Por meio do edital de licitação 03/21, do Ministério da Justiça, custeado em R$ 25,4 milhões, a pasta pretende contratar o avançado (e polêmico) programa de espionagem Pegasus, desenvolvido pela empresa israelense NSO Group.
Alguns órgãos oficiais de investigação que seriam beneficiados diretamente pela ferramenta, como o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e a Abin (Agência Brasileira de Informações), contudo, não foram envolvidos nas tratativas do ministério.
De acordo com o portal UOL, Carlos Bolsonaro foi o pivô desta polêmica, pois atua para diminuir o poder dos militares na área de inteligência do governo. Para tanto, articulou junto ao novo ministro da Justiça, Anderson Torres, a exclusão do GSI da licitação.
O órgão, que é responsável pela Abin, é chefiado pelo general Augusto Heleno e tem muitos militares em seu quadro. De acordo com a reportagem, o objetivo de Carlos Bolsonaro é usar as estruturas do Ministério da Justiça e da PF (Polícia Federal) para expandir uma "Abin paralela", na qual tenha grande influência.
Em nota, o Ministério da Justiça disse que o processo de licitação visa a "aquisição de ferramenta de busca e consulta de dados em fontes abertas para ser usado, pelo ministério e órgãos de segurança pública, nos trabalhos de enfrentamento ao crime organizado".
Há um entendimento na ala militar de que o Pegasus possibilita a invasão de celulares e computadores sem indicar o responsável pelo acesso. A facilidade é tamanha que um dispositivo pode ser acessado sem precisar ser ativado pelo usuário, o que membros da inteligência chamam de "zero cliques".
Se adquirido, o Pegasus permitirá o monitoramento de pessoas e empresas sem decisão judicial. Ou seja: o uso da ferramenta dependerá apenas do senso ético de quem controlará o sistema.
O Pegasus já foi usado para espionar celulares e computadores de jornalistas e críticos de governos ao redor do mundo. Em junho de 2017, o software foi utilizado pelo governo do México para espionar ativistas contrários à sua gestão.
Outro ponto de discórdia entre os militares e Carlos Bolsonaro, segundo a publicação, está no fato de que Anderson Torres não se opõe ao armazenamento de dados e informações por estrangeiros, em especial de empresas com sede na Alemanha ou em Israel.
Alegando questões de segurança nacional, equipes do GSI e da Abin não abrem mão de que informações oriundas de investigações, enriquecidas com os dados de cidadãos e de empresas nacionais, devam ser exclusivamente armazenadas e processadas no Brasil.
Não é de hoje que o governo pretende adquirir uma ferramenta espiã de fácil acesso. Em junho de 2019, em uma reunião sigilosa no Quartel-General do Exército, uma outra ferramenta, concorrente do Pegasus, foi apresentada a sete generais. Segundo fontes internas, dentre os militares estava o então ministro da Secretaria de Governo, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz.
No encontro, o alto comando tentava negociar uma ferramenta em que a invasão, segundo os vendedores do programa, fosse indetectável, e em que os dados coletados não fossem enviados ao exterior. Sete dias depois, o general Santos Cruz foi exonerado, sendo o terceiro ministro a deixar o governo de Bolsonaro.