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Nem à esquerda e nem à direita: após dois 'nãos', Chile vai desistir de nova Constituição?
Nem à esquerda e nem à direita: após dois 'nãos', Chile vai desistir de nova Constituição?
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Sistema privado de previdência com "aposentadorias miseráveis", aumento do custo de vida e ausência de rede de saúde pública. Em 2019, milhões de chilenos... 30.01.2024, Sputnik Brasil
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Em pouco mais de 200 anos de história, o Chile teve apenas quatro constituições, enquanto um país como o Brasil teve sete. E a última possui marcas de um dos períodos mais difíceis da história chilena: foi promulgada durante a década de 1980, na ditadura de Augusto Pinochet, uma das mais sangrentas de toda a América Latina. Com isso, reformas profundas na economia e na política do país eram dificultadas diante do texto constitucional, o que provocou profundas insatisfações entre a sociedade do país ao longo do tempo.Tudo isso eclodiu com as grandes manifestações de 2019, que começaram por conta da insatisfação com o aumento na tarifa do metrô em Santiago, capital do país, quando mais de 1 milhão de pessoas chegaram a tomar as ruas em apenas um dos atos. Para estancar a crise, o então presidente, Sebastián Piñera, chegou a pedir o afastamento de todos os ministros para estruturar um novo gabinete que fosse capaz de atender às demandas. Correspondente por mais de 20 anos no Chile, o jornalista e subeditor do site Opera Mundi, Victor Farinelli, explicou ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, a situação do país na época.Uma das tentativas do governo Piñera para conter a ebulição social foi justamente um plebiscito, em que o voto não era obrigatório, sobre a necessidade ou não de uma nova Constituição, aprovado por ampla maioria. Na sequência, houve a eleição do atual presidente de esquerda, Gabriel Boric, na época com 35 anos e considerado o mais novo da história — com pouco mais de 55% dos votos, o político superou José Antonio Kast, de direita. E agora caberia a Boric comandar a mudança constitucional no país.Por que os chilenos rejeitaram a nova Constituição?Nem à esquerda e nem à direita. Os dois plebiscitos que sucederam os protestos e a aprovação dos chilenos à nova Carta Magna foram rejeitados. Para Victor Farinelli, o principal motivo que levou a população a não aceitar nenhum dos textos foi justamente a falta de liderança política, inclusive um apoio maior do próprio governo, que defendia a mudança.Diante da rejeição eleitoral aos textos dos dois campos políticos, o analista acredita que o Chile entrou em um "limbo constitucional", já que há um sentimento de fracasso e o próprio governo atual não sabe qual caminho seguir. "No fim das contas, aquela indignação continua pendente, e com o agravante da frustração em dois processos que eram inéditos na história do país […]. E nenhuma Constituição no Chile foi feita através de uma assembleia, todas foram entre quatro paredes, por políticos tradicionais e uma aristocracia", pontua.Quais as diferenças entre os dois textos rejeitados no Chile?Já o doutor em história pela Universidade de São Paulo (USP) e professor titular de história da América na Universidade Estadual Paulista (Unesp) Alberto Aggio disse à Sputnik Brasil que há pontos em comum nos dois textos constitucionais rejeitados. "A ideia de um Estado democrático e social permaneceu. Mas no primeiro projeto não se falava do Chile como república, mas um Estado de vários povos. O plurinacionalismo estava presente, e isso é uma mudança estrutural muito grande. Ainda havia um espectro de direitos alargadíssimo, que no segundo foi descartado", resume.Com o país voltado para as eleições municipais neste ano, que funcionam como um termômetro da popularidade do governo central, e também o cansaço com uma nova Constituição, o especialista acredita que o projeto ficará na gaveta por um tempo. "Hoje não se fala mais em um terceiro período de discussão constitucional. Então, a partir de agora, o que o Chile vai tocar politicamente são as reformas que o governo vai propor ao Parlamento sobre as questões tributária, de saúde e de educação, como a gratuidade ou não de determinadas universidades públicas", analisa.E apesar dos projetos não terem avançado no país, o professor da Unesp acredita que a democracia chilena não está ameaçada, mesmo com a herança autoritária presente na atual Carta Magna. "Esses obstáculos foram sendo enfrentados paulatinamente, através de consensos entre o oficialismo e alguns setores da direita que topavam fazer mudanças na Constituição. Então isso acabou, de uma certa forma, através de um processo que não tem fim [as reformas progressistas] e que não se completou", conclui.Quem governa o Chile hoje?Eleito sob grande expectativa quase dois anos após os grandes protestos que tomaram conta do Chile, cuja população é de pouco mais de 19 milhões de pessoas, Gabriel Boric segue no poder até 2025. Em meio à inflação alta, à criminalidade e ao fracasso na questão constitucional, a popularidade do político mais jovem que já governou o país chegou a 35% no ano passado. Para o jornalista Victor Farinelli, quem votou em Boric à espera de um governo mais progressista está "frustrado" com o andamento da atual gestão."É um pouco parecido ao que foi o governo Dilma em 2015, quando ela ganha a eleição e leva o Joaquim Levy [para dentro da gestão, tornando-se ministro da Fazenda], adotando um pouco da postura do candidato perdedor, no caso o Aécio Neves. De qualquer forma, o eleitor sente que o projeto que venceu em 2021 não teve as principais demandas colocadas em prática, como a participação das mulheres [na política], o sistema público de saúde", exemplifica.Segundo o analista, uma das questões que avançaram foi o investimento para potencializar a indústria do lítio, deixando o país menos dependente economicamente da exploração de cobre. "Só que você vai continuar dependendo da extração de minérios. Mas, mesmo assim, não é uma demanda tão arraigada entre os setores de esquerda, que votaram por melhorias sociais."Diante disso, o ex-correspondente no Chile acredita que a direita no país tem conseguido pautar mais o debate político, diante do aumento do desemprego e da questão imigratória.
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Nem à esquerda e nem à direita: após dois 'nãos', Chile vai desistir de nova Constituição?
17:00 30.01.2024 (atualizado: 17:52 30.01.2024) Especiais
Sistema privado de previdência com "aposentadorias miseráveis", aumento do custo de vida e ausência de rede de saúde pública. Em 2019, milhões de chilenos tomaram as ruas diante do descontentamento com o sistema socioeconômico neoliberal, sob o lema "O Chile acordou". No ano seguinte, 75% da população votaram por uma nova Constituição.
Em pouco mais de 200 anos de história,
o Chile teve apenas quatro constituições, enquanto um país como o Brasil teve sete. E a última possui
marcas de um dos períodos mais difíceis da história chilena: foi promulgada durante a década de 1980,
na ditadura de Augusto Pinochet, uma das mais sangrentas de toda a América Latina. Com isso, reformas profundas na economia e na política do país eram dificultadas diante do texto constitucional, o que provocou
profundas insatisfações entre a sociedade do país ao longo do tempo.
Tudo isso eclodiu com as grandes manifestações de 2019, que começaram por conta da insatisfação com o aumento na tarifa do metrô em
Santiago, capital do país, quando
mais de 1 milhão de pessoas chegaram a tomar as ruas em apenas um dos atos.
Para estancar a crise,
o então presidente, Sebastián Piñera, chegou a pedir o afastamento de todos os ministros para estruturar um novo gabinete que fosse
capaz de atender às demandas. Correspondente por mais de 20 anos no Chile, o jornalista e subeditor do site Opera Mundi, Victor Farinelli, explicou ao podcast
Mundioka, da Sputnik Brasil, a situação do país na época.
"Tem a Previdência privada, que entrega aposentadorias miseráveis à maioria dos aposentados desde meados da década passada, e um sistema de saúde totalmente privado. É uma situação muito parecida com a que acontece nos Estados Unidos, onde não tem um sistema público e isso faz com que uma pessoa que tem uma doença, que requer um tratamento um pouco mais caro, acabe se endividando muito, principalmente as pobres e de classe média. Mas não havia uma liderança, era um movimento muito horizontal", acrescenta.
Uma das tentativas do
governo Piñera para conter a ebulição social foi justamente um plebiscito, em que o voto não era obrigatório, sobre a necessidade ou não de uma nova Constituição, aprovado por ampla maioria. Na sequência, houve a eleição do atual presidente de esquerda, Gabriel Boric,
na época com 35 anos e considerado o mais novo da história — com pouco mais de 55% dos votos, o político superou José Antonio Kast, de direita. E agora
caberia a Boric comandar a mudança constitucional no país.
Por que os chilenos rejeitaram a nova Constituição?
Nem à esquerda e nem à direita. Os dois plebiscitos que sucederam os protestos e a aprovação dos chilenos à nova Carta Magna foram rejeitados. Para Victor Farinelli, o principal motivo que levou a população a
não aceitar nenhum dos textos foi justamente a falta de liderança política, inclusive um
apoio maior do próprio governo, que defendia a mudança.
"A primeira, que foi rejeitada em 2022, tinha muitos pontos positivos e respondia a grande parte das demandas daquela revolta social de 2019, mas faltou uma liderança que pudesse divulgar melhor o que estava sendo proposto. Era uma proposta muito parecida com o que o Boric defendeu na campanha presidencial. […] E no ano passado tivemos o segundo processo, dominado pela extrema-direita, totalmente diferente da proposta de 2022, só que também faltou ali uma liderança", enfatiza.
Diante da rejeição eleitoral aos textos dos dois campos políticos, o analista acredita que o Chile entrou em um "limbo constitucional", já que há um sentimento de fracasso e o próprio governo atual não sabe qual caminho seguir. "No fim das contas, aquela indignação continua pendente, e com o agravante da frustração em dois processos que eram inéditos na história do país […]. E nenhuma Constituição no Chile foi feita através de uma assembleia, todas foram entre quatro paredes, por políticos tradicionais e uma aristocracia", pontua.
Quais as diferenças entre os dois textos rejeitados no Chile?
Já o doutor em história pela Universidade de São Paulo (USP) e professor titular de história da América na Universidade Estadual Paulista (Unesp) Alberto Aggio disse à Sputnik Brasil que há pontos em comum nos dois textos constitucionais rejeitados. "A ideia de um Estado democrático e social permaneceu. Mas no primeiro projeto não se falava do Chile como república, mas um Estado de vários povos. O plurinacionalismo estava presente, e isso é uma mudança estrutural muito grande. Ainda havia um espectro de direitos alargadíssimo, que no segundo foi descartado", resume.
Com o país voltado para as eleições municipais neste ano, que funcionam como um termômetro da popularidade do governo central, e também o cansaço com uma nova Constituição, o especialista acredita que o projeto ficará na gaveta por um tempo. "Hoje não se fala mais em um terceiro período de discussão constitucional. Então, a partir de agora, o que o Chile vai tocar politicamente são as reformas que o governo vai propor ao Parlamento sobre as questões tributária, de saúde e de educação, como a gratuidade ou não de determinadas universidades públicas", analisa.
E apesar dos projetos não terem avançado no país, o professor da Unesp acredita que a democracia chilena não está ameaçada, mesmo com a herança autoritária presente na atual Carta Magna. "Esses obstáculos foram sendo enfrentados paulatinamente, através de consensos entre o oficialismo e alguns setores da direita que topavam fazer mudanças na Constituição. Então isso acabou, de uma certa forma, através de um processo que não tem fim [as reformas progressistas] e que não se completou", conclui.
17 de dezembro 2023, 20:28
Quem governa o Chile hoje?
Eleito sob grande expectativa quase dois anos após os grandes protestos que tomaram conta do Chile, cuja população é de pouco mais de 19 milhões de pessoas,
Gabriel Boric segue no poder até 2025. Em meio à inflação alta, à criminalidade e ao fracasso na questão constitucional, a popularidade do político mais jovem que já governou o país
chegou a 35% no ano passado. Para o jornalista Victor Farinelli,
quem votou em Boric à espera de um governo mais progressista está "frustrado" com o andamento da atual gestão.
"É um pouco parecido ao que foi o governo Dilma em 2015, quando ela ganha a eleição e leva o Joaquim Levy [para dentro da gestão, tornando-se ministro da Fazenda], adotando um pouco da postura do candidato perdedor, no caso o Aécio Neves. De qualquer forma, o eleitor sente que o projeto que venceu em 2021 não teve as principais demandas colocadas em prática, como a participação das mulheres [na política], o sistema público de saúde", exemplifica.
Segundo o analista,
uma das questões que avançaram foi o investimento para potencializar a indústria do lítio, deixando o país
menos dependente economicamente da exploração de cobre. "Só que você vai continuar dependendo da extração de minérios. Mas, mesmo assim, não é uma demanda tão arraigada entre os setores de esquerda, que votaram por melhorias sociais."
Diante disso, o ex-correspondente no Chile acredita que a direita no país tem conseguido pautar mais o debate político, diante do aumento do desemprego e da questão imigratória.
"Esse é um problema. Nisso que a extrema-direita consegue manter os seus temas vigentes, principalmente a questão do ódio aos imigrantes. Aquela coisa, como você tem um desemprego muito alto, é muito fácil vender um discurso de que o imigrante é que está roubando seu emprego. O imigrante venezuelano, colombiano, que são duas comunidades que cresceram muito no Chile nos últimos anos, desde antes da pandemia. E com esse aumento do desemprego, esse discurso, obviamente, ganhou muito potencial, e a extrema-direita está sabendo usar", finalizou.