É o que aponta um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais em conjunto com acadêmicos de Harvard, Princeton e Universidade do Sul da Califórnia. A prévia da pesquisa – que ainda precisa passar pelo crivo de outros pesquisadores – foi publicada em 9 de abril.
Em entrevista à Sputnik Brasil, Leonardo Bastos, que é estatístico, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e membro do Observatório COVID-19 Brasil, afirma que expectativas de vida só caem em ocasiões de eventos muito significativos, como guerras.
Os números atuais no Brasil, portanto, são comparáveis com os das guerras. Países como os Países Baixos e a então Tchecoslováquia – ambos invadidos pela Alemanha nazista – somam respectivamente 301 mil e 345 mil mortes na Segunda Guerra. O Brasil já tem mais de 362 mil mortes pela COVID-19.
"Então o que a gente está vendo agora é algo comparável com uma guerra. É horrível falar isso, mas é a verdade. A expectativa de vida está caindo, e deve ficar ainda pior, porque o estudo considera apenas 2020. [...] A gente não vai ver uma queda na expectativa de vida na Nova Zelândia. É certo que isso não vai acontecer. Enquanto aqui já está acontecendo. E vai cair mais", afirma Bastos.
Segundo o especialista, a queda pode ser ainda maior do que a indicada pelo estudo: a pesquisa considera apenas as mortes causadas pela COVID-19. Bastos explica que, além dos óbitos com outras causas, que naturalmente continuam acontecendo, muitas outras mortes que poderiam ter sido evitadas em uma situação de normalidade acabam acontecendo em virtude do colapso do sistema de saúde.
"Em um acidente de trânsito, por exemplo, a pessoa vai para o hospital e não consegue ter o melhor atendimento porque o hospital está lotado. E aí aquele óbito que seria totalmente evitável em 2019, agora em 2021 já não é tão evitável assim. […] A gente provavelmente vai observar um aumento da mortalidade extra-COVID-19, que vai impactar nesta expectativa, fazendo com que ela fique menor ainda", diz Bastos.
De acordo com números do Conselho Nacional de Secretários de Saúde, o Brasil teve 275 mil mortes acima do esperado em 2020. O total de mortes pela COVID-19 no ano foi 194.949. As cidades do Rio de Janeiro e Porto Alegre registraram mais mortes que nascimentos, um cenário inédito nos registros da ARPEN (Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais).
Os números de 2020 não são bons, mas a projeção para 2021 também não é animadora. Nos primeiros meses do ano, a taxa de mortalidade pela COVID-19 subiu consideravelmente. Somados, os óbitos de janeiro (29.558 mortes), fevereiro (30.484) e março (66.868) totalizam 126.910 mortes. Este número é 37,6% maior que os 92.174 óbitos da soma das mortes de junho (30.315), julho (32.912) e agosto (28.947) – os meses de 2020 com mais óbitos pela COVID-19 no Brasil.
"Se nada for feito, como não tem sido feito, 2021 tem tudo para ser pior que 2020", avalia o especialista.
O que também deve cair na esteira da expectativa de vida é o IDH (índice de desenvolvimento humano) brasileiro. Além da própria expectativa de vida, que é considerada para avaliar o IDH, o Brasil teve também um aumento da pobreza nos últimos meses. Atualmente, 39,9 milhões de pessoas no Brasil vivem em condição de miséria: ou seja, têm renda de até R$ 89 por mês. Além destas, 2,8 milhões de famílias brasileiras em situação de pobreza em outubro, com renda per capita média entre R$ 90 e R$ 178 por mês.