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Analistas explicam como o Brasil deve explorar o apetite da UE pelo Mercosul

© Foto / Palácio do Planalto / Ricardo Stuckert / CC BY 2.0O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (à direita), recebe o chanceler alemão, Olaf Scholz, em Brasília. Brasil, 31 de janeiro de 2023
O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (à direita), recebe o chanceler alemão, Olaf Scholz, em Brasília. Brasil, 31 de janeiro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 10.02.2023
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De olho no xadrez geopolítico global, o primeiro-ministro da Alemanha, Olaf Scholz, teve diversas reuniões no início do mês com os países do Mercosul. Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas explicaram por que quem saiu ganhando desses encontros foram os sul-americanos.
A visita de Scholz a Brasília marcou a última etapa do giro do chanceler pela América do Sul, após passar por Argentina e Chile. Entre os objetivos da viagem que foram anunciados, o alemão buscou reforçar parcerias para o fornecimento de matérias-primas e fontes de energia.
Nos bastidores, Olaf Scholz busca diminuir sua dependência energética em relação à China, principalmente no que diz respeito às importações de lítio, e se consolidar como uma referência da esquerda global, como apontou o professor de relações internacionais do Ibmec Alexandre Pires.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, as jornalistas Melina Saad e Thaiana de Oliveira conversaram com Alexandre Pires e Hugo Albuquerque, diretor do Instituto de Humanidade, Direitos e Democracia (Ihudd), que explicaram por que existe um apetite tão grande da União Europeia (UE) quando o assunto é o Mercosul.
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O não de Lula

Ao se reunir com o chefe de Estado brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, em 30 de janeiro, Scholz solicitou que o Brasil enviasse munição para ajudar as tropas ucranianas. Lula, entretanto, seguindo uma política externa consolidada no Itamaraty, não atendeu ao pedido.

"O Brasil não tem interesse em passar as munições para que elas sejam utilizadas na guerra entre Ucrânia e Rússia. O Brasil é um país de paz e não quer ter qualquer participação, mesmo que indireta", afirmou o presidente brasileiro.

Segundo Alexandre Pires, ao negar munição à Ucrânia, o governo Lula mostra que condena também as iniciativas que "não poderiam cessar a disputa" em Donbass.
Além disso, com o Brasil seguindo "no seu caminho", o chanceler alemão, embora seja um "político de esquerda, não conseguiu a aderência de um líder sequer da esquerda sul-americana". E isso deve passar alguma mensagem.
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"O Brasil deixa claro que não vai se alinhar aos EUA e à Alemanha, que decidiram escalar a guerra enviando tanques", disse o professor do Ibmec.

Para Hugo Albuquerque, inclusive o chanceler já estava preparado para a recusa brasileira. Na verdade, diz o diretor do Ihudd, "a Alemanha fica feliz em ouvir que não existe apoio do Sul Global ao conflito, porque mostra que o Brasil não está sob a influência dos EUA".

Além disso, "é o jeito de ele [Olaf Scholz] mostrar ao público interno alemão que não é tão simples continuar com esse conflito", completou.

O verdadeiro interesse da Alemanha no Mercosul

Para ambos os analistas consultados pela Sputnik Brasil, o principal ponto da visita do chanceler alemão à América do Sul seria justamente aproveitar o conflito na Ucrânia e a crise na cadeia de abastecimento europeia e se aproximar comercialmente dos sul-americanos.
Conforme explicou Alexandre Pires, "Olaf Scholz assume em uma nova ordem política na Alemanha, que era presidida pela centro-direita de [Angela] Merkel. O Scholz representa uma mudança, uma esquerda europeia que veio buscar alianças na esquerda latina, com [Gabriel] Boric [presidente do Chile], Lula e [Alberto] Fernández [presidente da Argentina]".
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O chanceler alemão pretende se alçar como o "líder da esquerda global, o que [Emmanuel] Macron [presidente da França] nunca conseguiu fazer".
Hugo Albuquerque ainda apontou que Olaf Scholz sabe que existe um contexto de ascensão de lideranças progressistas na Europa e na América Latina que pode reduzir a influência dos EUA sobre esta região.
"A UE sabe que disputa a região com os EUA" e por isso quer "uma integração econômica maior" com o Mercosul. Os europeus querem ampliar "laços comerciais para ter reservas de matérias-primas", aproveitando o fato de que os EUA concorrem com o Brasil, sobretudo na agricultura.
Ainda assim, diz Albuquerque, "a Europa vai até onde permitam que ela vá", porque "depende do que os EUA dizem". No momento, o que os Estados Unidos estão dizendo é que eles toleram concorrência europeia por influência na América Latina. O problema dos EUA na região é a China.
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Busca por soberania e acordo UE–Mercosul

Durante sua visita ao Brasil, Scholz defendeu avanços nas negociações do acordo entre UE e Mercosul, enquanto Lula prometeu: "Vamos fechar esse acordo até o fim do semestre".
Na avaliação de Alexandre Pires, o grande interesse da UE ao fazer esse acordo com o Mercosul é "abastecer o seu mercado consumidor", sobretudo porque cerca de 57% dos depósitos de lítio do mundo estão localizados no triângulo formado por Chile, Argentina e Bolívia.
O professor do Ibmec explicou que "seria interessante para a Alemanha buscar outros fornecedores além da China" e que a Europa também quer "fornecer bens industriais aos sul-americanos".
Para a Alemanha, o acesso aos fornecedores de matérias-primas é crucial e estratégico, dado que o país tem a sua cadeia de abastecimento completamente "desarticulada" pelo conflito na Ucrânia.
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Para Hugo Albuquerque, esse é um dos fatores geopolíticos que os sul-americanos devem explorar ao negociar com as potências europeias.
Segundo ele, a América Latina "precisa equilibrar sua presença entre os EUA e a UE e criar uma clivagem entre eles", aproveitando-se a partir das diferenças. "Seria preciso trabalhar esta contradição entre UE e EUA, isso é importante", e buscar ganhos a partir dessa cisão, completou.
Na avaliação do diretor do Ihudd, isso significa que o Brasil também buscará mais o BRICS para viabilizar essa posição, que é a de um país capaz de dialogar com todos, UE, China, Rússia e EUA. A América Latina pode tirar proveitos e deve "estimular as contradições do Norte Global".
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