Na quarta-feira (22), o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) aprovou uma resolução criando o programa Combustível do Futuro, com a finalidade de buscar fontes alternativas de energia e fortalecer o desenvolvimento tecnológico nacional para a transição energética mundial.
No dia 13 de abril, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, já havia adiantado a criação do programa, durante conferência virtual, na qual ele se referiu à iniciativa como "Biocombustível do Futuro". Sem detalhar a medida, o ministro afirmou que há tratativas com os Estados Unidos para uma parceria com o Brasil para o desenvolvimento de biocombustíveis.
Rodrigo Leão, economista e coordenador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (INEEP), enfatiza que o programa ainda não foi suficientemente detalhado, mas que já é possível apontar alguns caminhos que a iniciativa pode seguir.
"Acho meio difícil a gente conseguir delimitar o escopo desse programa. Acredito que deva ter um conjunto de políticas públicas, sejam de crédito ou até de tecnologia, para o desenvolvimento de novos combustíveis renováveis ou, pelo menos, menos fósseis, vamos assim dizer, com uma menor incidência de insumos fósseis", afirma Leão em entrevista à Sputnik Brasil.
Ao comentar sobre a mudança na matriz energética de combustíveis para fontes renováveis, o especialista afirma que ainda não é possível saber qual será o tipo de combustível que deve liderar a transição.
"O que a gente está vendo nesse momento é uma redução do uso dos combustíveis fósseis, principalmente do carvão e, em uma escala um pouco menor, do petróleo. O que a gente está observando é que o combustível que deve capitanear a transição energética vai ser o gás natural, mas é um combustível também fóssil, não é um combustível limpo, embora ele suje menos do que petróleo e carvão. Agora, dado esse processo de transição do fóssil para o renovável, acho que ainda há muitas dúvidas se vai haver um combustível que vai puxar a demanda de energia no mundo", aponta Leão, ressaltando que essa é ainda uma questão em aberto.
Para o economista, esse contexto é ditado por uma série de fatores, como oferta e preço, além de componentes geopolíticos, e por enquanto não há um combustível que desponte no papel que o petróleo e o carvão assumiram no século passado. Segundo ele, a prioridade entre os países continua sendo a garantia da segurança energética, acima da escolha por energia limpa.
Apesar disso, Leão acredita que os biocombustíveis continuam tendo um papel importante, principalmente na redução da emissão dos gases estufa.
"Os biocombustíveis também têm uma vantagem em relação a outras energias renováveis, como eólica e solar. A sua capacidade de comercialização, por se tratar de um bem líquido, você consegue transportar estocar de maneira muito mais fácil", afirma o economista.
Já entre as desvantagens dos biocombustíveis, Leão aponta a necessidade do uso e manejo do solo, assim como da variação de culturas a depender do clima local da plantação.
"Agora, sem dúvida do ponto de vista, acho, que é o foco da discussão ambiental hoje, que é a discussão da emissão de gases de efeito estufa, sem dúvida os biocombustíveis podem ter um papel importante", afirma.
Cooperação com os EUA e Cúpula do Clima
Sobre a possível cooperação com os Estados Unidos no desenvolvimento de biocombustíveis, citada pelo ministro de Minas e Energia, Leão aponta que a cooperação pode caminhar na produção do chamado diesel verde, considerado menos poluente do que o diesel comum. O economista lembra que a Petrobras já deu início ao desenvolvimento e produção do biocombustível.
"Essa é uma tecnologia que está sendo usada nas usinas dos EUA, então acredito que essa parceria pode passar por aí, na tentativa de aumentar a produção de diesel verde [...]. Os EUA têm avançado muito nessa tecnologia, aproveitando a sinergia das suas refinarias com a produção de biocombustíveis", aponta.
O especialista no setor de energia lembra que há casos de refinarias dos EUA que foram convertidas para a produção de biocombustíveis e que uma possível cooperação com o Brasil pode também passar por esse processo de conversão, apesar de acreditar que ainda é prematuro fazer uma avaliação clara sem diretrizes concretas do governo brasileiro.
Essa possível articulação pode passar também pelos resultados da Cúpula do Clima, realizada entre os dias 22 e 23 de abril deste ano. Convocada pelo presidente norte-americano Joe Biden, o encontro virtual entre os principais líderes do mundo teve como finalidade o estabelecimento de compromissos com a questão ambiental, incluindo o Brasil, que vinha sob pressão de Washington.
"Se a gente fizer uma análise do discurso do presidente Jair Bolsonaro na Cúpula do Clima, ele claramente foi muito mais brando ou foi menos agressivo do que naquele discurso um pouco anti-ambiental que ele vinha usando [...]. Acho que esse anúncio desse programa, principalmente mencionar a parceria com os EUA, com certeza está nesse bloco do Brasil tentando readequar seu discurso para um mundo que está se transformando com a chegada do Biden", aponta.