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Recessão técnica e falta até de alface nas prateleiras: crise no Reino Unido está longe do fim?

© AP Photo / Alastair GrantPrateleira de supermercado com aviso sobre falta de legumes e verduras por conta das condições climáticas do Reino Unido. Londres, 28 de fevereiro de 2023
Prateleira de supermercado com aviso sobre falta de legumes e verduras por conta das condições climáticas do Reino Unido. Londres, 28 de fevereiro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 03.04.2024
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Problemas típicos de economias emergentes, o Reino Unido chegou a conviver com inflação de quase 20% e ainda viu diversos produtos faltarem nas prateleiras dos supermercados, como legumes e até ovos. Turbulências, primeira-ministra que não ficou no poder nem por seis semanas e saída da UE são apenas alguns dos acontecimentos nos últimos anos.
Na terra da rainha, a situação nos últimos quatro anos não tem sido nada boa: para além da saída traumática da União Europeia (UE), pouco antes do início da pandemia, em janeiro de 2020, o país passou a conviver com crises internas e chegou a ver uma inflação de quase 20%. Sem trabalhadores, principalmente no campo, a população do Reino Unido ainda teve um esvaziamento de produtos agrícolas, desde alface e tomate até ovos.
"Evidentemente o Reino Unido está vivendo uma crise, que consiste precisamente no fato de que o velho está morrendo e o novo não consegue nascer", resume ao podcast Mundioka o professor de relações internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) José Renato Ferraz da Silveira.
Em 2023, a região ainda passou por uma recessão técnica, com um encolhimento do produto interno bruto (PIB) de 0,1%. Depois de pouco mais de um ano e meio de governo, o primeiro-ministro Rishi Sunak recorreu até ao endurecimento das políticas migratórias para tentar melhorar a popularidade entre os eleitores, enquanto o Partido Conservador vê a oposição a caminho do poder após dez anos. "Lembrando que tivemos a Theresa May, Boris Johnson e Lisa Truss, que governou praticamente por seis semanas", ressalta o especialista.
O apoio incondicional aos Estados Unidos, que levou a Europa inteira a uma crise energética sem precedentes e gastos bilionários para apoiar a Ucrânia no conflito com a Rússia, também acentuou os problemas na região.

"A Carta do Atlântico, lá da Segunda Guerra Mundial, parece que não se alterou ao longo do tempo. Então aquele encontro entre Franklin Delano Roosevelt e [Winston] Churchill, lá no contexto da Segunda Guerra Mundial, praticamente foi sendo construído ao longo de todos esses anos do século XX e até hoje. O próprio Tony Blair [ex-premiê inglês] foi um grande alinhado ao governo [George W.] Bush, quando ele governou os Estados Unidos. E até havia clipes, eu me recordo de um clipe que mostrava o Tony Blair como um cachorrinho do Bush", exemplifica o especialista.

Quais são os países que compõem o Reino Unido?

Formado por Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte, o Reino Unido também vê um crescimento de grupos políticos que defendem a independência das nações, principalmente os escoceses, que chegaram a ter um referendo que questionaria a população sobre o assunto vetado pela Suprema Corte britânica.
"Então, veja, houve um aspecto, trataram de uma questão jurídica para tentar inviabilizar, impossibilitar esse separatismo escocês. E o que é interessante é que os separatistas escoceses argumentam isso porque querem fazer parte da União Europeia […]. Houve um referendo há dez anos, quando 55% votaram para se manter fazendo parte do Reino Unido e 45%, pró-independência", explica.
Além disso, ao contrário das demais nações, a Escócia vive um crescimento expressivo em termos europeus, aponta o especialista. Ao mesmo tempo, na Irlanda do Norte as discussões para a unificação com a Irlanda, deixando o Reino Unido, também foram retomadas.
"Foi nomeado o Simon Harris como novo líder do partido governista na Irlanda, e um dos grandes desafios que ele terá será essa questão. Um dos partidos que apoiam o seu governo é nacionalista e quer, novamente, que a reunificação volte ao centro da opinião pública", pontua.
Outra questão que sempre é levantada diz respeito à manutenção da monarquia no país. Após a morte da rainha Elizabeth II, "as velhas cicatrizes do Império Britânico voltaram a assombrar", segundo o professor da UFSM.
"Até me lembro, quando o Tony Blair era o primeiro-ministro, ele também era bastante crítico em relação à questão da Coroa Britânica. O nome é até bastante crítico, Carlos III [que assumiu o trono após a morte da mãe]. Se vocês se lembrarem, o Carlos I foi decapitado e o Carlos II foi deposto. Não é um nome muito interessante", brinca.

Como é a economia do Reino Unido hoje?

Apesar de ter equilibrado a inflação, que está atualmente em quase 4%, e de um crescimento de 0,2% no início deste ano, impulsionado pela recuperação do varejo e da construção civil, Silveira pontua que ainda é muito cedo para considerar que a economia saiu da recessão.
"Então vamos somar inflação dos alimentos, inflação no preço dos imóveis, inflação em relação ao preço do aluguel dos imóveis, falta de alimentos nas prateleiras. Veja, é uma grande crise econômica. E até tem alguns analistas britânicos que dizem que esse cenário desolador é muito parecido com o contexto inglês do Reino Unido na Segunda Guerra Mundial", disse.
Anthony Albanese, primeiro-ministro do Reino Unido (à esquerda), Joe Biden, presidente dos EUA (segundo à esquerda), e Rishi Sunak, primeiro-ministro da Austrália (segundo à direita), caminham durante discussões do pacto trilateral AUKUS na base naval de Point Loma em San Diego, Califórnia, EUA, 13 de março de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 21.03.2024
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Tudo isso deve levar a uma queda acentuada do apoio ao Partido Conservador, que, segundo pesquisa divulgada nesta quarta-feira (3), deve conquistar apenas 155 dos 650 assentos do Parlamento, enquanto o Partido Trabalhista pode ficar com mais de 400, o que provocaria uma mudança no governo. Isso também deve levar a um afastamento dos Estados Unidos na política externa, principalmente em uma eventual vitória de Donald Trump no fim do ano.

"Podemos projetar esse cenário imaginando o final deste ano, tanto nas eleições britânicas quanto também nas eleições norte-americanas, o retorno de Trump e a vitória do Partido Trabalhista britânico. Até é interessante citar, a população britânica parece que está engajada a retornar o Partido Trabalhista ao poder, que eles acreditam que essas questões econômicas a oposição saberá trabalhar muito melhor do que o Partido Conservador", declarou.

Já o professor de relações internacionais do Ibmec Ricardo Caichiolo acrescenta que a manutenção da taxa de juros acima de 5% no país, considerada alta para os padrões ingleses, é outro problema que afeta a população do Reino Unido.
"Acaba sendo um grande problema para os devedores, as pessoas que fizeram empréstimos ou hipotecas. De fato, é um momento de aperto no cinto de boa parte das famílias", explica. Apesar disso, há uma expectativa de redução dos percentuais nos próximos meses, o que poderia levar ao aumento dos investimentos.
"É uma política um pouco cautelosa, muito focada em manter a taxa inflacionária no patamar desejado. A intenção do que seria o Comitê de Política Monetária do Banco da Inglaterra, eles visam chegar a um patamar de 2% de inflação. Eles estão indo nesse sentido".
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