Primeiro titular da Saúde do governo de Jair Bolsonaro, Mandetta esteve à frente do ministério entre janeiro de 2019 e abril de 2020.
Em seu depoimento, Mandetta afirmou que todas as orientações dadas em sua gestão do ministério sobre a pandemia foram "assertivas e pautadas na ciência, ainda que algumas pessoas não tenham compreendido".
O ex-ministro falou também sobre as falsas orientações que surgiram no início da pandemia, especificamente sobre cidades com temperaturas mais altas, como Manaus e Cuiabá, estarem livres de serem foco de números exponenciais de contaminação por conta do clima.
Mandetta afirmou que houve divergências entre ele o presidente Jair Bolsonaro sobre a condução do enfrentamento da pandemia.
Ao ser perguntado pelo relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), Mandetta afirmou que todas as recomendações que fez durante a sua gestão no Ministério da Saúde foram baseadas na "ciência, na vida e na proteção".
"Fiz em público todas as manifestações de orientação dos boletins, as fiz nos conselhos de ministros, as fiz diretamente ao presidente, as fiz diretamente a todos os secretários estaduais, a todos os secretários municipais, a todos aqueles que de alguma maneira tinham no seu escopo que se manifestar sobre o assunto sempre", declarou o ex-ministro da Saúde.
Cloroquina
Em relação ao uso de cloroquina, medicamento propagandeado pelo presidente Jair Bolsonaro contra a doença, Mandetta revelou ter tido uma reunião no Palácio do Planalto para avaliar um decreto presidencial que incluiria na bula do remédio a recomendação para tratar a COVID-19.
"Vi um papel, mas sem papel timbrado, sem nada, à frente de todos na reunião, que era uma sugestão de minuta. Estava o ministro Jorge Ramos [na verdade Jorge Oliveira, então ministro da Secretaria-Geral da Presidência] e eu perguntei: 'Mas ministro, isso daqui é um decreto para quem, para o presidente?' Ele falou: 'Não, não, pensaram aí, mas isso aqui está fora de questão. Já falei que juridicamente isso aqui não existe'. Foi a única coisa. Alguém teve essa ideia, mas não saberia dizer quem teve", contou Mandetta.
Perguntado sobre sua avaliação quanto ao uso da cloroquina para pacientes com COVID-19, o ex-ministro respondeu: "Não, apenas para uso compassivo, inclusive após falar com o Conselho Federal de Medicina (CFM). Uso em pacientes graves, e a margem da segurança dela é estreita", disse.
Influência dos filhos do presidente
Outro ponto de destaque do depoimento do ex-ministro foi em relação à influência sobre a tomada de decisões do presidente Bolsonaro na condução das ações do governo para o combate à pandemia. Mandetta foi categórico ao afirmar que o presidente foi "aconselhado" pelos filhos.
"Várias vezes na reunião do ministério, o filho do presidente, que é vereador no Rio de Janeiro, estava sentado atrás, tomando as notas na reunião. Eles tinham constantemente reuniões com esses grupos dentro da presidência", confidenciou Mandetta.
Relação com Bolsonaro e 'kit COVID'
Questionado sobre sua relação com o presidente da República, ele explicou que o distanciamento entre os dois começou devido às "más notícias" levadas pelo ex-ministro sobre os cenários futuros do Brasil durante a pandemia. Mandetta afirmou que se sentia no dever de dar "alertas sistemáticos, inclusive com projeções", como o número de mortes, para que Bolsonaro soubesse como o país atravessaria a crise.
O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) perguntou ao ex-ministro sobre um possível erro ao se opor ao uso dos medicamentos do "kit COVID" para o "tratamento precoce" da COVID-19, ao que ele respondeu: "Sou pautado pelo estudo e pela ciência".
"Eu jamais, na minha vida, tomei decisões sem estudar. E a gente, quando estuda, principalmente em uma situação como essa que não tem doença determinada, tem que acreditar na base do seu estudo", declarou o ex-ministro.
A CPI da Covid deu início às oitivas, nesta terça-feira (4), com o depoimento de Mandetta. De acordo com a programação da comissão, o também ex-ministro da Saúde Nelson Teich será ouvido pelos senadores sobre as medidas que foram adotadas em sua gestão para conter o avanço da pandemia no Brasil.