Qual a diferença entre ideologias do Talibã, Al-Qaeda e Daesh? Especialista explica

© AP Photo / Rahmat GulTalibãs arranjam a bandeira do movimento antes da primeira coletiva de imprensa do porta-voz do Talibã, Zabihullah Mujahid, Cabul, Afeganistão, 17 de agosto de 2021
Talibãs arranjam a bandeira do movimento antes da primeira coletiva de imprensa do porta-voz do Talibã, Zabihullah Mujahid, Cabul, Afeganistão, 17 de agosto de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 18.08.2021
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Especialista russo em problemas do terrorismo internacional contou em entrevista à Sputnik sobre as diferenças entre as ideologias do Talibã, da Al-Qaeda e do Daesh e por que os jihadistas do Estado Islâmico não gostam dos talibãs.

Georgy Machitidze, especialista do grupo do apoio analítico e monitoramento das sanções referidas em resoluções do Conselho da Segurança da ONU e impostas contra o Daesh (organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países), a Al-Qaeda (organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países) e o Talibã (organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países), falou com a Sputnik e esclareceu como se diferenciam esses grupos terroristas.

Conforme ele explicou, os talibãs, no sentido ideológico, foram herdeiros do movimento deobandi, que nasceu na Índia britânica e chegou ao Afeganistão através do Paquistão. A denominação deriva de um seminário fundado nos meados do século XIX na cidade de Deoband, no norte da Índia.

Foram principalmente estudantes das escolas muçulmanas chamadas madraças que ficaram sob influência do movimento deobandi. A escola promovia o combate contra os colonizadores ocidentais, os britânicos, e qualquer influência sua, inclusive cultural.

Os primeiros germes do movimento Talibã surgiram no Afeganistão no final dos anos 1980, inicialmente entre os estudantes das madraças das províncias de Kandahar e Helmand, relembra o especialista, mas o movimento Talibã se formou em 1994, durante a guerra civil afegã.

"A ideologia se baseava em uma combinação verificada de uma exigência fundamentalista de pureza do Islã com a fidelidade à espiritualidade do xeque e a aversão a tudo o que fosse ocidental e moderno. Esta é a diferença do Daesh."

A partir de sua formação, o movimento começou ofensivas ativas com ajuda principalmente do Paquistão. Após a tomada de Cabul, eles criaram o Emirado Islâmico do Afeganistão e introduziram as leis de xaria, proibindo o cinema, museus, música, restringindo os direitos das mulheres e praticando execuções públicas.

De acordo com Georgy Machitidze, os talibãs foram reconhecidos apenas por três países: Paquistão, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita. Após o Talibã ter sido derrotado, os jihadistas fugiram para o Paquistão e em parte se esconderam.

Conforme explica o especialista, o Talibã é um movimento nacionalista religioso do fundamentalismo islâmico contemporâneo, principalmente de pashtuns, mas na última década com participação de outras etnias – tajiques e uzbeques.

A ideologia do Daesh, por sua vez, baseia-se no salafismo – movimento dentro do islamismo sunita – e também no jihadismo – uma interpretação moderna do conceito islâmico de combate. Eles lutam contra o Ocidente e o laicismo.

Salafitas acreditam no Islã puro, que era praticado pelas antigas gerações da época do profeta Maomé. Eles se diferenciam dos outros movimentos islamistas conservadores e tentam recriar o modo de vida dos primeiros muçulmanos. O objetivo principal para eles é a criação do califado e a migração de todos os muçulmanos ao seu território.

No Afeganistão, o Daesh tentava enfraquecer "seus concorrentes diretos" – os talibãs – e também atacava Al-Qaeda, que apoia totalmente o Talibã.

© AP Photo / Hani MohammedLogotipo da Al-Qaeda no Iêmen
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Logotipo da Al-Qaeda no Iêmen

O Daesh sempre criticou os talibãs por sua ligação com os serviços secretos paquistaneses: esses laços confirmavam, do ponto de vista dos membros do Daesh, que os talibãs perderam o direito de representar o movimento jihadista.

Além disso, eles sempre se opuseram ao caráter nacionalista do movimento Talibã, isso comprometia as ideias da jihad global: "É preciso acreditar na jihad global, e não perseguir interesses nacionais".

O Emirado Islâmico do Afeganistão dos talibãs, segundo eles, não é o califado, a única forma do governo reconhecida pelo Daesh.

Segundo seu ponto de vista, os talibãs são indulgentes demais perante quem viola a xaria. Além disso, o Daesh não reconhece o código não escrito de leis pashtun importante para os talibãs – o pashtunwali ou pakhtunwali.

No que diz respeito à diferença entre o Daesh e Al-Qaeda, o especialista a vê nos objetivos finais: desde o início a Al-Qaeda esteve preocupada com o combate ao inimigo remoto – os Estados Unidos. Seus seguidores consideram que primeiro é preciso vencer e enfraquecer o inimigo, e apenas depois criar o califado.

Ao contrário da Al-Qaeda, o Daesh não vê os EUA como seu grande alvo em curta perspectiva: para eles o mais importante é purificar a comunidade islâmica, derrubar "os regimes nos países árabes" que se afastaram do fundamentalismo islâmico e criar o califado. Só depois será necessário olhar para o Ocidente.

Do ponto de vista dos métodos da atividade terrorista, Al-Qaeda é "mais suave", diz o especialista, explicando que Al-Qaeda prefere não utilizar métodos brutais contra os membros da comunidade muçulmana, ao contrário do Daesh, e propõe convencer os muçulmanos a adotar suas ideias, em vez de os forçar a aceitar a ideologia.

Sim, reconhece Georgy Machitidze, Al-Qaeda é dura contra os EUA e por várias vezes apelou a atacar americanos. Mas, ao mesmo tempo, se recusava a matar pessoas do Ocidente quando isso não coincidia com seus objetivos. Quando o Daesh capturou funcionários humanitários na Síria, Al-Qaeda "praticamente implorou" ao Estado Islâmico para não os matar, mas estes, não obstante, fizeram isso.

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