As condições climáticas levaram à redução da projeção da grande safra de grãos brasileira para 2020-2021, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Por conta da estiagem prolongada das geadas em várias regiões do país, as produções de milho, café, hortaliças e laranja, foram atingidas e isso deve elevar ainda mais os custos repassados para o consumidor brasileiro.
O custo do milho também acaba afetando o preço das carnes, já que é usado na alimentação de frangos e também na ração de bovinos e suínos. A expectativa da Conab é de que sejam produzidas 254 milhões de toneladas,1,2% a menos do que na safra anterior.
O pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) e engenheiro agrônomo do Instituto de Estudos Avançados da USP, Warwick Manfrinato, acredita que a quebra da safra pode variar de 1% a 2%. Pode não parecer muito, mas afeta de maneiras diferentes certas culturas, como o café, que foi uma das safras mais atingidas.
Prejuízos
O especialista acredita que é difícil administrar como minimizar possíveis riscos da atividade agrícola. "Eu acho que ainda existe uma grande área cinza, não de conhecimento, mas de implicações que a gente não tem exatamente uma clareza sobre o que vai acontecer".
Sobre os efeitos da geada, Manfrinato acredita que o fenômeno causou problemas pontuais, em contrapartida alerta que um verão rigoroso poderia afetar a disponibilidade de água e isso seria o mais preocupante no caso do Brasil. "Uma mudança do ciclo hidrológico seria muito mais prejudicial do que a questão da temperatura no Brasil", diz.
"Sobre as perspectivas eu acho que os países estão se diferenciando em termos de reação e como se posicionar com relação a isso", compara lembrando que existe uma política mundial de grãos e que países como os EUA tem preparação de estoque para situações extremas.
Políticas públicas na agricultura
O engenheiro agrônomo acredita que agricultores individuais podem ser mais afetados pela quebra de safra, pelas já existentes dificuldade de acesso ao mercado e estruturação da atividade. Além disso, o pesquisador falou ainda sobre os regionalismos na agricultura que acabam beneficiando o sudeste em grandes cooperativas. "Existe uma política pública, mas ela é aplicada de formas diferentes em cada região do país".
"Comprado com outros países, mesmo países tropicais, o Brasil não é um país pioneiro para tratar desse assunto como deveria, sendo que é um país que possui uma estrutura agrícola muito avantajada, muito maior, muito mais importante para a economia do que outros países", descreve Manfrinato.
Segundo ele, a comparação precisa ser ponderada com outros indicadores, pois o agricultor familiar e o agricultor do agronegócio não estão bem assistidos pelo governo. Manfrinato lamenta a falta de apoio do governo nas políticas públicas para a agricultura: "Estrutura está boa, mas a governança sempre deixa a desejar".
O engenheiro afirma que "Brasil não está muito bem, obrigada", e opina que o Estado tem condições de se posicionar melhor do que está se posicionando.
"Os atores políticos e públicos do Brasil não estão demonstrando que o problema é o problema que estamos enfrentando, estamos conduzindo uma batalha com palitos de dente. Não vamos conseguir vencer isso dessa forma", alerta.
Como os agricultores driblaram a questão?
Sem nenhuma diretriz por parte do governo, os agricultores passaram a modificar as plantações ou deixar de plantar certas culturas. Como exemplo o professor cita as plantações de café paralisadas no Paraná, para evitar perder os produtos para a geada.
Ele contou também que há técnicas como a do "nebulizador", que consiste em uma espécie de vaporização sob a plantação durante a madrugada para alterar a temperatura mais baixa da noite com o calor específico da água.
Manfrinato afirma que são técnicas conhecidas de longa data, mas que muitas vezes não tem o aporte financeiro para investimento nessas tecnologias por parte dos agricultores.
"Nós temos o conhecimento, o fomento agrícola e a extensão rural estão na constituição, mas falta a assistência", acusa.