O que há por trás do boicote diplomático dos EUA às Olimpíadas de Pequim em 2022?
12:16 11.12.2021 (atualizado: 12:21 11.12.2021)
© AP Photo / Ng Han GuanPoliciais chinesas agitam uma bandeira nacional chinesa para comemorar enquanto Pequim é anunciada como a cidade-sede dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2022 na região da estação de esqui de Chongli, onde esqui nórdico, salto de esqui e outros eventos olímpicos ao ar livre serão realizados na província de Hebei, no norte da China. Sexta-feira, 31 de julho de 2015. Pequim foi selecionada na sexta-feira para sediar os Jogos Olímpicos de Inverno de 2022, tornando-se a primeira cidade a receber os jogos de inverno e verão
© AP Photo / Ng Han Guan
Nos siga no
Especiais
O boicote norte-americano às Olimpíadas de inverno de 2022, em Pequim, na China, vem em um momento delicado das relações do gigante asiático com Taiwan e de acusações de violação de direitos humanos. A Sputnik Brasil entrevistou dois especialistas a respeito do assunto.
A administração do presidente norte-americano Joe Biden anunciou na segunda-feira (6) que seus representantes não estarão presentes nos Jogos de Inverno de 2022 em Pequim, na China.
Chamado de "boicote diplomático" por analistas, somente os representantes oficiais do governo não vão comparecer ao evento, diferentemente dos atletas, que poderão participar.
A postura adotada pelos EUA e também abraçada por países como a Austrália, Canadá e Reino Unido tem como pano de fundo uma série de constrangimentos envolvendo a China e sua relação com os direitos humanos.
Segundo Washington, o país tem promovido violações dos direitos humanos dos uigures, povo muçulmano que reside na região de Xinjiang, no noroeste da China, e o boicote seria uma forma de represália.
Para o professor de Relações Internacionais da ESPM Porto Alegre, Vítor Alessandri Ribeiro, em entrevista à Sputnik Brasil, o movimento norte-americano tem outras nuances, não tão evidentes.
"A gestão de Donald Trump seguia necessariamente uma linha um pouco mais dura e mais enfática de 'demonização' do governo chinês, para sua própria audiência, o eleitorado dos EUA. Já Joe Biden tem a proposta de estabelecer um caminho de diálogo um pouco mais aprofundado", afirmou.
Segundo o professor, Biden tem sofrido alguma pressão por parte dos republicanos, que julgam sua gestão muito branda. O boicote, além de oportuno diante das críticas, dá uma imagem mais austera à posição dos EUA, com ênfase nas violações de direitos humanos do governo de Xi Jinping.
"É importante notar que, desde a normalização das relações da China com os EUA, em 1972, ainda no contexto do governo Nixon, quando o secretário de Estado dos EUA Henry Kissinger se empenhou pessoalmente no resgate das relações, que haviam sido rompidas, a agenda de direitos humanos esteve presente até os dias de hoje, com mais ou menos ênfase", explica.
O professor ressalta que o foco na questão revela um claro cenário de disputa de influência, uma vez que "a notícia já cria ruído suficiente" para que a China "não colha os benefícios de sediar um evento esportivo desta magnitude".
Na medida em que a Ásia vem ganhando, nas últimas décadas, relevância econômica e geopolítica, Taiwan acaba se mostrando um ponto sensível ante o boicote.
Vítor Ribeiro ressalta que a China olha para Taiwan como "uma província rebelde", aguardando sua próxima reunificação e que, justamente por esse fato, a gestão Biden estaria usando a pequena nação insular para provocar o governo chinês.
"A gente sabe que o Departamento de Estado dos EUA segue uma tendência, a despeito da mudança da gestão, de manter o interesse em tensionar as relações entre os EUA e a China", afirma.
Mas, se antes mesmo da realização dos jogos, os constrangimentos não param, qualquer edição de Jogos Olímpicos acaba sendo uma oportunidade para os países estabelecerem zonas de influência.
Até o podium Olímpico
Sobre o que se pode esperar dos jogos, pela ótica esportiva, o professor de marketing esportivo da ESPM de Porto Alegre, Fernando Trein, afirmou à Sputnik Brasil que, apesar do boicote, os atletas seguirão firmes para os jogos.
"Isso [o boicote] afeta, de alguma forma, o lado psicológico, creio eu, mas sem dúvida alguma, na medida em que o atleta encontra algum tipo de segurança, não vejo que ele vá deixar de dar o melhor de si e representar seu país", afirmou. "Não vejo também qualquer problema no que diz respeito ao patrocínio, ou algo que possa comprometer algum tipo de faturamento do atleta."
Apesar de alguns boicotes terem ocorrido ao longo da história por parte de atletas e delegações, como por exemplo em 1980, ano em que os EUA não participaram das Olimpíadas de Moscou, o especialista não vê problemas de acesso dos atletas à China, nem a desvalorização de seu trabalho.
"Sem dúvida alguma, entrar para a história olímpica é o desejo de todos os atletas e representa também excelentes contratos de patrocínio e outras possibilidades relacionadas a qualquer conquista olímpica", completou.
Comumente, os Jogos Olímpicos evidenciam rivalidades entre países em algumas modalidades esportivas que, com certeza, serão acirradas em razão dos interesses políticos.
Nas palavras do especialista em marketing esportivo "o espírito olímpico deve se fazer presente" mesmo com toda interferência política nos jogos e toda a rivalidade promovida por eventos desta natureza.
"No fundo, é o esporte que acaba prevalecendo. Independentemente dessas questões políticas, os atletas se encontram, interagem, isto tudo faz com que o espírito olímpico prevaleça."