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Por que o mundo multipolar assusta o tio Sam?
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Sputnik Brasil
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas explicam por que a perda de poder econômico assusta os EUA e por que Washington teme a... 13.11.2023, Sputnik Brasil
2023-11-13T15:55-0300
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Um relatório publicado recentemente pelo Pentágono listou os principais desafios estratégicos atuais para a segurança dos Estados Unidos. O documento aponta a Rússia e a China como desestabilizadores da ordem global. Tal fato expõe o temor de Washington em relação à ascensão do mundo multipolar, liderada por Moscou e Pequim, e a perda da influência americana ao redor do mundo.Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas explicaram por que os EUA temem a perda de poder político e econômico e qual a magnitude das mudanças geopolíticas lideradas por Rússia e China.Para o coronel da reserva do Exército e mestre em ciências militares Paulo Filho, o documento mostra que os Estados Unidos entendem o mundo como uma disputa pelo poder, e desde a Segunda Guerra Mundial a configuração geopolítica e econômica global beneficia Washington. Nesse contexto, ele afirma que a ascensão de novos atores — no caso, Rússia e China, com tentativas de mudar a ordem vigente — é considerada pelos EUA uma ameaça."Os Estados Unidos notaram uma mudança na ordem internacional, uma emergência de novos atores, e reagem a essa emergência", explica Paulo Filho.Ele acrescenta que "os EUA sempre se colocaram, desde a sua criação, como uma espécie de entidade com uma missão, uma visão missionária do mundo", e que "a melhor maneira do mundo se regular, o melhor sistema, seria o seu próprio sistema da democracia liberal".Segundo o especialista, o término da Guerra Fria e a fragmentação da União Soviética foram entendidos como uma vitória por Washington, e a crença dos Estados Unidos era de que "o mundo caminharia, quase por gravidade, para um sistema democrático e liberal" no estilo norte-americano."E isso favorece os Estados Unidos, porque toda a ordem internacional foi construída de acordo com os interesses norte-americanos. O próprio sistema de Bretton Woods, todo o sistema econômico internacional, no sentido de manter, de espalhar o sistema que os EUA consideram o melhor, o mais importante, e que também os beneficia. Quando surgiu a emergência da China e a Rússia passou a atuar também defendendo seus interesses, os EUA se sentiram ameaçados em todos os campos, tanto no campo econômico quanto geopolítico, e aí passaram a reagir."Paulo Filho explica que esse sentimento de ameaça vivenciado pelos EUA é natural em potências hegemônicas que não querem perder a sua influência, e cita como exemplo países europeus.Ele destaca que o motivo de os EUA temerem a Rússia e a China é o fato de que ambas são potências nucleares."Tanto Rússia quanto China são potências nucleares com uma enorme capacidade de oferecer a chamada segunda resposta. Embora os EUA sejam a maior potência militar, algo facilmente comprovado pelo tamanho do seu orçamento militar, o fato de Rússia e China serem potências nucleares [...] evidentemente causa, sim, apreensão nos Estados Unidos."Paulo Filho também aborda o avanço da militarização industrial ao redor do mundo, que atingiu o maior nível desde a Guerra Fria.O especialista acrescenta que isso é o que está ocorrendo atualmente na Europa, e cita como exemplo o fato de a Suécia e a Finlândia, antes países historicamente neutros, terem entrado para a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e, também, o caso do mar do Sul da China."Isso acontece com a China e as Filipinas, por exemplo, que estão tendo atritos no mar do Sul da China. Isso acontece em vários lugares do mundo, na Europa, na África. Nós temos inúmeras guerras na África."O especialista destaca que, atualmente, o dilema de segurança está presente em todo o mundo, com exceção da América do Sul.Ele alerta que, "à medida que blocos vão se formando, a situação começa a ficar mais parecida como era na Guerra Fria", e cita como exemplo o ingresso do Irã no BRICS."O Irã é colocado como um inimigo dos EUA. [...] Se o BRICS começa a se comportar como um bloco geopolítico, os EUA, que estão aqui no nosso hemisfério, nossos vizinhos, vão olhar para nós e falar: 'E aí, Brasil, você vai ficar de que lado? Do lado da China, da Índia e do Irã ou do meu lado?' Então nós vamos começar a ser mais pressionados. Não tem como fugir dessa tensão geopolítica global. Mesmo estando em um subcontinente pacífico como o nosso, essa tensão geopolítica vai nos atingir também."Ainda sobre o BRICS, Paulo Filho destaca que o processo de desdolarização — observado na economia global — e a intenção do grupo de lançar uma moeda única também são vistos pelos EUA como ameaça.Fortalecimento do BRICS e sucesso militar da Rússia disparou o alerta em WashingtonCarlos Alexandre Klomfahs, advogado na área de direito internacional, com atuação na área de inteligência corporativa, e mestrando na Escola Superior de Guerra (ESG), argumenta que a perda de influência dos EUA não começou agora, mas com a campanha fracassada no Vietnã."A perda de hegemonia dos EUA começou realmente lá no final da Guerra do Vietnã. E essa perda de prestígio foi encontrar algumas partes que mais favorecem uma desestabilização da economia americana, agora com a substituição do dólar por países como Rússia e China em relação à exportação de petróleo. Então, realmente, acho que começa a ser uma atitude dos EUA de demonstrar insegurança diante da falta de prestígio pela qual estão passando no momento."Ele acrescenta que a perda de influência dos EUA é tanto geopolítica quanto econômica. "Do ponto de vista político, o que a gente percebe na parte do direito é totalmente uma inversão de valores. Não há mais uma observância do direito internacional. Você pode perceber que até a própria ONU [Organização das Nações Unidas] perdeu muito prestígio, tanto nas questões que foram levadas pela Rússia no Conselho de Segurança da ONU, quanto as questões agora envolvendo o conflito entre Israel e os palestinos, ou entre Israel e o Hamas."Carlos Alexandre afirma que a perda de influência de Washington, que se desenha há anos, "está encontrando o seu clímax". Ele afirma que a própria ascensão do BRICS, em que os membros do grupo reúnem 40% da economia mundial, é um exemplo disso.Outro fator de preocupação dos EUA é o poderio militar da Rússia, comprovado com a bem-sucedida campanha militar russa na Ucrânia, apesar dos esforços de aliados ocidentais de Kiev."O que eles [EUA] perceberam — mas que nunca é publicado no mainstream, na mídia ocidental — são todos os sucessos militares levados a cabo pela Rússia na 'guerra proxy' contra a Rússia. Não é guerra contra a Ucrânia. A guerra, na verdade, é contra a Rússia", diz o especialista.Ele acrescenta que a resiliência econômica russa também não passou despercebida por Washington, tornando-se alvo de preocupação.Por fim, Carlos Alexandre afirma considerar que "a América Latina será a próxima bola da vez" dos EUA."Há uma preocupação dos EUA, porque aqui é o quintal deles. A Doutrina Monroe, muito antiga, já falava em América para os americanos. Então ela nasceu no sentido de querer afastar a Europa de interferir nos assuntos da América, porque, como diziam os norte-americanos, 'aqui quem manda sou eu'."
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Por que o mundo multipolar assusta o tio Sam?
15:55 13.11.2023 (atualizado: 18:09 13.11.2023) Especiais
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas explicam por que a perda de poder econômico assusta os EUA e por que Washington teme a Rússia e a China.
Um relatório publicado recentemente pelo Pentágono listou os principais desafios estratégicos atuais para a segurança dos Estados Unidos.
O documento aponta a Rússia e a China como desestabilizadores da ordem global. Tal fato expõe o temor de Washington em relação à
ascensão do mundo multipolar, liderada por Moscou e Pequim, e a perda da influência americana ao redor do mundo.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas explicaram por que os EUA temem a perda de poder político e econômico e qual a magnitude das mudanças geopolíticas lideradas por Rússia e China.
Para o coronel da reserva do Exército e mestre em ciências militares Paulo Filho, o documento mostra que os Estados Unidos entendem o mundo como uma disputa pelo poder, e desde a Segunda Guerra Mundial a configuração geopolítica e econômica global beneficia Washington. Nesse contexto, ele afirma que a ascensão de novos atores — no caso, Rússia e China, com tentativas de mudar a ordem vigente — é considerada pelos EUA uma ameaça.
"Os Estados Unidos notaram uma mudança na ordem internacional, uma emergência de novos atores, e reagem a essa emergência", explica Paulo Filho.
14 de outubro 2023, 08:38
Ele acrescenta que "os EUA sempre se colocaram, desde a sua criação, como uma espécie de entidade com uma missão, uma visão missionária do mundo", e que "a melhor maneira do mundo se regular, o melhor sistema, seria o seu próprio sistema da democracia liberal".
"[…] eles [EUA] sempre atuaram, especialmente depois de se tornarem os grandes vitoriosos depois da Segunda Guerra Mundial — junto com a União Soviética, a China, a França e o Reino Unido —, como os vencedores daquela ordem."
Segundo o especialista, o término da Guerra Fria e a fragmentação da União Soviética foram entendidos como uma vitória por Washington, e a crença dos Estados Unidos era de que "o mundo caminharia, quase por gravidade, para um sistema democrático e liberal" no estilo norte-americano.
"E isso favorece os Estados Unidos, porque toda a ordem internacional foi construída de acordo com os interesses norte-americanos. O próprio sistema de Bretton Woods, todo o sistema econômico internacional, no sentido de manter, de espalhar o sistema que os EUA consideram o melhor, o mais importante, e que também os beneficia. Quando surgiu a emergência da China e a Rússia passou a atuar também defendendo seus interesses, os EUA se sentiram ameaçados em todos os campos, tanto no campo econômico quanto geopolítico, e aí passaram a reagir."
Paulo Filho explica que esse sentimento de ameaça vivenciado pelos EUA é natural em potências hegemônicas que não querem perder a sua influência, e cita como exemplo países europeus.
"Espanha, especialmente, depois Portugal como uma grande potência na época do descobrimento. Depois a França, o Reino Unido, os EUA. Essas potências sempre se comportaram como potências hegemônicas. Acho que é natural da história humana. Isso acontece desde as guerras entre Atenas e Esparta."
13 de novembro 2023, 13:32
Ele destaca que o motivo de os EUA temerem a Rússia e a China é o fato de que ambas são potências nucleares.
"Tanto Rússia quanto China são potências nucleares com uma enorme capacidade de oferecer a chamada segunda resposta. Embora os EUA sejam a maior potência militar, algo facilmente comprovado pelo tamanho do seu orçamento militar, o fato de Rússia e China serem potências nucleares [...] evidentemente causa, sim, apreensão nos Estados Unidos."
Paulo Filho também aborda o avanço da militarização industrial ao redor do mundo, que atingiu o maior nível desde a Guerra Fria.
"Nós estamos vivendo no momento mais perigoso da nossa geração. O momento mais perigoso que ocorreu no mundo antes do atual foi a crise dos mísseis, na década de 1960. E aí acontece o chamado dilema de segurança. […] O país reconhece em outro um adversário, uma fonte de perigo. E, por causa disso, ele se arma. E por ele se armar, aquele adversário também reconhece nele uma fonte de perigo e também se arma. É o chamado dilema de segurança, mais popularmente conhecido como corrida armamentista."
O especialista acrescenta que isso é o que está ocorrendo atualmente na Europa, e cita como exemplo o fato de a Suécia e a Finlândia, antes países historicamente neutros, terem entrado para a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e, também, o caso do mar do Sul da China.
"Isso acontece com a China e as Filipinas, por exemplo, que estão tendo atritos no mar do Sul da China. Isso acontece em vários lugares do mundo, na Europa, na África. Nós temos inúmeras guerras na África."
O especialista destaca que, atualmente, o dilema de segurança está presente em todo o mundo, com exceção da América do Sul.
"O Brasil tem a sorte de estar na América do Sul. O Brasil e os vizinhos sul-americanos estão em um ambiente de paz. Nós não temos nenhuma ameaça latente com nenhum dos nossos vizinhos. Então, esse dilema de segurança não é uma realidade para nós. Agora nós vamos ser cada vez mais pressionados no ambiente internacional a nos posicionarmos de um lado ou de outro", explica Paulo Filho.
Ele alerta que, "à medida que blocos vão se formando, a situação começa a ficar mais parecida como era na Guerra Fria", e cita como exemplo o
ingresso do Irã no BRICS.
3 de novembro 2023, 13:05
"O Irã é colocado como um inimigo dos EUA. [...] Se o BRICS começa a se comportar como um bloco geopolítico, os EUA, que estão aqui no nosso hemisfério, nossos vizinhos, vão olhar para nós e falar: 'E aí, Brasil, você vai ficar de que lado? Do lado da China, da Índia e do Irã ou do meu lado?' Então nós vamos começar a ser mais pressionados. Não tem como fugir dessa tensão geopolítica global. Mesmo estando em um subcontinente pacífico como o nosso, essa tensão geopolítica vai nos atingir também."
Ainda sobre o BRICS, Paulo Filho destaca que o processo de desdolarização — observado na economia global — e a intenção do grupo de lançar uma moeda única também são vistos pelos EUA como ameaça.
"A ordem internacional que os EUA construíram depois do pós-guerra, essa hegemonia, se deve muito à utilização do dólar como uma moeda franca, como uma moeda das transações comerciais internacionais. Afinal de contas, os Estados Unidos podem emitir moeda sem parar, sem medo de ser feliz e sem gerar inflação, porque […] vai ser utilizada por alguém em outro país. […] Isso é uma vantagem competitiva enorme para os EUA. Então, quando os EUA percebem essas tentativas de mudar isso, se sentem ameaçados."
Fortalecimento do BRICS e sucesso militar da Rússia disparou o alerta em Washington
Carlos Alexandre Klomfahs, advogado na área de direito internacional, com atuação na área de inteligência corporativa, e mestrando na Escola Superior de Guerra (ESG), argumenta que a perda de influência dos EUA não começou agora, mas com a campanha fracassada no Vietnã.
"A perda de hegemonia dos EUA começou realmente lá no final da Guerra do Vietnã. E essa perda de prestígio foi encontrar algumas partes que mais favorecem uma desestabilização da economia americana, agora com a substituição do dólar por países como Rússia e China em relação à exportação de petróleo. Então, realmente, acho que começa a ser uma atitude dos EUA de demonstrar insegurança diante da falta de prestígio pela qual estão passando no momento."
18 de outubro 2023, 03:53
Ele acrescenta que a perda de influência dos EUA é tanto geopolítica quanto econômica. "Do ponto de vista político, o que a gente percebe na parte do direito é totalmente uma inversão de valores. Não há mais uma observância do direito internacional. Você pode perceber que até a própria ONU [Organização das Nações Unidas] perdeu muito prestígio, tanto nas questões que foram levadas pela Rússia no Conselho de Segurança da ONU, quanto as questões agora envolvendo o conflito entre Israel e os palestinos, ou entre Israel e o Hamas."
Carlos Alexandre afirma que a perda de influência de Washington, que se desenha há anos, "está encontrando o seu clímax". Ele afirma que a
própria ascensão do BRICS,
em que os membros do grupo reúnem 40% da economia mundial, é um exemplo disso.
"Rússia e China são os grandes parceiros, junto com a Índia, o Brasil e a África do Sul. Esse tem sido o foco da resistência americana e, por outro lado, um foco de atenção da China e da Rússia em relação à Nova Rota da Seda, que tem suas várias rotas, e uma delas passa exatamente onde há o conflito no Oriente Médio."
Outro fator de preocupação dos EUA é o
poderio militar da Rússia,
comprovado com a bem-sucedida campanha militar russa na Ucrânia, apesar dos esforços de aliados ocidentais de Kiev.
"O que eles [EUA] perceberam — mas que nunca é publicado no mainstream, na mídia ocidental — são todos os sucessos militares levados a cabo pela Rússia na 'guerra proxy' contra a Rússia. Não é guerra contra a Ucrânia. A guerra, na verdade, é contra a Rússia", diz o especialista.
Ele acrescenta que a resiliência econômica russa também não passou despercebida por Washington, tornando-se alvo de preocupação.
"Eles [EUA] puderam ver, tanto do ponto de vista estratégico, tático e político que a Rússia vem acumulando expertise nos últimos anos, ganhando uma hegemonia econômica com a exportação de petróleo e gás para a Europa, inclusive para os próprios EUA, que não deixaram de importar petróleo e gás da Rússia."
Por fim, Carlos Alexandre afirma considerar que "a América Latina será a próxima bola da vez" dos EUA.
"Há uma preocupação dos EUA, porque aqui é o quintal deles. A Doutrina Monroe, muito antiga, já falava em América para os americanos. Então ela nasceu no sentido de querer afastar a Europa de interferir nos assuntos da América, porque, como diziam os norte-americanos, 'aqui quem manda sou eu'."