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O significado por trás dos acontecimentos na Europa é a oposição do Ocidente à Rússia

© AP Photo / Virginia MayoUrsula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, Vladimir Zelensky, presidente ucraniano, e Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, durante cúpula da UE em Bruxelas, 9 de fevereiro de 2023
Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, Vladimir Zelensky, presidente ucraniano, e Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, durante cúpula da UE em Bruxelas, 9 de fevereiro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 01.03.2023
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A atual oposição do Ocidente à Rússia trata-se de uma repetição da história e demonstra uma constante geopolítica ao longo dos séculos.
"O significado básico e essencial dos acontecimentos na Europa no início deste século é o movimento militar das massas europeias de oeste para leste e depois de leste a oeste. [Contudo] o primeiro instigador desse movimento foi o movimento de oeste para leste."
"GUERRA E PAZ", LEV TOLSTÓI
Com o anúncio da suspensão russa do Tratado de Redução de Armas Estratégicas (START) durante discurso recente emitido por Vladimir Putin e em meio à continuação do conflito na Ucrânia, em que boa parte dos países ocidentais (capitaneados pelos Estados Unidos) se veem diretamente envolvidos no envio de armas e apoio financeiro a Kiev no intuito de provocar uma desejada derrota militar à Rússia no campo de batalha, o mundo novamente volta a acompanhar com apreensão o cenário de aumento de tensão entre Moscou e o Ocidente.
A culpa por esta tensão é tradicionalmente colocada sobre os ombros da Rússia, cuja condução de política externa no exterior próximo teria provocado primeiro a desconfiança e, subsequentemente, as políticas retaliatórias do Ocidente com relação a Moscou na forma de sanções, tentativas de isolamento político e outras diferentes ameaças.
No entanto, desde a chegada de Vladimir Putin ao poder em 2000, a Rússia procurou, não exatamente antagonizar o Ocidente, mas sim colaborar com o mesmo como um "igual entre pares", ou seja, ter seus interesses e preocupações levados em consideração pelos europeus e pelos americanos, o que acabou não acontecendo ao longo do tempo.
Vale ressaltar que no começo dos anos 2000, após os ataques de 11 de setembro às Torres Gêmeas nos Estados Unidos, a Rússia foi um dos primeiros países a manifestar solidariedade aos americanos pelas vítimas do atentado terrorista, muito embora essa mesma solidariedade não tenha sido demonstrada pelo Ocidente com relação à Rússia em seu combate contra o terrorismo doméstico na Chechênia. Antes dos atentados, os apelos de Moscou aos países Ocidentais eram essencialmente ignorados ou, na melhor das hipóteses, enxergados de maneira ambígua pelo Ocidente, que inclusive guardava aspirações por um eventual desmembramento do Estado russo.
Ainda assim, como um gesto de boa vontade a Rússia consentiu com o estacionamento de tropas americanas no Afeganistão para o combate à Al-Qaeda de Osama bin Laden, passando a ser considerada como "uma aliada do Ocidente" no combate ao terrorismo internacional. Aquele cenário já parecia demonstrar que as relações do Ocidente com a Rússia testemunhariam melhora somente quando o Ocidente percebesse que ambos possuíam um inimigo comum, que na época se tratava do radicalismo terrorista islâmico, e não necessariamente porque as lideranças ocidentais levavam em consideração as apreensões da Rússia manifestada anos antes.
Também no começo dos anos 2000, quando Putin discursou diante do Bundestag na Alemanha em 2001, o presidente russo manifestou o desejo de ver uma Europa fortalecida e independente politicamente de outros centros de poder, combinando suas próprias capacidades com as capacidades humanas, culturais, territoriais, de recursos naturais e de defesa da Rússia. Mas, para isso, seria necessário aumentar o clima de confiança no continente a partir de um novo entendimento de segurança que abarcasse desta vez "toda a Europa", ou seja, era preciso pensar em um projeto para além da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), de forma que os países ocidentais pudessem enfim abandonar seus estereótipos com relação à Rússia e assim construírem um futuro comum para todos os cidadãos europeus.
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Politicamente, a Rússia nutria com razão preocupações quanto ao domínio global dos Estados Unidos e sua liderança na OTAN, visto que Washington manifestava a intenção de levar a cabo não somente a expansão da Aliança Atlântica para o Leste Europeu, como também de desenvolver e construir novos sistemas de defesa antimíssil no continente.
A Rússia quis justamente negociar com os americanos a respeito da presença desses sistemas no território da Europa, no entanto, novamente suas apreensões e questionamentos acabaram sendo ignorados. Não demoraria muito, e em 2002 os Estados Unidos anunciavam sua saída unilateral do Tratado Sobre a Limitação de Sistemas de Mísseis Antibalísticos (assinado em 1972 com a União Soviética), decisão essa protestada pela Rússia, que já enxergava o notório prejuízo que tal medida implicaria para a estabilidade estratégica que fora a duras penas atingida no período da Guerra Fria.
Os americanos, tendo livrado as mãos dessa importante limitação, impulsionaram então uma segunda onda de expansão da OTAN em 2004, procedendo pouco tempo depois à instalação de mísseis antibalísticos em países como Polônia e Romênia, alegando que esses equipamentos eram destinados a proteger a Europa do Irã, o que obviamente não era um argumento sincero e muito menos capaz de convencer os russos. Não obstante, com a adesão dos Estados Bálticos à OTAN também em 2004, a Aliança Atlântica passou a fazer fronteira direta com a Rússia, permitindo aos seus caças patrulhar o espaço aéreo russo em torno do mar Báltico, a uma distância de poucos minutos da segunda maior cidade do país, São Petersburgo.
História da expansão da OTAN - Sputnik Brasil, 1920, 04.11.2022
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Seguiram-se então três novas expansões da OTAN (2009, 2017 e 2020) e a retirada unilateral em 2019 dos americanos do Tratado Sobre Forças Nucleares de Alcance Intermediário, assinado em 1987 e que eliminava o uso de mísseis balísticos e de cruzeiro terrestres (com capacidade de carregar ogivas nucleares) com alcance de 500-5.500 km em território europeu. Os americanos se livravam de mais essa limitação, e notoriamente seria questão de tempo para que tais equipamentos voltassem a aparecer em território europeu, próximo às fronteiras da Rússia.
Dado todo esse contexto e diante de repetidas investidas da OTAN no sentido de dar continuidade à sua política de "portas abertas" no continente, que tinha, como um de seus desdobramentos, a possibilidade de aceitar outros Estados do espaço pós-soviético no bloco, como é o caso da Geórgia e da Ucrânia, a Rússia se encontrou diante de uma situação que aumentou ainda mais sua percepção de insegurança e que confirmava suas preocupações, tantas vezes repetidas e tantas vezes ignoradas pelas lideranças ocidentais.

Em suma, como talvez diria Tolstói se estivesse vivo, o significado básico e essencial dos acontecimentos na Europa no início deste século foi o movimento da infraestrutura militar euro-atlântica de oeste para leste. Sim, em 24 de fevereiro de 2022 a Rússia moveu as suas tropas e tanques de leste a oeste, para surpresa de muitos. Contudo, mais uma vez o principal instigador desse movimento foi o movimento de oeste para leste.

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