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Disputas entre STF e Congresso são problemas de Lula? Especialistas avaliam

© Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência BrasilDa esquerda para a direita: o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes
Da esquerda para a direita: o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes - Sputnik Brasil, 1920, 30.10.2023
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Disputas entre Poderes no Brasil têm sido diferentes no terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Diferentemente da gestão Jair Bolsonaro (PL) — onde embates entre Executivo e Judiciário eram mais acirrados — agora é o Legislativo que quer reduzir o poder do Supremo Tribunal Federal (STF).
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 8/2021, em tramitação no Senado Federal, visa limitar decisões monocráticas e instaurar pedidos de vista no órgão mais alto da Justiça brasileira.
Além disso, a PEC 51/2023, já protocolada entre os senadores, restringe a 15 anos os mandatos dos ministros do STF.
Cientistas políticos consultados pela Sputnik Brasil avaliam se, neste momento, tais disputas devem ser preocupantes para a população, bem como se Lula deve agir, ou não, como um mediador de tais conflitos.
O cientista político e professor da Escola de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) André Coelho avalia que qualquer tipo de conciliação exige cuidado, para não se expor nesse processo. "Nas últimas duas décadas, há um processo muito forte de judicialização da política, no qual o Judiciário muitas vezes encontra um vácuo nesses dois Poderes políticos, ou mesmo tem um ativismo jurídico muito grande."
"Isso é muito complicado porque os membros do Judiciário não são eleitos, não representam a população. Eles têm, claro, o mandato legal para a sua atuação, mas eles atuam muitas vezes quase como representantes."
Para ele, Bolsonaro conduziu de forma "inábil" a política brasileira, negociando apenas com bancadas que ele julgava estarem de acordo com sua ideologia. "Isso não deu certo, e o governo Bolsonaro acabou capitulando ao centrão, ao Legislativo, especialmente às lideranças, tanto da Câmara como do Senado."
De acordo com o especialista, isso reduziu o poder de negociação, já que as pautas precisavam de verba para serem aprovadas.
Dessa forma, Coelho comenta que Lula tem retornado ao "presidencialismo de coalizão", com a posição estratégica de cargos, segundo ele, dentro da legalidade, ainda que possa gerar divergências políticas.
"Lula foi mais bem-sucedido nos primeiros dois governos, mas o Congresso brasileiro não era tão de direita como ele é hoje. Algumas pautas progressistas são mais complicadas para o governo passar", diz ele, citando a troca na presidência da Caixa Econômica Federal para acomodar um aliado de Arthur Lira (PP-AL).
© Folhapress / Fátima MeiraO presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, assiste à posse de Bruno Dantas como presidente do TCU, sendo observado pelo então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, em 14 de dezmebro de 2022
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, assiste a posse de Bruno Dantas como presidente do TCU sendo observado pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, 14 de dezmebro de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 30.10.2023
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, assiste à posse de Bruno Dantas como presidente do TCU, sendo observado pelo então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, em 14 de dezmebro de 2022
O professor pondera, no entanto, que a proximidade com o Judiciário aumentou nesta gestão, sobretudo porque a Corte Suprema foi um dos principais alvos de Bolsonaro e devido aos ataques de 8 de janeiro terem afetado os três Poderes.
"Há uma clara intenção de controle dos atos do STF", que, em sua visão, já ultrapassaram os limites do bom senso. No entanto ele ressalta que o Judiciário foi o "guardião da democracia" durante os anos de Bolsonaro no poder, "o que nem sempre o próprio Parlamento conseguiu fazer".
Para Coelho, muitos dos parlamentares que defendem a PEC são os que apoiaram os atos antidemocráticos de 8 de janeiro.
"Com certeza é uma maneira de o Parlamento pressionar o Supremo para que não atue tão diretamente em algumas pautas políticas como vem acontecendo. O STF, muitas vezes, acaba desfazendo ou enfraquecendo o que foi feito pelo Parlamento, alegando sua própria inconstitucionalidade, como é o caso da questão do marco temporal das terras indígenas."
© Foto / Divulgação / Ricardo StuckertVidro do Palácio do Planalto quebrado durante a invasão dos prédios dos três Poderes. Brasília (DF), 8 de janeiro de 2023
Vidro do Palácio do Planalto quebrado em invasão a prédios dos Três Poderes. Brasília, 8 de janeiro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 30.10.2023
Vidro do Palácio do Planalto quebrado durante a invasão dos prédios dos três Poderes. Brasília (DF), 8 de janeiro de 2023
Para o cientista político e professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) Daniel Miranda, a movimentação no Senado Federal não visa "equilibrar poderes" ou "preservar o espírito da Constituição de 1988", mas, sim, "ultrapassá-lo".
"Tanto do ponto de vista formal, limitar severamente a atuação do STF, quanto material, pois trata-se de movimentos conservadores em relação às pautas progressistas avançadas pelo STF. Eu acho improvável passar, justamente porque o STF é um ator poderoso e que vai negociar com certeza com o Senado para chegarem a algum termo comum."
Ele avalia que Lula tem assumido postura "publicamente comedida" em relação à disputa entre STF e Congresso. "Ele não pode se indispor com nenhum dos dois, pois precisa, ao mesmo tempo, que o bolsonarismo radical seja desarmado, por meio do STF, e aprovar medidas que avalia prioritárias, com o centrão, que abriga muitos bolsonaristas."
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Ele comenta que o STF tem se tornado cada vez mais um ator político. Ministros, por exemplo, têm disputado entre si ou com parlamentares as nomeações para cargos. "Na última década houve um duplo movimento. O STF se tornou protagonista da política brasileira em momentos decisivos, e o Congresso concentrou mais poderes, principalmente envolvendo orçamento."

"Esse duplo movimento pressiona o Executivo federal dos dois lados ao mesmo tempo, diminuindo suas margens de manobra e piorando os termos das barganhas para si. Então Lula 3 será muito mais desafiador do que foi Lula 1 ou 2."

Outros indícios são entrevistas dadas pelos representantes da Suprema Corte ou mesmo declarações como o "Perdeu, mané", feita pelo ministro Luís Roberto Barroso a um apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro.
"O STF foi tragado, por iniciativa própria ou por incitação, pela dinâmica política cotidiana brasileira. Mas, em tese, ele deveria ser um árbitro constitucional das disputas políticas, tão afastado quanto possível de ambos os lados da disputa."
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O professor de ciência política da Universidade Federal Fluminense (UFF) José Paulo Martins Junior avalia que Lula foi eleito em uma proposta de promover um melhor relacionamento entre os Poderes. "Nos últimos governos do PT, grande parte dos ministros do STF foram escolhidos."
"São um conjunto de ministros não necessariamente alinhados ao PT. Não acredito nisso, e esse é o argumento que bolsonaristas usam, chamar o STF de braço jurídico do PT. Eu acho isso uma grande bobagem. Ministros indicados especialmente pela Dilma e também pelo Lula foram lavajatistas de primeira hora, como [Edson] Fachin, Barroso, Rosa Weber ou mesmo os aposentados, como Joaquim Barbosa."
Martins Junior entende que não há uma "crise" em relação aos embates entre Judiciário e Legislativo, e que o Executivo não deverá ter grande participação como mediador.

"Pessoalmente, acredito que isso não é uma crise. Falar em crise é coisa de jornalista, para vender jornal. A crise vende mais do que a realidade, e a realidade não é uma crise. A realidade que acontece é um diálogo institucional. O Supremo toma uma posição, e o Congresso responde entre as suas prerrogativas."

Ele entende que nas discussões do marco temporal, da legalização do aborto e da permissão de pequenas quantidades de maconha, todas as decisões, de ambos os lados, têm se pautado no que diz a Constituição Federal.
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Em relação à PEC, ele ressalta que limites a decisões monocráticas e redução de mandatos são discussões válidas. "Não quero dizer que eu concordo, nem discordo. O Supremo é uma instituição que não necessariamente precisa ficar congelada, mudanças podem acontecer."
"Já aconteceram mudanças bem importantes que deram poder ao Judiciário, quando, por exemplo, houve a questão do efeito vinculante. Hoje o Supremo toma uma decisão que tem um efeito vinculante para outros tribunais inferiores, isso foi uma quantidade de poder muito grande."
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