A maneira como um planeta é inclinado em seu eixo de rotação em relação ao seu plano orbital em torno de uma estrela, ou apenas inclinação axial, pode ser a chave para o surgimento de vida complexa. É o que diz um novo estudo, apresentado na Conferência de Geoquímica Goldschmidt 2021.
Segundo os cientistas, uma modesta inclinação axial, como a da Terra, ajuda a aumentar a produção de oxigênio, que é vital para a vida como a conhecemos - e planetas com inclinações muito pequenas ou muito grandes podem não ser capazes de produzir oxigênio suficiente para que a vida complexa prospere.
"O resultado final é que mundos modestamente inclinados em seus eixos podem ter maior probabilidade de desenvolver vida complexa", disse a cientista planetária Stephanie Olson, da Universidade Purdue, nos EUA. "Isso nos ajuda a estreitar a busca por vida complexa, talvez até inteligente, no Universo", afirma.
Ela diz ainda que é possível que a vida surja fora dos parâmetros conhecidos na Terra, mas como é o único mundo em que se tem conhecimento de abrigar vida, os cientistas consideram conveniente modelar suas pesquisas de acordo.
Ao procurar mundos habitáveis em outras partes da galáxia, as primeiras coisas que os estudiosos procuram são semelhanças com a Terra. A presença de um campo magnético, por exemplo, é considerada muito importante, porque protege a atmosfera planetária dos ventos estelares. A excentricidade da órbita do planeta e que tipo de outros planetas estão presentes no sistema também podem ser fundamentais.
Fatores essenciais para a vida
A maioria dos organismos na Terra não vivem sem oxigênio. No entanto, a Terra primitiva estava com pouco oxigênio. Nossa atmosfera só ficou rica em oxigênio cerca de 2,4 a 2 bilhões de anos atrás, um período conhecido como o Grande Evento de Oxidação. Foi desencadeado por uma explosão de cianobactérias, que bombeou grandes quantidades de oxigênio como um produto residual metabólico, permitindo o surgimento da vida multicelular.
Olson e sua equipe procuraram entender como surgiram as condições nas quais as cianobactérias poderiam prosperar através de modelos. O experimento mostrou que vários fatores podem ter influenciado o transporte de nutrientes nos oceanos de uma forma que contribuiu para o surgimento de organismos produtores de oxigênio, como as cianobactérias.
Com o tempo, a rotação da Terra diminuiu, seus dias se alongaram e os continentes se formaram e migraram. Cada uma dessas mudanças poderia ter ajudado a aumentar o conteúdo de oxigênio, descobriram os pesquisadores.
Em seguida, eles consideraram a inclinação axial. É por esse fator que temos estações - a inclinação para longe ou em direção ao Sol influencia a variabilidade sazonal. Portanto, talvez não seja surpreendente que a inclinação axial tenha um efeito significativo na produção de oxigênio no estudo da equipe.
"A maior inclinação aumentou a produção de oxigênio fotossintético no oceano em nosso modelo, em parte aumentando a eficiência com a qual os ingredientes biológicos são reciclados", explicou a cientista planetária Megan Barnett, da Universidade de Chicago.
'Nem oito nem 80'
Mas existe um limite. Urano, por exemplo, está inclinado a 98 graus em relação à perpendicular. Essa inclinação extrema resultaria em sazonalidade que pode ser muito extrema para a vida.
Uma inclinação pequena demais também pode não produzir sazonalidade suficiente para encorajar o nível correto de disponibilidade de nutrientes.
"Este trabalho revela como fatores chave, incluindo a sazonalidade de um planeta, podem aumentar ou diminuir a possibilidade de encontrar oxigênio derivado de vida fora do nosso Sistema Solar", disse o biogeoquímico Timothy Lyons, da Universidade de California Riverside.