Em discurso durante a cúpula dos 30 anos do Mercosul nesta sexta-feira (26), o presidente Jair Bolsonaro defendeu a revisão da Tarifa Externa Comum (TCE) e a redução de barreiras não tarifárias, falou em flexibilização e sobre a necessidade de ampliar a "rede de negociações comerciais extrarregionais", criticando a regra de consenso nas decisões.
Segundo o chefe de Estado brasileiro, tais medidas seriam necessárias para modernizar o bloco e recuperar participação relevante nos fluxos comerciais e econômicos.
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— Carlos Jordy (@carlosjordy) March 26, 2021
Essa ideia de flexibilização, defendida também pelos atuais governos do Uruguai e do Paraguai, é vista por alguns analistas como uma ameaça à própria existência do Mercado Comum do Sul. Isso porque, ao priorizar acordos comerciais bilaterais e parcerias com Estados de outras regiões, o bloco acabaria por perder o seu sentido, com cada membro defendendo interesses individuais em detrimento dos coletivos.
"O presidente brasileiro, desde a sua eleição, tem adotado uma política externa voltada para outros parceiros, para além do aspecto regional", afirma, em declarações à Sputnik Brasil, o professor de relações internacionais William Daldegan de Freitas, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
Para o especialista, as críticas de Bolsonaro estão muito pautadas pela paralisação das negociações do bloco com outros países — Canadá, Coreia do Sul, Índia, Líbano e Singapura — em abril do ano passado, quando o governo argentino resolveu concentrar esforços e atenções na crise desencadeada pela pandemia do novo coronavírus. Na ocasião, Brasil, Paraguai e Uruguai tentaram convencer os argentinos a retomarem essas atividades, mas sem sucesso.
A #SputnikExplica mostra como o Mercosul se encontra após três décadas de existência e as implicações das propostas de "flexibilização" do blocohttps://t.co/owhL1KTFIc
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Duas potências regionais, Brasil e Argentina têm tido dificuldades de entendimento nos últimos anos devido a diferenças ideológicas entre seus presidentes e à preferência dada pelo governo brasileiro à cooperação com outros países, destaca Daldegan.
"Eu entendo que alcançar o consenso em grupos menores tende, ao menos teoricamente, ser menos difícil do que em grandes grupos. Afinal de contas, se a gente olha para o Mercosul, são quatro parceiros. Então, haveria uma expectativa de que uma maior afinidade pudesse ser construída entre esses parceiros. E é algo que a gente tem notado ser mais difícil, sobretudo com essa política externa que defende mais posições unilaterais ou bilaterais, um certo distanciamento do aspecto regional e uma série de outros elementos que têm sido questionados sobre a capacidade de o Brasil de fato liderar a região."
A liderança regional do Brasil, muito presente desde o início deste século até meados da década passada, deixou de ser um fato indiscutível, segundo o professor, dificultando ainda mais essas relações.
O Mercosul vive um período de letargia pela falta de interesse do governo de Jair Bolsonaro, mas tem todo o potencial para recuperar sua vitalidade, afirmou o ex-chanceler Francisco Rezek, que participou da assinatura do Tratado de Assunção há 30 anos https://t.co/aYzo37s0hH
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Pensado como uma forma de complementar as economias regionais, o Mercosul, ao longo do tempo, acabou proporcionando uma competitividade entre setores produtivos. E o Brasil, em uma posição de superávit em relação aos seus parceiros comerciais, ao propor uma simples redução tarifária, arrisca prejudicar setores estratégicos da economia argentina, gerando sérias preocupações em Buenos Aires.
"Por que, então, Uruguai e Paraguai estariam posicionados a favor do Brasil? Muitos alegam, e eu acho que é uma visão simplista, uma maior afinidade na questão dos governos. Mas, se a gente olhar mais a fundo, mesmo com uma revisão, Paraguai e Uruguai, a não ser que fossem mudadas as listas [de exceções] e o tratamento diferenciado que eles recebem, eles teriam algum ganho ocasionado por isso. Seja diplomático, seja na própria revisão dessa Tarifa Externa Comum."