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Lula não anunciou medidas claras para a economia e gera turbulências desnecessárias, dizem analistas

© FolhapressLuiz Inácio Lula da Silva (PT) participa do Natal dos Catadores, organizado pela Associação Nacional dos Catadores (Ancat), em 15 de dezembro de 2022
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participa do Natal dos Catadores, organizado pela Associação Nacional dos Catadores (Ancat), em 15 de dezembro de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 19.12.2022
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Em entrevista à Sputnik Brasil, economistas destacam que falta clareza em relação às propostas de Lula para estimular a economia e lançam dúvidas sobre a arrecadação fiscal após uma eventual reforma tributária sem aumento de impostos.
A retomada econômica promete ser um dos maiores desafios, se não o principal, da gestão do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Antes mesmo da posse, o governo eleito se viu às voltas ao ter de acomodar dentro do teto de gastos despesas sociais que não estavam previstas no Orçamento de 2023, enviado ao Congresso pelo governo de Jair Bolsonaro (PL).
Uma vitória foi alcançada no último domingo (18), após o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidir que a verba destinada ao Bolsa Família não deve ser incluída no teto de gastos, com o pagamento podendo ser feito mediante abertura de crédito extraordinário. Com a decisão do ministro, o governo eleito ganha margem fiscal para acomodar outras despesas.
Porém, em entrevista à Sputnik Brasil, Carlos Eduardo Carvalho, professor do Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e Josilmar Cordenonssi, professor de ciências econômicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie, apontam que a questão do Bolsa Família é apenas uma gota no oceano, diante dos muitos obstáculos econômicos que aguardam o próximo governo.
Carvalho destaca que Lula terá de lidar com o que chama de "herança fiscal do governo Bolsonaro". Segundo ele, essa herança é calcada em uma forte repressão de despesas essenciais, "em áreas críticas, como saúde e educação, inclusive salários de servidores, e em diversos programas sociais".
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"Houve ainda diversas renúncias fiscais, como na penalização de crimes e infrações ambientais, e os subsídios com fins claramente eleitorais, caso dos combustíveis e setores dos transportes. Vale lembrar que o total das despesas públicas subiu, não houve nada de austeridade fiscal", diz Carvalho.
Entretanto ele argumenta que falta clareza em relação ao que será feito para reorganizar as contas públicas.
"A equipe de Lula alega que é indispensável recompor de imediato os gastos nessas áreas e que o teto de gastos foi tão desfigurado que já não serve para orientar as despesas e deveria ser substituído por outras regras fiscais, sem esclarecer quais seriam. A possibilidade de aumentar impostos para 2023 não existe por motivos institucionais, a menos que fosse alegada calamidade pública ou algo do tipo. Para os outros anos, não está claro o que será feito, se haverá aumento de impostos, reorganização de despesas ou aceitação de déficits maiores. Essa é uma fonte de incertezas."
Por sua vez, Josilmar Cordenonssi ressalta que a classe política brasileira "ainda não é capaz de discutir todo o Orçamento e remanejar gastos". Ele também aborda a desconfiança do mercado financeiro em relação a Lula.
Segundo Cordenonssi, embora essa desconfiança não seja uma novidade, diferentemente do que ocorreu em 2002, Lula não vem atuando para contornar a situação, mas sim a agravando com declarações que geram instabilidade.
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"Lula e o mercado financeiro se deram muito bem nos dois primeiros governos de Lula. De 2003 a 2010, o mercado financeiro se deu muito bem. O que aconteceu era uma desconfiança, na eleição de 2002, sobre o que Lula iria fazer. Na época, o dólar bateu R$ 4, o que seria algo em torno de R$ 7 hoje em dia. Mas depois que Lula fez aquela carta aos brasileiros, se comprometendo a não rasgar contratos e a fazer um governo fiscalmente responsável, o mercado financeiro comemorou. Foi uma época de ouro para o mercado de capitais os oitos anos da gestão Lula, sem dúvida nenhuma", diz Cordenonssi.
Ele acrescenta que hoje a situação é diferente, pois, "mesmo depois da eleição, Lula continua fazendo discursos que colocam em dúvida as suas reais intenções". "Isso está fazendo com que os mercados fiquem nervosos, pensando 'O que ele quer, o que pretende?'. Essa dúvida que está aumentando a percepção de risco do mercado."
Carvalho ressalta que "o quadro atual da economia é muito preocupante, e é esperado haver muita apreensão com o que fará o novo governo". No entanto, segundo o economista, em vez de dissipar temores, o presidente eleito vem criando "turbulências desnecessárias".

"Não há propostas claras para nenhum tema relevante. Diversas declarações de Lula e de pessoas próximas dão motivos para mais apreensão, inclusive por não ser possível entender a que se destinam, por que o presidente eleito fala coisas em tom tão agressivo sem objetivo claro. O presidente provocou turbulências desnecessárias aos mercados financeiros, o que impulsiona movimentos especulativos, pressiona as taxas de juros de longo prazo, reduz as possibilidades de financiamento nas bolsas e nos mercados de títulos, inibe investimentos. Tudo isso para quê? Não há como entender."

Outra incógnita, segundo os especialistas, é como Lula conseguirá cumprir a promessa de aumentar a arrecadação sem elevar impostos. Desde a campanha, o presidente eleito vem afirmando que pretende "colocar o rico no imposto de renda", sinalizando para uma reforma tributária em sua gestão.
Segundo Carvalho, "a reforma tributária é necessária por questões de largo alcance. Não é apenas reduzir a injustiça tributária e a concentração de renda, 'colocar os ricos no orçamento'".
"É também aumentar a eficiência da arrecadação, reduzir o custo para as empresas, melhorar o ambiente de negócios, estimular a produtividade. Temos uma estrutura tributária complexa e pouco eficiente do ponto de vista do desenvolvimento econômico, e não apenas pela justiça social", diz Carvalho.
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Ele acrescenta que, "embora seja muito necessária, uma reforma ampla é muito difícil, como se viu nos 14 anos de governos do PT, em que os avanços foram tímidos".

"Os motivos são conhecidos: é difícil desenhar propostas claras e com efeitos significativos, as resistências são muitas, haverá conflitos políticos e regionais. Tudo isso posto, medidas de reforma tributária precisam ser adotadas, sim, mas não é crível que possam apresentar resultados rápidos, embora possam contribuir muito para acelerar o crescimento econômico e corrigir problemas mais agudos. E também aqui não se sabe o que pretende fazer o novo governo."

Já Cordenonssi destaca que, para aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2022, popularmente conhecida como PEC da Transição, existe "uma vaga promessa de que o governo [do presidente eleito] vai colocar uma outra regra fiscal no lugar do teto de gastos até agosto de 2023". Ele também aponta para a reforma tributária, afirmando que "a ideia inicial é manter a carga tributária como está, simplificando impostos e dando uma maior racionalidade".
Porém o economista finaliza afirmando que a grande aposta para gerar os recursos necessários para reorganizar as despesas públicas, sem elevar impostos, é o crescimento econômico.

"Arrecadação mesmo virá de um crescimento econômico. A sociedade está muito resistente em aceitar qualquer aumento de impostos neste momento. Ainda mais em um cenário em que nós ainda não chegamos a recuperar o PIB de 2014. Depois de 2014, nós tivemos a recessão do governo Dilma [Rousseff], em 2015 e 2016, e depois a pandemia. Nós recuperamos o nível pré-pandêmico, mas não o nível pré-crise da gestão Dilma."

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