Ucrânia será controlada por finanças e não por um palhaço, diz analista sobre empréstimo do FMI
11:45 04.04.2023 (atualizado: 12:19 05.04.2023)
© AP Photo / Andrew KravchenkoO presidente ucraniano, Vladimir Zelensky, participa de uma entrevista coletiva em Kiev, na Ucrânia, terça-feira, 23 de agosto de 2022
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O Fundo Monetário Internacional enviará recursos vultuosos à Ucrânia, exigindo contrapartidas socioeconômicas. Para economista ouvido pela Sputnik Brasil, Ocidente quer controlar a Ucrânia através do endividamento de Kiev.
No dia 31 de março, o Fundo Monetário Interacional (FMI) aprovou linha de crédito de US$ 15,6 bilhões (cerca de R$ 78,99 bilhões) para a Ucrânia. Esse é o primeiro empréstimo a um país em guerra da história da organização.
O PIB ucraniano encolheu cerca de 30% em 2022 e o país apresenta grande déficit fiscal. Os recursos do FMI serão liberados ao longo de quatro anos. Caso o conflito ainda esteja em curso em 2025, a Ucrânia receberá recursos adicionais, informou a Al Jazeera.
De acordo com a vice-diretora-executiva do FMI, Gita Gopinath, o novo programa de quatro anos visa "ancorar a estabilidade macroeconômica e financeira, bem como realizar reformas estruturais críticas".
© AP Photo / Esteban FelixDiretora administrativa assistente do FMI, Gita Gopinath, em conferência no Chile, em 23 de julho de 2019.
Diretora administrativa assistente do FMI, Gita Gopinath, em conferência no Chile, em 23 de julho de 2019.
© AP Photo / Esteban Felix
Como contrapartida, o FMI exige que a Ucrânia reforce regras sobre a independência do seu Banco Central e altere sua legislação referente ao combate à corrupção, informou o jornal Kommersant.
"Quando o FMI libera recursos a um país, ele condiciona toda a política econômica e social deste país", disse o professor de economia da UFAL, José Menezes Gomes, à Sputnik Brasil. "O endividamento permite que esses órgãos controlem as decisões econômicas e sociais dos países endividados, como a Ucrânia."
De acordo com o economista, "o sistema da dívida é uma forma de controlar países e não oferece autonomia para ninguém".
"O país fica prisioneiro, e por isso demanda cada vez mais recursos. Quanto mais recursos pede, mais altos os juros ficam. E quem ganha com isso são os bancos", explicou o economista.
Segundo ele, no final deste ciclo, o país endividado acaba realizando privatizações em massa e passando por políticas de austeridade severas, como no caso da Grécia.
União Europeia
Vice-diretora-executiva do FMI, Gopinath também revelou que os recursos do FMI serão utilizados para que a Ucrânia possa cumprir as condições de entrada na União Europeia (UE). Para Menezes, no entanto, a entrada de países com menor índice de desenvolvimento no bloco europeu pode ser uma armadilha.
"Analisei os dados socioeconômicos dos países que entraram na UE, tanto em termos de acesso a serviços sociais, quanto endividamento familiar. Observei que o bloco não oferece saúde, educação nem emprego", revelou Menezes. "Quem entrou na União Europeia fez um péssimo negócio."
Ao contrário do que diz o senso comum, a União Europeia já não representa o estado de bem-estar social, mas sim "a austeridade e o neoliberalismo", alerta o estudioso.
© AP Photo / Armin DurgutBandeira da União Europeia projetada no prédio da Biblioteca Nacional em Sarajevo, Bósnia e Herzegovina, 12 de outubro de 2022
Bandeira da União Europeia projetada no prédio da Biblioteca Nacional em Sarajevo, Bósnia e Herzegovina, 12 de outubro de 2022
© AP Photo / Armin Durgut
"A União Europeia só oferece austeridade. Ao entrar no bloco, tudo o que os países do Leste ganham é um passaporte europeu para que sua população dispute trabalho precário na UE", lamentou Menezes.
O economista analisou o histórico do balanço de pagamentos dos países europeus para concluir que somente quatro países se beneficiaram da formação do bloco econômico, com destaque para a Alemanha.
"A União Europeia é o mecanismo pelo qual a Alemanha conquista sua hegemonia regional", disse Menezes. "São as empresas alemãs que lucram com a expansão europeia. É o prêmio que a Alemanha ganha por se manter subordinada aos EUA."
Segundo ele, a Ucrânia é de particular interesse do bloco por ser o maior país do continente, com ampla oferta de terras férteis.
"Quem vai controlar a Ucrânia após o conflito? Vai ser alguém diretamente ligado ao setor financeiro, não vai ser um palhaço. Não vão mais precisar terceirizar a liderança para um palhaço, eles vão querer representação direta", concluiu o economista.
No dia 31 de março, o Fundo Monetário Internacional (FMI) aprovou a concessão de pacote de US$ 15,6 bilhões (cerca de R$ 78,99 bilhões) para a Ucrânia. O pacote faz parte de programa mais amplo de ajuda financeira, que totaliza US$ 115 bilhões (cerca de R$ 582 bilhões). Essa foi a primeira vez na história que o fundo concedeu empréstimos a um país em meio a conflito militar.