Nesta semana, uma delegação de representantes do Consórcio de Governadores do Nordeste e do Norte está em Moscou para reuniões que podem acelerar a importação de vacinas russas contra a COVID-19 para o Brasil.
O consórcio coordena os esforços entre os estados nordestinos para a aquisição de vacinas contra a COVID-19. O recém-criado consórcio de governadores da região Norte se uniu aos esforços do Nordeste em meio à pandemia.
"Nós no Nordeste estamos apresentando índices muito bons em todos os quesitos. Temos o menor índice de mortalidade e um dos maiores índices de vacinação", disse o secretário executivo do Consórcio de Governadores do Nordeste, Carlos Gabas, à Sputnik Brasil. "O estado da Bahia chegou a ficar em primeiro lugar em vacinação no Brasil, ultrapassando São Paulo."
O bom desempenho se deve a estratégias que garantem mais vacinas aos municípios com campanha de vacinação acelerada.
"O governo destina mais para os municípios que estão vacinando mais, criando uma lógica de recompensa", relatou o subsecretário do consórcio, Thiago Campos, à Sputnik Brasil.
Apesar dos esforços, Salvador já precisou pausar sua campanha de vacinação por escassez de vacinas.
"A distribuição do governo federal tem sido pouca e muitas vezes falha", disse Campos. "Por isso estamos tendo que assumir uma responsabilidade, que era do governo federal, de adquirir e distribuir vacinas [contra a COVID-19]."
Segundo Campos, caso o governo federal tivesse assumido suas responsabilidades, "poderíamos não estar tendo que conviver com 4 mil óbitos diários. E nem com a preocupação mundial com a proliferação de variantes diversas, porque a opção governamental foi a de deixar o vírus circular livremente. Uma decisão genocida".
De acordo com Gabas, o consórcio de governadores ofertou as vacinas que negociaram com o Fundo Russo de Investimentos Diretos (RFPI, na sigla em russo) ao Ministério da Saúde, mas ficaram sem resposta.
"Os governadores então passaram a assinar os contratos para garantir esse cronograma de entrega, que previa 2 milhões de doses em abril, 5 milhões em maio, 10 milhões em junho e 20 milhões em julho", explicou Campos. "Mas tudo isso condicionado à autorização de importação excepcional pelo governo federal."
Aprovação da Anvisa
Há meses que estados do Nordeste brasileiro selaram acordos para a importação da vacina russa contra a COVID-19, Sputnik V, ao Brasil. No entanto, a tão esperada aprovação da Anvisa não chega.
No início de março, a questão parecia resolvida após o Senado aprovar o projeto de lei que previa a aprovação pela Anvisa em até 7 dias de vacinas contra a COVID-19 aprovadas por determinadas agências sanitárias estrangeiras.
No entanto, através de decisão interna, a Anvisa passou a exigir uma série de documentos para garantir essa aprovação excepcional chancelada pelo Congresso Nacional.
"Infelizmente, a Anvisa não vem cumprindo a lei", lamentou Gabas.
"A Anvisa não quer ser uma entidade simplesmente carimbadora de certificados internacionais, uma autoridade cartorial. Mesmo nessa situação excepcional de pandemia, com 4 mil óbitos diários. Então ela exige praticamente um novo processo de registro emergencial", resumiu Campos.
"Para traduzir em miúdos, é como se você fosse viajar para o exterior com um passaporte e um visto. Mas a autoridade imigratória estrangeira, no aeroporto, exigisse que você apresentasse todos os documentos que você apresentou para emitir esse passaporte e esse visto[...] Se você apresentou o documento exigido, ele não tem que descer aos detalhes sobre a construção desse documento", explicou Gabas.
Em missão a Moscou, os representantes do consórcio querem garantir entendimento entre a Anvisa e os desenvolvedores da vacina russa.
"Nós tivemos uma reunião muito boa hoje com o diretor responsável pela documentação [da vacina Sputnik V], para tentar ajudar nesse processo. Ele tem dificuldade para entender qual documento estaria faltando, uma vez que eles já enviaram mais de um terabite de dados ao Brasil", relatou Gabas.
Para dissipar quaisquer dificuldades para que o Brasil tenha acesso à vacina russa contra a COVID-19, o Fundo Russo de Investimentos Diretos convidou a Anvisa para uma missão a Moscou.
"A visita da Anvisa é um avanço", disse Gabas. "Apesar de isso não ser necessário para a aprovação excepcional para importação, os russos entenderam que deixaria o processo mais transparente."
Apesar das dificuldades burocráticas, Campos está otimista quanto ao resultado da visita.
"Eu acho inclusive que a Anvisa vai chegar à conclusão, que nós já temos, de que a vacina Sputnik V é eficaz, segura, que só na Argentina já foi aplicada em mais de 2 milhões de pessoas, sem nenhum registro de problemas adversos graves", disse o subsecretário.
Desta vez, no entanto, não é necessário contar somente com uma mudança de posicionamento da Anvisa.
"O Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que, se a Anvisa não se manifestar sobre os pedidos dos estados para fazer a importação excepcional da vacina até o final de abril, os estados têm permissão para importar a Sputnik V", disse Campos.
Segundo ele, "a decisão está dada para os estados do Maranhão e do Ceará, mas o relator, ministro Carlos Lewandowski, deve dar decisões com o mesmo teor aos estados que o provocarem".
"Mas nós esperamos que a Anvisa, que está aqui assim como nós, tenha a consciência de que esse é o momento em que precisamos urgentemente aprovar a importação da vacina para diminuirmos o número de óbitos que temos no Brasil", declarou Campos.
Proximidade
Os representantes do consórcio realizaram visita ao Centro Nacional de Pesquisa de Epidemiologia e Microbiologia Gamaleya, que desenvolveu a vacina Sputnik V.
"Nos reunimos com a equipe que faz a verificação da qualidade [...] para checar o processo de fabricação e produção", relatou Gabas. "Nós não viemos com nenhum preconceito, mas claro que conhecer o processo, o local, conversar com as pessoas, é importante para nós e passa muita segurança."
Segundo Campos, "no Gamaleya você vê que tem um processo de inteligência, de capacidade técnica, de pessoas que estão dedicadas em produzir a vacina para superar a pandemia. Foi muito bacana a visita, extremamente aberta".
Os representantes brasileiros também se reuniram com autoridades do Fundo Russo de Investimentos Diretos, que investiu no desenvolvimento da vacina russa.
"Para além das vacinas, o RFPI é um fundo de investimentos. E nós temos muitas oportunidades de investimentos no Nordeste", notou Gabas. "Então já colocamos o Fundo em contato com a nossa área de investimentos para prospectar algum tipo de possibilidade de parceria com o fundo russo."
Durante a reunião, ficou decidida a realização de uma visita dos governadores do Consórcio do Nordeste à Rússia, a ser realizada em breve.
"Hoje nós ouvimos uma frase muito potente: é nas adversidades que os amigos se identificam", contou Campos. "Então estamos determinados a fortalecer esse vínculo de amizade que nos une."
Os representantes do Consórcio de Governadores do Nordeste realizam visita à Rússia entre os dias 19 e 23 de abril para debater a importação da vacina russa Sputnik V contra a COVID-19. Criado em 2019, o consórcio é atualmente presidido pelo governador do Piauí, Wellington Dias (PT-PI) e reúne os nove governadores da região.