Nesta quinta-feira (8), especialistas debateram as relações entre os BRICS e a União Europeia em seminário organizado pelo Clube Valdai de Discussões Internacionais.
As relações entre a Europa e diversos membros do BRICS, como Brasil, Índia e África do Sul, foram historicamente marcadas pelo colonialismo.
"A Rússia diverge dos demais países do BRICS, uma vez que enfrentou e enfrenta conflitos em fase aguda com a Europa", notou o diretor do programa Política Externa da Rússia da Escola Superior de Economia de Moscou, Dmitry Suslov.
"Atualmente, a Rússia já não trata a Europa como um 'outro significativo'. Suas relações com a China, Índia e Brasil não são mais usadas como moeda de troca para seu relacionamento com o Ocidente", notou Suslov.
Além disso, "a Rússia nem sempre enxerga a Europa como um ente independente, mas sim como um ator fortemente influenciado pelos EUA".
Para ele, diferente da União Europeia, os BRICS garantem um espaço de diálogo equitativo entre os membros.
"As relações entre os países do BRICS representam exatamente o que a Rússia espera de uma nova ordem mundial: policentrismo, diversidade e respeito às diferenças", disse Suslov.
O diretor do Clube Valdai, Timofei Bordachev, concordou, dizendo que "no BRICS nenhum país pode impor seu ponto de vista a outro, nem se portar de maneira hegemônica, ao contrário do que vemos em alguns organismos ocidentais modernos".
"Os BRICS representam o tipo de relações entre países que queremos ver no século XXI", resumiu Bordachev.
Pedra no sapato
Apesar do potencial, um dos maiores obstáculos para maior integração entre os países do BRICS é a rivalidade entre Índia e China.
"Mesmo que a China seja o maior parceiro comercial da Índia, essas relações econômicas não estão se traduzindo em um melhor relacionamento político", disse a pesquisadora Nivedita Kapoor, da Observer Research Foundation, à Sputnik Brasil.
"Para que as relações comerciais possam garantir melhores relações políticas, é necessário que essas relações econômicas sejam relativamente equilibradas", disse Vasily Kashin, pesquisador da Escola Superior de Economia de Moscou, à Sputnik Brasil.
"O volume de comércio entre China e Índia é enorme, mas geram um déficit considerável para Nova Deli", notou Kashin. "Para fazer da economia uma base para as relações políticas, as partes terão que trabalhar muito."
Para Kapoor, "uma relação comercial forte não é o suficiente" para aplacar a rivalidade sino-indiana.
"Os acontecimentos no leste de Ladakh, que ocorreram no meio da pandemia, realmente estremeceram as bases políticas das relações entre Índia e China", disse Kapoor.
Entre junho e julho de 2020, soldados da China e da Índia entraram em confronto na região contestada de Ladakh. Além de vítimas, o conflito gerou uma onda de provocações mútuas, notícias falsas e desconfiança.
"A Índia atualmente tem uma forte percepção de que a ascensão da China como potência representa uma ameaça a sua segurança, especialmente porque [Pequim e Nova Deli] têm disputas territoriais."
China e Índia não possuem fronteiras claramente delimitadas tanto na região de Ladakh, quanto na Caxemira, onde o contencioso ainda envolve o Paquistão.
"Os russos devem entender isso bem, uma vez que suas relações com a China só deslancharam depois de resolvidas as disputas fronteiriças", notou a especialista, fazendo referência aos conflitos sino-soviéticos de 1969 na parte leste da fronteira entre os países.
Para ela, "existem questões de segurança que não podem ser sanadas pelas relações econômicas".
"Por isso, a Índia está agora colocando sob escrutínio rígido os investimentos chineses no país, inclusive na questão sobre a [tecnologia] 5G", lembrou Kapoor.
De acordo com Kashin, "esses problemas poderiam ser resolvidos através do diálogo, mas as partes precisariam estar prontas para fazer concessões, o que nem sempre é o caso".
A rivalidade entre Índia e China exigirá "trabalho diplomático árduo" por parte dos BRICS, concluiu o especialista.
Nesta quinta-feira (8), especialistas em relações entre os países do BRICS se reuniram em Moscou para debater os rumos do agrupamento e apresentar um relatório sobre suas relações com a União Europeia.