Armas enviadas a Kiev são utilizadas contra território russo e inundam mercado negro, diz analista
© AP Photo / LibkosSoldado ucraniano segura uma arma enquanto descansa um pouco na linha de frente no vilarejo de Nova York, região de Donetsk, 24 de abril de 2023.
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Bélgica pede esclarecimento à Ucrânia sobre uso de fuzis SCAR em incursão militar contra o território russo. Para analista ouvido pela Sputnik Brasil, Ocidente não rastreia armamentos enviados a Kiev e é conivente com a escalada do conflito.
Na segunda-feira (5), a Bélgica anunciou investigação sobre o possível uso de armas belgas em incursão militar ucraniana na região russa de Belgorod. Imagens publicadas por participantes das incursões em território russo denunciam o uso de fuzis de assalto SCAR, de fabricação belga, durante ataque a cidades russas.
"Pedimos aos nossos serviços de inteligência e militares que analisassem isso", disse o primeiro-ministro belga, Alexander De Croo, reportou o Politico. "Estamos pedindo aos ucranianos que esclareçam isso."
De acordo com o especialista em Rússia do Núcleo Avançado de Avaliação de Conjuntura (NAC) da Escola de Guerra Naval (ESG), Pérsio Glória de Paula, não está clara a origem dos fuzis SCAR, produzidos pela empresa FN Herstal, uma das maiores fabricantes de armas de pequeno porte da Europa.
"Os fuzis SCAR são amplamente utilizados não só em países da OTAN, mas mundialmente", disse Glória de Paula à Sputnik Brasil. "Até a Polícia Militar de São Paulo utiliza esse fuzil."
Dessa forma, não é possível excluir a possibilidade de os fuzis SCAR utilizados em Belgorod terem sido obtidos pelos ucranianos a partir de um país terceiro.
© AP Photo / Alex Brandon Sargento da Força Aérea dos EUA. Cody Brown, à direita, com o 436º Esquadrão Aéreo Portuário, verifica paletes de projéteis de 155 mm com destino final à Ucrânia, 29 de abril de 2022
Sargento da Força Aérea dos EUA. Cody Brown, à direita, com o 436º Esquadrão Aéreo Portuário, verifica paletes de projéteis de 155 mm com destino final à Ucrânia, 29 de abril de 2022
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"Existem formas de identificar a origem e trajeto de armas de fogo leve", esclareceu Glória de Paula. "Há características do ferrolho, tipo e tamanho de barril, acessórios, cartuchos, insígnias e inscrições na arma que podem ser utilizados para identificar o país de origem."
No entanto, o especialista nota que existem armamentos mais relevantes para a incursão militar em Belgorod, como veículos terrestres e drones.
© AP Photo / Efrem LukatskyDrones Matrice estão prontos para serem entregues ao Exército ucraniano na região de Kiev, Ucrânia, 2 de agosto de 2022.
Drones Matrice estão prontos para serem entregues ao Exército ucraniano na região de Kiev, Ucrânia, 2 de agosto de 2022.
© AP Photo / Efrem Lukatsky
"Segundo análises divulgadas por forças russas em Belgorod, os veículos capturados eram carros de combate blindados estadunidenses, M1224 MaxxPro. Sem eles, não haveria a incursão", ressaltou Glória de Paulo. "Na minha opinião, esses armamentos são muito mais relevantes do que fuzis [SCAR], que poderiam ser provenientes de qualquer outro país."
Mercado negro de armamentos
Autoridades estadunidenses reconhecem a dificuldade de rastrear os armamentos enviados a Ucrânia e demais aliados, como também evitar que acabem negociados no mercado negro.
"Se já temos relatos de MANPADS [sistema de defesa antiaérea portátil], mísseis e drones [norte-americanos] Switchblade enviados à Ucrânia indo parar no mercado negro, imagine a facilidade com que fuzis, pistolas e metralhadoras, que não possuem componentes tecnológicos para o rastreio à distância, tenham o mesmo destino", considerou Glória de Paula.
Além disso, o especialista chama atenção para o destino que esses equipamentos militares enviados a Kiev possam ter após o fim do conflito.
© Sputnik / Sergei StepanovSistemas americanos táctico-operacionais de mísseis e artilharia de grande mobilidade M142 Himars nas manobras Saber Strike na Estônia
Sistemas americanos táctico-operacionais de mísseis e artilharia de grande mobilidade M142 Himars nas manobras Saber Strike na Estônia
© Sputnik / Sergei Stepanov
"Temos o exemplo dos equipamentos bélicos que os EUA deixaram para trás após sua retirada do Afeganistão, que nem mesmo o Pentágono sabe precisar a quantidade", disse Glória de Paula.
Escalada militar
Além do flagrante descontrole sobre o fluxo dos armamentos ocidentais enviados à Ucrânia, incursões territoriais no território russo podem deflagrar um conflito internacional de larga escala, aponta o especialista.
"Essas incursões têm o potencial desastroso para uma conflagração convencional entre Rússia e OTAN, que seria um desastre para a humanidade no mesmo patamar das grandes guerras mundiais", alertou Glória de Paula. "Essa situação tem sido endossada pelas elites políticas, econômicas, militares e acadêmicas do Ocidente."
Ainda que não seja possível identificar uma posição ocidental unificada acerca do conflito, existem "diversos grupos de interesse investidos na continuidade do apoio à Ucrânia".
© AP Photo / Susan WalshJoe Biden, presidente dos EUA, se reúne com Vladimir Zelensky, presidente da Ucrânia, nos bastidores da Cúpula do G7 em Hiroshima, Japão, 21 de maio de 2023
Joe Biden, presidente dos EUA, se reúne com Vladimir Zelensky, presidente da Ucrânia, nos bastidores da Cúpula do G7 em Hiroshima, Japão, 21 de maio de 2023
© AP Photo / Susan Walsh
A investigação belga sobre a origem dos fuzis SCAR utilizados na incursão militar em Belgorod pode indicar de que há receio justificado entre grupos ocidentais acerca de um conflito militar com a Rússia.
"Ainda que o fornecimento de fuzis seja visto pela Rússia como comportamento hostil por parte da Bélgica, certamente há casos mais graves de países da OTAN enviando mísseis de cruzeiro, jatos ou artilharia de longo alcance", concluiu o especialista.