Há muito tempo, em duas galáxias a cerca de 900 milhões de anos-luz de distância, dois buracos negros engoliram cada um suas companheiras estelares feitas de nêutrons, desencadeando ondas gravitacionais que finalmente atingiram a Terra em janeiro de 2020. Dois desses eventos foram descobertos por uma equipe internacional de astrofísicos, incluindo pesquisadores da Universidade Northwestern, em Illinois, nos EUA, com apenas 10 dias de diferença, e marcam a primeira detecção de um buraco negro se fundindo com uma estrela de nêutrons. A pesquisa foi publicada nesta terça-feira no Astrophysical Journal Letters.
"As ondas gravitacionais nos permitiram detectar colisões de pares de buracos negros e pares de estrelas de nêutrons, mas a colisão mista de um buraco negro com uma estrela de nêutrons foi a peça que faltava na imagem familiar de fusões de objetos compactos", disse Chase Kimball, estudante de pós-graduação da Northwestern que é coautor do estudo.
"Completar este quadro é crucial para restringir a variedade de modelos astrofísicos de formação de objetos compactos e evolução binária. Inerentes a esses modelos estão suas previsões das taxas de fusão de buracos negros e estrelas de nêutrons. Com essas detecções, finalmente temos medições das taxas de fusão em todas as três categorias de fusões binárias compactas", conta.
Kimball liderou os cálculos das estimativas da taxa de fusão e como elas se encaixam nas previsões dos vários canais de formação de estrelas de nêutrons e buracos negros. Ele também contribuiu para discussões sobre as implicações astrofísicas da descoberta.
O estudante é aconselhado por Vicky Kalogera, investigadora principal do grupo LIGO de colaboração científica (LSC, na sigla em inglês) da Northwestern e diretora do Centro de Exploração e Pesquisa Interdisciplinar e Pesquisa em Astrofísica (CIERA, em inglês), por Daniel I. Linzer, professor de Física e Astronomia nas Faculdades de Artes de Weinberg e Ciências, e por Christopher Berry, membro do LSC e do CIERA. A equipe observou os dois novos eventos de ondas gravitacionais – denominados GW200105 e GW200115 – entre 5 e 15 de janeiro de 2020. Eles foram os pioneiros cientistas a captarem luz nestes tipos de eventos.
"Após a descoberta tentadora, anunciada em junho de 2020, de uma fusão de buraco negro com um objeto misterioso, que pode ser a estrela de nêutrons mais massiva conhecida, é emocionante também ter a detecção de fusões mistas claramente identificadas, conforme previsto por nosso modelos teóricos há décadas", disse Kalogera.
"Combinar quantitativamente as restrições de taxa e propriedades para todos os três tipos de população será uma maneira poderosa de responder às questões fundamentais das origens", completou.
Todos os três grandes detectores observaram o GW200115, que resultou da fusão de um buraco negro de seis massas solares com uma estrela de nêutrons de 1,5 massa solar a cerca de 1 bilhão de anos-luz da Terra. Com as observações dos três detectores amplamente separados na Terra, a direção da origem das ondas pode ser determinada para uma parte do céu equivalente à área coberta por 2.900 luas cheias.
Apenas 10 dias antes, o LIGO detectou um sinal forte do GW200105 usando apenas um detector, enquanto o outro estava temporariamente off-line. A partir das ondas gravitacionais, os astrônomos inferiram que o sinal foi causado por um buraco negro de 9 massas solares colidindo com um objeto compacto de 1,9 massa solar, que eles concluíram que era uma estrela de nêutrons. Essa fusão aconteceu a uma distância de cerca de 900 milhões de anos-luz da Terra.
Como o sinal era forte em apenas um detector, os astrônomos não puderam determinar com precisão a direção da origem das ondas. Embora o sinal estivesse baixo demais, seus dados ajudaram a restringir a localização potencial da fonte para cerca de 17% de todo o céu, o que equivale à área coberta por 34 mil luas cheias.
De onde eles vêm?
Como os dois eventos são as primeiras observações confiáveis de ondas gravitacionais de buracos negros se fundindo com estrelas de nêutrons, os pesquisadores agora podem estimar a frequência com que esses eventos acontecem no Universo. Embora nem todos os eventos sejam detectáveis, os pesquisadores esperam que aproximadamente uma dessas fusões por mês aconteça a uma distância de um bilhão de anos-luz.
Embora não esteja claro onde esses sistemas binários se formam, os astrônomos identificaram três origens cósmicas prováveis: sistemas binários estelares, ambientes estelares densos, incluindo jovens aglomerados de estrelas, e os centros das galáxias.
A equipe está atualmente preparando os detectores para uma quarta corrida de observação, que começará no verão de 2022.
"Com dados de ondas gravitacionais futuras, teremos estatísticas para responder perguntas e, finalmente, aprender como os objetos mais extremos em nosso universo são feitos", estimam os cientistas.