O aumento do desmatamento na Amazônia nos últimos anos pode acelerar um processo de savanização da floresta.
É o que apontam pesquisadores de órgãos e entidades que analisam a degradação do meio ambiente no país, como o Inpe (Instituto Brasileiro de Pesquisas Espaciais).
De acordo com alguns cientistas, se a Amazônia perder 3% a 8% a mais de sua cobertura florestal, pode passar do ponto irreversível de se tornar uma savana degradada, conforme publicado pelo site Mongabay Brasil.
Bolsonaro transformou a Amazônia em 'parque de diversões para criminosos', diz ambientalistahttps://t.co/OTNqEfoGMm
— Sputnik Brasil (@sputnik_brasil) May 11, 2021
O ambientalista Miguel Scarcello, secretário-geral da ONG SOS Amazônia, estabelecida no estado do Acre, afirma que, de fato, este risco é muito elevado atualmente.
Ele explica que muitos estudos desconsideram áreas com desmate parcial, com extração de árvores específicas, observando apenas as zonas inteiras de degradação. Por isso, ele estima que a situação seja ainda mais crítica.
"Acredito que os impactos serão muito grandes. A princípio, o que temos são estudos que apontam para uma savanização da região, em vez de predominar uma floresta densa, com muitas árvores", disse Scarcello, em entrevista à Sputnik Brasil.
O especialista detalha que a ação humana poderá provocar uma redução das espécies de árvores de grande porte, um maior espaçamento entre uma copa e outra e ainda uma queda do volume de chuvas.
"Pode haver um período de seca muito mais extenso e severo, com ocorrência esparsa de chuvas, e, consequentemente, uma grande redução de água no lençol freático e um efeito direto na oferta de água nos rios. Este é o mecanismo lógico que a gente pode prever", alertou o ambientalista.
Scarcello acredita em consequências muito negativas sobre toda a vegetação e a população de animais da região, com um deslocamento em massa de espécies, que alterará o processo natural de floração e fecundação.
Esse movimento afetará ainda a forma de vida das pessoas desses locais, com mudanças no consumo alimentar e no comércio, acarretando em possíveis prejuízos financeiros.
O especialista ressalta que, por não haver controle absoluto sobre toda a realidade do território amazônico, é difícil realizar previsões.
Porém, ele aponta que, em uma taxa anual de desmatamento de 10 mil km², como ocorre hoje, o país poderá completar o processo de savanização da floresta em 30 anos.
"Se levarmos em consideração que há um processo de degradação florestal muito intenso acontecendo por conta de outra maneiras de intervenção, não só o desmatamento, podemos acelerar esse efeito de savanização sem perceber", avisou o ambientalista.
Segundo Scarcello, o enfraquecimento dos órgãos de controle ambiental nos últimos dois anos, no governo de Jair Bolsonaro, tem impulsionado um aumento do desmatamento "bem maior que nos anos anteriores".
"Então, pode levar até bem menos de 30 anos, devido a essas ações de degradação seletiva, feitas em todas as áreas da Amazônia, em todas as partes", afirmou.
O que precisa ser feito para reverter o quadro?
Para salvar a floresta da savanização, o ambientalista explica que, em primeiro lugar, é necessária uma "mudança de postura política".
"É preciso fazer muita coisa. Precisamos de determinação política e consciência das populações e dos atores locais de que é necessário parar esse processo da maneira como tem sido feito", disse.
Em seguida, ele indica uma série de medidas importantes. Segundo o ambientalista, as autoridades devem alterar o mecanismo das atividades produtivas, investindo em restauração florestal, incremento da agricultura e implantação de sistemas agroflorestais.
Scarcello ressalta a necessidade de combinar a restauração do território com a implantação de cultivos que forneçam alimentos ou matéria-prima para atender as cadeias de negócio da região.
"Pode-se incrementar o plantio de cacau, açaí... Tudo isso possibilita a restauração e, consequentemente, a desaceleração desse processo de savanização", afirmou.
De acordo com o especialista, o ideal era realizar um reflorestamento de 20 mil km² por ano na Amazônia.
Em sua visão, se for possível ao menos compensar o ritmo de desmatamento anual de 10 mil km², já seria um avanço.
"É necessário que haja um investimento intenso nesse sentido, com a paralisação de todas as iniciativas de derrubada da floresta. Acredito que isso possa ser feito de uma maneira decrescente, em um processo sucessivo, reduzindo ano a ano a área de desmate e incrementando cada vez mais a área reflorestada", disse Scarcello.