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'Orgulho e preconceito': a importância do Hamas para o discurso político de Benjamin Netanyahu

© AP Photo / Avi OhayonO primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, no centro, aparece com soldados no norte da Faixa de Gaza, em 25 de dezembro de 2023
O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, no centro, aparece com soldados no norte da Faixa de Gaza, em 25 de dezembro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 25.01.2024
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Em 2007, um telegrama vazado do chefe de inteligência militar do Exército israelense afirmava algo que poucos pareciam acreditar. Tratava-se de uma conversa com o embaixador dos Estados Unidos em Tel Aviv, no qual o oficial dizia estar feliz pelo Hamas ter assumido o controle de Gaza, pois assim Israel poderia tratar Gaza como um "país hostil".
O conteúdo desse telegrama teve lugar apenas um ano depois de o Hamas ter vencido as eleições locais palestinas, resultando no controle do grupo sobre o território conhecido como Faixa de Gaza. Inicialmente, tanto para os Estados Unidos quanto para Israel, a vitória do Hamas em 2006 foi um acontecimento indesejável. Afinal, o Hamas era um grupo extremista que prometia usar de violência para atingir seus objetivos políticos, além de declaradamente não admitir a existência do Estado de Israel na região. A partir de 2006, eles estavam no controle da Faixa de Gaza e a praticamente uma hora de distância de Tel Aviv.
Contudo, mesmo antes de o Hamas chegar ao poder, as tensões entre grupos palestinos e setores da direita israelense já eram bastante altas. E é justamente de setores da direita nacionalista israelense que se origina o atual primeiro-ministro do país, Benjamin Netanyahu. Por anos, Netanyahu vem discursando sobre os "perigos iminentes" ao Estado de Israel, oriundos da Palestina. Com isso, ele conseguiu justificar políticas mais restritivas com os palestinos durante seus sucessivos governos, consolidando uma imagem de "líder forte" e o único capaz de lidar com a ameaça de uma nova "intifada".
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Com Netanyahu à frente no poder, aumentou também a instalação de assentamentos israelenses ilegais na Cisjordânia, assim como o cerco a Gaza, o que amplificou o sofrimento de palestinos em ambas as regiões. Ao mesmo tempo, o governo israelense reprimia e assassinava palestinos em busca de elementos terroristas dentro da população local. Diante desse cenário, o Hamas, que chegou ao poder em Gaza, foi ganhando cada vez mais força, prometendo lutar contra Israel (a "potência ocupante") até a vitória final do povo palestino.
Ao passo que o Hamas escolheu a violência como sua linguagem política, as ações de Netanyahu e de seu gabinete de fragmentar as terras palestinas, oprimir partes da população local e em seu incentivo aos assentamentos ilegais na Cisjordânia também acabaram por produzir mais violência na região. Todas essas ações foram contraproducentes até mesmo para Israel, pois ajudaram a criar um inimigo cada vez mais determinado e sedento por vingança.
No passado, Benjamin Netanyahu foi inclusive um dos líderes políticos mais influentes a se posicionar contra os Acordos de Oslo. Na ocasião — no começo da década de 1990 —, representantes de Israel e da Palestina começavam a empreender negociações secretas na Noruega para chegar à paz. Um dos resultados dessas negociações, por exemplo, foi o estabelecimento de uma autoridade governamental palestina, que recebeu poderes para controlar o território da atual Cisjordânia. Os palestinos também obtiveram o controle sobre quase toda a Faixa de Gaza, embora ainda existissem colonos israelenses em ambos os locais.
Entretanto, setores da direita israelense, dos quais pertencia Netanyahu, começaram a realizar comícios públicos, chamando o primeiro-ministro da época, Yitzhak Rabin, de traidor por ter feito concessões aos palestinos durante as negociações em Oslo.
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Em consequência das tensões políticas provocadas por essas manifestações, Rabin foi assassinado em 1995 por um ativista israelense de extrema-direita. No ano seguinte, Benjamin Netanyahu foi eleito primeiro-ministro de Israel. Aquela tinha sido então a maior vitória política de sua carreira. Como líder do país, Netanyahu pôde implementar sua visão particular quanto à questão palestina, visão esta fortemente matizada por estereótipos e preconceitos. Para Netanyahu, a única forma de fornecer segurança ao povo judeu era impedir a obtenção de um Estado nacional pelo povo palestino.
Netanyahu acreditava que o principal empecilho para a paz na região se tratava da insistente exigência pelo estabelecimento de um Estado palestino que, segundo ele, colocaria Israel em um estado de "guerra permanente". Por outro lado, defendia Netanyahu, se os palestinos desistissem de seu Estado nacional, o caminho para uma paz real e genuína poderia enfim ser atingido. Essas eram as visões do atual primeiro-ministro israelense quando chegou ao poder em 1996. Não sem razão, Netanyahu fez de tudo para sabotar os acordos de paz, alegando que a ocupação de novos territórios por Israel era sua única garantia de segurança e de estabilidade para o povo judeu.
Assim, foi sob a supervisão de Netanyahu que colonos israelenses se moveram com ainda mais afinco para a Cisjordânia, alterando a configuração étnica da região e violando normas do direito internacional. Tais esforços eram justificáveis para Netanyahu, dada a sua profunda desconfiança com relação à ideia de um Estado palestino independente. Não sem razão, os palestinos — tanto na Cisjordânia quanto na Faixa de Gaza — chegaram à conclusão de que Israel não deseja lhes fornecer qualquer tipo de autonomia, a menor que seja, e muito menos aceitar a ideia de uma Palestina livre. Enquanto isso, Netanyahu e seu governo enrijecem o discurso político extremado, baseado no orgulho nacional.
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Seja como for, o Hamas foi um ator importante na eclosão da violência recente que vemos hoje, ao cometer os atentados do dia 7 de outubro, mas nem de longe o único. Israel e o governo de Netanyahu também têm parte no ocorrido, por conta de suas ações ao longo dos últimos anos, que resultaram na repressão de grande parte da população palestina, não só em Gaza, mas também na Cisjordânia, onde o Hamas não está presente.
Ao final, Netanyahu poderá usar os ataques do dia 7 para continuar a defender sua visão profundamente negativa dos palestinos, enquanto faz promessas de segurança ao povo judeu. O problema é que as políticas de Netanyahu e de seu governo não são o melhor caminho para esse fim. Mais muros, mais barreiras, mais postos de controle, mais assentamentos, nada disso vai tornar Israel mais seguro. Pelo contrário, apenas ampliam as perspectivas de um conflito que parece não ter fim.
As opiniões expressas neste artigo podem não coincidir com as da redação.
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