Teoria racial crítica, mudança de sexo e mais: como Ocidente vê valores liberais da esquerda? (18+)
© AP Photo / Geert Vanden WijngaertProtesto contra as medidas que visam impedir a propagação da COVID-19 em Bruxelas, Bélgica, 5 de dezembro de 2021
© AP Photo / Geert Vanden Wijngaert
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Em seu discurso no Clube Valdai de Discussões Internacionais, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, dedicou atenção ao fenômeno da "cultura do cancelamento", popular no Ocidente, que se transforma em uma "discriminação reversa".
O presidente também apontou para as teorias que fazem com que as pessoas comecem julgar os outros pela cor da pele, que coagem adolescentes à possibilidade de mudança de gênero e provocam a rejeição das representações tradicionais da família.
Na pesquisa realizada para a Sputnik, aos entrevistados foram colocadas cinco perguntas sobre valores liberais da esquerda: "cultura do cancelamento", teoria crítica da raça, inclusão de conteúdo sobre mudança de sexo no programa escolar, entre outras.
A pesquisa foi realizada para a Sputnik pela empresa mais antiga da França de estudo de opinião pública, IFop, de 24 a 26 novembro de 2021 na França, Reino Unido, Alemanha e EUA. A pesquisa foi realizada usando um questionário on-line.
No total, 4.010 pessoas maiores de 18 anos participaram da pesquisa: 1.010 na França, 996 no Reino Unido, 1.003 na Alemanha e 1.001 nos EUA.
A amostra é representativa da população por gênero, idade e geografia. A margem de erro da amostra para a totalidade dos dados em cada país é de +/- 3,1% com um nível de confiança de 95%.
Cultura do cancelamento
Fenômeno surgido nos EUA, a "cultura do cancelamento" consiste na retirada da esfera pública de pessoas, grupos ou organizações devido a seus comentários ou comportamento que são vistos como problemáticos ou ofensivos. Os entrevistados foram perguntados se eles apoiam a propagação da "cultura do cancelamento".
Em geral, em todos os países a maioria vê a "cultura do cancelamento" de forma negativa. Uma quantidade relativamente igual de pessoas nos EUA (50%), Reino Unido (49%) e Alemanha (59%) considera o fenômeno negativo. Entretanto, na França a quantidade de pessoas que são contra é significativamente menor (38%), mas a quantidade de pessoas indecisas é maior também (29% contra 22%, 24% e 17% na Alemanha, Reino Unido e EUA, respectivamente).
Entretanto, tem uma divergência significativa entre grupos sociais diferentes.
© REUTERS / Cheney OrrManifestantes seguram cartazes enquanto marcham, durante protesto, depois de Kyle Rittenhouse ter sido declarado "inocente" por um tribunal de Kenosha, em Chicago, Illinois, EUA, 20 de novembro
Manifestantes seguram cartazes enquanto marcham, durante protesto, depois de Kyle Rittenhouse ter sido declarado "inocente" por um tribunal de Kenosha, em Chicago, Illinois, EUA, 20 de novembro
© REUTERS / Cheney Orr
Nos EUA, entre pessoas de baixa renda (até US$ 15 mil, R$ 85,3 mil) só um quarto dos entrevistados são favoráveis ao fenômeno, enquanto entre as pessoas com renda maior que US$ 100 mil (R$ 569 mil) há 43% de apoiadores. Quanto à divergência partidária, os republicanos são definitivamente contra a "cultura do cancelamento" (74%), enquanto entre os democratas, pelo contrário, há 48% favoráveis.
Na França, 41% dos entrevistados menores de 35 anos apoiam a propagação da "cultura do cancelamento", mas a situação é contrária entre os maiores de 35 anos: 43% deles são contra o fenômeno.
No Reino Unido, mais de um terço das pessoas menores de 35 anos apoiam a propagação de fenômeno, enquanto há somente 23% de apoiadores entre maiores de 35 anos. Há mais opositores entre pessoas com maior nível de educação (32%) em comparação com os que têm menor instrução (24%). Quanto às diferenças nas correntes políticas, a maior diversidade de opiniões é vista entre o Partido Trabalhista (38% de apoiadores) e o Partido Conservador (19% de apoiadores).
Na Alemanha, há mais pessoas contra a propagação da "cultura do cancelamento" independentemente da idade. Mas quanto mais jovens são os entrevistados, mais há entre eles apoiadores da expansão do fenômeno (18% entre maiores de 65 anos, 26% entre maiores de 35 anos e 38% entre menores de 35 anos).
Entre as pessoas com mais instrução há 56% daqueles que são contra a expansão da "cultura do cancelamento", enquanto entre os menos instruídos há quase 20% menos opositores, 37%.
Teoria crítica da raça
Na mídia norte-americana é frequentemente mencionada a "teoria racial crítica". Ela consiste da ideia de que racismo não é só um produto de preconceitos pessoais, mas que está também incorporado em normas sociais jurídicas e políticas, que, por sua vez, devem ser mudadas. Há quem ache que essa teoria permite melhorar a democracia. Outros acreditam que essa teoria faz com que as pessoas comecem a se tratar umas às outras de forma diferente, se baseando na raça, e por isso essa teoria não pode ser chamada de democrática. Os entrevistados foram perguntados sobre qual ponto de vista lhes parece mais próximo.
Em geral, em todos os países a aprovação da teoria racial crítica é relativamente baixa: de 16% na França a quase um quarto na Alemanha (24%).
A Alemanha vê um maior número de pessoas que consideram a teoria não democrática (54%).
Nos EUA, a quantidade de entrevistados afirmando que a teoria crítica da raça não corresponde a ideias democráticas (53%) é duas vezes maior que o número de favoráveis à teoria (27%). Além disso, o país tem o menor número de indecisos (20%). Também se vê uma divergência significativa entre entrevistados de diferentes idades: quase dois quartos (62%) das pessoas entre 18 e 24 anos são favoráveis à teoria racial crítica, enquanto entre indivíduos maiores de 35 anos há somente 22% favoráveis. 64% pessoas com educação superior consideram a teoria não democrática contra 44% de opositores com educação básica. 70% dos republicanos dizem que a teoria está longe dos padrões democráticos, enquanto entre os apoiadores dos democratas há 40% favoráveis e 40% são contra.
Mudança de sexo
Em setembro de 2021, o Tribunal de Apelação dos EUA decidiu que as crianças menores de 16 anos têm o direito de dar consentimento informado para tratamento médico que retarde a puberdade, um tipo de tratamento usado para a mudança de sexo. Os entrevistados foram perguntados se eles apoiam ou se opõem à decisão da corte.
Segundo a pesquisa, em todos os países a quantidade daqueles que se opõem a tal decisão é maior comparando com aqueles que a apoiam. O número de apoiadores é maior nos EUA, mais de um terço (36%), e na Alemanha (34%). Em todos os países aproximadamente a metade das pessoas se opõem a esta decisão. Na França, o número de pessoas indecisas é maior.
Nos EUA, entre as pessoas de até 35 anos há 53% favoráveis à medida, enquanto entre os maiores de 35 anos somente 28% dos entrevistados apoiariam a medida. Há uma divergência significativa entre pessoas com diferentes níveis de educação: com educação superior 47% são favoráveis, com básica – somente 30-32%. Além disso, pessoas com alta renda (mais de US$ 100 mil) apoiam mais frequentemente a decisão da corte (54%), as de renda baixa são favoráveis em 25-29% dos casos. Republicanos são decididamente contra a decisão (70%, 13% são favoráveis), enquanto 61% dos democratas a apoiam (e 28% são contra).
Na França, a decisão é aprovada por 34% dos esquerdistas e 16% dos apoiadores da direita.
No Reino Unido, a quantidade de pessoas que apoiam a decisão entre os menores de 35 anos é 20% maior que dos apoiadores maiores de 35 anos (44% e 24% respectivamente). Enquanto isso, há mais apoiadores da decisão entre entrevistados com nível de educação mais alto, 43% (26% de apoiadores entre os menos instruídos).
Na Alemanha, 48% entre os jovens apoiam a decisão da corte, enquanto entre os maiores de 65 anos há somente 24% de apoiadores. A metade de pessoas com educação universitária veem a decisão como positiva (47%), enquanto entre os menos instruídos há 30-31% de apoiadores. Quanto à divergência partidária, há 61% de opositores da medida entre apoiadores dos partidos de direita e 45% entre apoiadores dos partidos da esquerda.
Casais homossexuais
Os entrevistados também foram perguntados se eles apoiam a inclusão no programa escolar, entre outro conteúdo, de informação sobre casais homossexuais.
Em todos os países, exceto nos EUA, o número de apoiadores deste conteúdo no programa escolar é maior de que o daqueles que são contra. Nos EUA, as opiniões ficaram divididas (42% pró e 43% contra), entretanto, o número de opositores é maior que em todos os outros países (43% contra 34%, 27% e 33% na França, Alemanha e Reino Unido, respectivamente).
Nos EUA há uma divergência significativa entre homens (51% são contra) e mulheres (46% apoiam a medida). 56% dos jovens apoiam a medida, enquanto 50% das pessoas maiores de 35 são contra. Republicanos veem a medida negativamente (63%), democratas apoiam o respetivo conteúdo (64%).
A Alemanha tem o maior número de apoiadores, 64%, e o número menor de opositores, 27%, com o menor número de indecisos, 9%.
Há mais favoráveis à medida no país, independentemente da idade: 62% entre maiores de 35 anos e 68% entre menores. Entre apoiadores dos partidos de esquerda 77% apoiam a medida de inclusão de conteúdo sobre casais homossexuais na escola e há 50% favoráveis entre apoiadores dos partidos da direita.
© AP Photo / Lewis JolyParticipantes da marcha anual do Orgulho Gay em torno da estátua da Place de la République (Praça da República), Paris, 26 de junho de 2021
Participantes da marcha anual do Orgulho Gay em torno da estátua da Place de la République (Praça da República), Paris, 26 de junho de 2021
© AP Photo / Lewis Joly
Dados sobre transição de gênero na escola
Os entrevistados foram também perguntados se eles apoiam a inclusão no programa escolar de informação sobre transição de gênero.
O número de apoiadores da medida (53%) é maior que o número de opositores (37%) somente na Alemanha. Na França as opiniões ficaram divididas, 41% de apoiadores contra 42% de opositores.
No Reino Unido e EUA, o número de pessoas que são contra é maior (44% contra 39% de apoiadores e 48% contra 40% de apoiadores, respectivamente).
Na França, 62% dos entrevistados entre 18 e 24 anos apoiam a medida de incluir conteúdo sobre mudança de sexo no programa, enquanto entre as pessoas maiores de 65 anos há somente 29% favoráveis.
No Reino Unido, entre menores de 35 anos há 52% pessoas que apoiam a medida, enquanto entre os maiores de 35 há somente 32% de apoiadores.
Na Alemanha, há 65% favoráveis à informação sobre transição de gênero na escola entre apoiadores de partidos da esquerda e somente 36% entre os direitistas.
© Folhapress / Alex de Jesus/O TempoEstudantes em uma aula na Escola Estadual Madre Carmelita em Belo Horizonte, MG
Estudantes em uma aula na Escola Estadual Madre Carmelita em Belo Horizonte, MG
© Folhapress / Alex de Jesus/O Tempo
Conclusões gerais sobre a pesquisa
Em relação à aceitação dos valores liberais de esquerda, as sociedades estão significativamente divididas em termos de idade, renda, orientação partidária e educação.
Partidos liberais (Partido Trabalhista, democratas liberais, Democratas nos EUA) são "motores" da agenda liberal esquerdista, enquanto os conservadores, republicanos e direitistas se opõem a eles
Os jovens são significativamente mais propensos a aceitar valores liberais de esquerda do que os mais velhos (maiores de 35 anos, por exemplo)
O nível de educação também afeta o grau de aceitação ou não destes valores, mas a influência varia de país para país
Alguns valores, como a "cultura do cancelamento", a teoria racial crítica e a decisão sobre tratamento de adolescentes para a mudança de sexo, ganharam um número bastante grande de adeptos – de um quarto para um terço em vários países, mas eles ainda não são aceitos pela maioria. Enquanto isso, a inclusão de material sobre casais homossexuais e mudança de sexo em programas escolares é apoiada por quase metade ou, em alguns países, por mais da metade dos entrevistados
O que é a Sputnik-Opinião?
É um projeto internacional de estudo da opinião pública que foi posto em prática a partir de janeiro de 2015. As conhecidas empresas Populus e IFop são parceiras do projeto. No quadro da Sputnik-Opinião (Sputnik.Polls) são realizadas regularmente pesquisas em vários países da Europa e dos EUA sobre temas sociais e políticos da atualidade.
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