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Lei para vítimas de violência doméstica avança no Brasil e analista sugere tratar 'feras feridas'

© Foto / Pixabay / 1388843Mulher acuada (imagem ilustrativa)
Mulher acuada (imagem ilustrativa) - Sputnik Brasil, 1920, 03.08.2021
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Violência doméstica passa a ter denúncia facilitada e afastamento imediato de agressor com nova sanção de Bolsonaro, mas segundo a psicanalista Lygia Vampre Humberg, algumas famílias podem ser recuperadas.

O presidente Jair Bolsonaro aprovou na semana passada, 28 de julho, o PL 741/2021 que institui o Programa "Sinal Vermelho", trata-se de uma modificação de uma nova norma no art. 12-C da Lei Maria da Penha na qual as mulheres poderão denunciar casos de violência doméstica por meio de um "X" vermelho na palma das mãos.

A ideia é que a ação indique que o agressor será afastado imediatamente do lar ou do local de convivência com a ofendida na existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da mulher ou de seus dependentes, ou se verificado o risco da existência de violência psicológica.

A psicanalista Lygia Vampre Humberg, doutora pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) e professora do curso Winnicott Experiência e Pensamento no Instituto Sedes Sapientiae, analisa que as mulheres precisam inicialmente ter o entendimento interno e segurança de que podem denunciar.

"Elas precisam de um mínimo de confiança em alguma coisa […] o principal é ter alguma rede de segurança na qual elas possam confiar", detalha a profissional, apontando para a importância de haver nessa rede assistência social e acompanhamento de saúde na qual as mulheres vítimas sintam-se confortáveis para pedir ajuda.

Humberg sugere que nos casos de lares onde os homens impeçam que as esposas saiam de casa ou elas tenham alguma dificuldade de ir e vir, haja a criação de redes com trabalhos comunitários ou artesanato para driblar o cerceamento do âmbito familiar.

Segundo ela, existem poucas iniciativas para acolhimento de mulheres em casos de vulnerabilidade doméstica, e reforça que o Estado deveria ter um papel "mais social" em casos de violência doméstica.

"Existem lugares que fazem esse tipo de iniciativa, pessoas e grupos individuais que fazem esse tipo de iniciativa, mas que muitas vezes não são fortalecidas para que continuem e cresçam", afirma.

© flickr.com / Governo do Estado de São Paulo / Diogo MoreiraDelegacia de Defesa da Mulher em Tupã, São Paulo, Brasil
Lei para vítimas de violência doméstica avança no Brasil e analista sugere tratar 'feras feridas' - Sputnik Brasil, 1920, 03.08.2021
Delegacia de Defesa da Mulher em Tupã, São Paulo, Brasil

Crianças no processo da denúncia

A psicanalista avalia que as escolas precisam ter profissionais de educação aptos a atentos para identificar mudanças de comportamento: "'essa criança está agressiva', mas é preciso entender o que está acontecendo com ela".

Lygia Vampre Humberg explica que muitas vezes a escola entra na linha da punição, mas o que a criança precisa é de acolhimento, de alguém que se disponha a conversar e compreender o que está acontecendo na casa daquela criança.

"As crianças denunciam através do comportamento delas. Se estamos atentos conseguimos perceber essas mudanças de comportamento. Se a criança está muito agressiva ou muito agitada, se chega machucada na escola", enfatiza Lygia Vampre Humberg.

Como as crianças muita vezes não sabem ainda se expressar diretamente para informar os abusos domésticos que ela ou a mãe passam em casa, a doutora pela USP indica que são os detalhes comportamentais que "denunciam" o eventual problema.

Mudança do pensamento social

Sobre os hábitos e posicionamentos sociais, Humberg compara que no passado era um hábito as mulheres evitarem roupas ou andar por lugares para fugirem de olhares e assédios que eram considerados até normais socialmente. Mas que hoje, são corretamente questionados, criticados e combatidos.

"Antes meninas evitavam usar shorts, com medo de ouvirem um assovio na rua, hoje a nova geração se posiciona e critica o assediador […] O menino que na escola mexia ou passava a mão nas meninas era bem visto, mas hoje não é um comportamento aceitável", exemplifica ela comparando a evolução de entendimento de espaço pessoal e respeito.

"É importante ensinar aos nossos jovens a proteger outros jovens vulneráveis e cada família é responsável por educar seus filhos a criar redes de apoio entre eles", sugere.

Para ela, as escolas também têm o papel de instruir os meninos e meninas para fortalecer a proteção das mulheres e cita criação e ligas femininas, esclarecimento de meninos e campanhas como "Não é não", como uma forma de "orientar para coibir que a mulher seja vista como um objeto".

É possível recuperar famílias?

O novo texto do PL aprovado por Bolsonaro prevê ainda pena de reclusão para o crime de lesão corporal cometido contra a mulher "por razões da condição do sexo feminino" e a determinação do afastamento do lar do agressor quando há risco, atual ou iminente, à vida ou à integridade física ou psicológica da mulher.

© Foto / Divulgação/Instituto Maria da PenhaA farmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, uma das principais ativistas na luta pelo fim da violência contra a mulher no país, após ter sido vítima de duas tentativas de homicídio em 1983 por parte do próprio marido, que a deixaram paraplégica.
Lei para vítimas de violência doméstica avança no Brasil e analista sugere tratar 'feras feridas' - Sputnik Brasil, 1920, 03.08.2021
A farmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, uma das principais ativistas na luta pelo fim da violência contra a mulher no país, após ter sido vítima de duas tentativas de homicídio em 1983 por parte do próprio marido, que a deixaram paraplégica.
Efetivamente, em grande parte dos casos, as medidas protetivas garantem proteção vital às mulheres e aos filhos. Porém, em alguns casos, a especialista aponta que é possível recuperar a família com tratamentos adequados para superação dos problemas relacionados à violência doméstica.

"Quando a violência doméstica já esta instaurada em uma família, existem programas que tratam essa família [em casos específicos]", algo que é visto pela psicanalista como "muito bom quando possível", pois ela acredita que nem sempre a punição é o melhor caminho e que programas terapêuticos familiares podem ser uma solução.

"No fundo é a fera ferida, o agressor também é uma pessoa que tem uma fragilidade extrema, provavelmente também foi vitima de violência. Se for fornecido um novo ambiente de acolhimento e apoio, às vezes essa pessoa consegue mudar", destaca Humberg.
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