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Analista: empresas no Brasil não têm visão de crescimento e 'precisam pensar maior'

© AP Photo / Andre PennerHomem sem-teto dorme perto do Touro de Ouro, réplica do Touro de Wall Street, símbolo do mercado financeiro, fora da B3, São Paulo, 17 de novembro de 2021
Homem sem-teto dorme perto do Touro de Ouro, réplica do Touro de Wall Street, símbolo do mercado financeiro, fora da B3, São Paulo, 17 de novembro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 24.11.2021
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Ante o fato que muitas empresas do Brasil resolvem seguir em bolsas estrangeiras, a Sputnik Brasil entrevistou uma especialista sobre as razões-chave da evasão do capital brasileiro.
Até outubro, 11 empresas brasileiras optaram por abrir seu capital fora do país e têm suas ações sendo negociadas na bolsa de valores dos Estados Unidos.
Nesse contexto, a Sputnik Brasil teve uma conversa com Gecilda Esteves, mestre em Ciências Contábeis e em Administração Pública, servidora pública estadual e professora no Ibmec-RJ e na UFRJ, que explicou os motivos da evasão de empresas brasileiras para o mercado de ações norte-americano.
Para introduzir na discussão do assunto, Gecilda Esteves esclarece os termos, explicando que a empresa tem basicamente dois tipos de capital: capital aberto e capital fechado. A grande maioria das empresas nascem com o capital fechado, ou seja, têm um número limitado de donos e sócios.
No momento quando os proprietários decidem que outras pessoas também podem participar do patrimônio da empresa, eles decidem abrir o capital em uma bolsa de valores. Assim, a empresa possui a possibilidade de ter ações, ou seja, uma pequena fatia de sua empresa sendo comercializada nesse local, de acordo com a professora.

EUA: mercado grande e tranquilo

Por quais motivos precisamente as empresas brasileiras "estão nesse namoro com instituições estrangeiras", nas palavras da especialista? Há certamente uma série de aspetos contribuintes a essa atratividade.
O primeiro motivo, destacado também por vários especialistas em mercado, é a dolarização: "O dólar é a principal moeda da economia global, e existe essa possibilidade de ter a sua empresa em um ambiente onde a moeda de negociação não sofre tanta volatilidade", enfatiza ela.
A segunda razão tem a ver com o tamanho de mercado e com processos de diversificação. Conforme os dados prestados pela professora, a bolsa brasileira tem menos de 500 empresas listadas nela, enquanto nos EUA esse número é de perto de 4.000 companhias.
© AP Photo / Richard DrewCorretor trabalhando na bolsa de valores de Nova York, EUA, 19 de novembro de 2021
Corretor trabalhando na bolsa de valores de Nova York, EUA, 19 de novembro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 24.11.2021
Corretor trabalhando na bolsa de valores de Nova York, EUA, 19 de novembro de 2021
"Se você pensar que nos Estados Unidos quase 50% da população investe em mercado de capitais, investe em bolsa de valores, no Brasil a gente tem agora que esse número está chegando perto de 3%, e o valor médio que o brasileiro investe está em torno de 300 a 400 reais, se começa entender que só esses dois motivos já seriam suficientes" para querer entrar no mercado internacional, obviamente se você tem uma empresa de tamanho significativo para poder entrar na disputa no mercado americano, aponta Gecilda Esteves.
Outra coisa que gera mais atratividade ao mercado norte-americano é a questão da governança corporativa: já que os EUA passaram por grandes crises, as regras de jogo e padrões de regulação lá são mais rígidas, explica.
Consequentemente, é o mercado mais tranquilo e menos suscetível às questões relacionadas à política. Por contraste, o Brasil ainda é muito suscetível a esse aspecto, a política afeta muito mais fortemente a bolsa de valores nacional do que fora.

"A marola que é feita nos Estados Unidos é muito menor que a marola que é feita aqui [no Brasil]", afirma a especialista ilustrando o impacto das perturbações políticas, que "acaba de certa forma deixando aí o próprio investidor um pouco inseguro".

Cultura de investimento e educação financeira

Conforme a professora, os americanos já têm a cultura muito voltada para investimento, e isso gera um desenvolvimento e uma maturidade naquele mercado, que é muito maior do que no Brasil. A questão da confiabilidade e da maturidade do investidor é, sem sombra de dúvida, fundamental no desenvolvimento do mercado de ações, bem como a questão da reputação na bolsa americana.
Mais do que isso, existe uma falta de educação financeira básica que de certa maneira atrapalha essa evolução da bolsa brasileira, com pouco interesse da população em investir.
Os números também confirmam esse fato: tendo em conta um salário médio no Brasil de dez mil reais e o fato que, no mês de outubro, apenas com aproximadamente 3-4% da população brasileira cadastrada em corretoras que operam na bolsa de valores, podemos ver que as pessoas não investem nem 5% do seu salário médio.
Deve-se entender que a educação financeira é fundamental, entender que você como pessoa física deve organizar suas finanças e orçamento doméstico e ter planejamento financeiro. A professora ainda insiste em trazer um olhar mais focado na formação de patrimônio para garantir seu futuro e para isso investir em outras empresas.
Viver com cerca de 80% do que você ganhe, isso não é nenhum absurdo, alguns autores americanos até recomendam viver com 60%, e 40% disso deve ser voltado para investimentos, ressalta.

Mercado brasileiro perde, mercado americano ganha

O principal problema do fato quando uma empresa nacional resolve seguir em bolsas estrangeiras é que isso enfraquece o próprio mercado nacional.
Esse processo de chamada "corrida à internacionalização dos investimentos", quando todo o mundo está correndo para o estrangeiro por conta da segurança da moeda, por conta da possibilidade de ter uma moeda mais sólida, leva a que o mercado já pequeno acaba perdendo bastante com esse movimento, explica a especialista.
© REUTERS / AMANDA PEROBELLIHomem aponta ao painel eletrônico com flutuações de índices do mercado na bolsa de valores B3 em São Paulo, 28 de outubro de 2021
Homem aponta ao painel eletrônico com flutuações de índices do mercado na bolsa de valores B3 em São Paulo, 28 de outubro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 24.11.2021
Homem aponta ao painel eletrônico com flutuações de índices do mercado na bolsa de valores B3 em São Paulo, 28 de outubro de 2021
Agora no Brasil há braços de algumas corretoras americanas: você investe, ela converte automaticamente o montante que você investiu e seu dinheiro tem certa proteção, o que traz um conforto para o investidor. Mas, simultaneamente, isso enfraquece e diminui o tamanho do mercado nacional, porque "eu estou em uma corrida para contribuir e fomentar o mercado exterior".

Estratégias para fazer bolsa nacional mais atraente

Quanto aos instrumentos financeiros que poderiam ser tomados para mudar a situação, a professora enumera três elementos que podem dar "uma azeitada". Primeiro é a questão do fortalecimento das ações de governança corporativa, segundo é a governança, aspecto em que o Brasil avançou muito, mas ainda é possível apertar um pouco mais, acredita ela.
E o elemento final é a capacitação das pessoas, realizada pelo governo e principalmente pelo Ministério da Economia, porque as pessoas no Brasil ainda têm uma visão equivocada do mercado de investimentos.
"É muito importante ter um mercado que seja realmente sólido e que vá produzir esse tipo de ação." Por isso mesmo, o governo deve melhorar os processos de regulação, até mesmo de fiscalização, das pequenas corporações financeiras, opina a especialista.
O Brasil é um país muito diverso, um país grande, mas ao mesmo tempo o Brasil tem um volume gigante de empresas pequenas e que não têm "esse olhar de desenvolver o seu processo de crescimento, como se elas se acostumassem à ideia de permanecer pequenas", precisa "ter um olhar de expansão de negócios".
"A gente precisa pensar maior, porque quando a gente pensa maior o nosso universo particular cresce, o nosso universo regional cresce e o nosso país cresce", resumiu.
A professora Gecilda tem uma página no Instagram na qual faz lives e esclarece questões sobre gestão financeira – @falandodecontabilidade, aproveitem!
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