
O especialista entende que "a fiscalização dessas medidas emergenciais deve ser feita, além da polícia, pelas guardas municipais e pelo corpo de bombeiros, os agentes fiscalizadores municipais e estaduais. Além, é claro, do emprego das forças armadas, que podem ajudar a manter efetivamente as medidas de isolamento da população. É preciso um esforço conjunto".
A delicada questão nas favelas e periferias do Brasil
Ao explicitar seus argumentos sobre o uso das forças de segurança para promover uma espécie de toque de recolher pelo país, o entrevistado revelou que há problemas com esta lógica, principalmente em áreas controladas pelo tráfico de drogas e pela milícia.
"Nessas áreas em que o tráfico de drogas [e também a milícia] exerce o controle territorial, é necessário que se faça a intervenção policial. Não podemos pensar de outra forma, talvez até com apoio das forças armadas, como foi feito na intervenção federal aqui no Rio de Janeiro", defendeu.
"Ações conjuntas das polícias civil e militar, apoiadas pelas forças armadas, podem romper esse domínio territorial armado e ajudar a manter a fiscalização", concluiu o especialista em segurança pública.