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Presença do Brasil na Antártica é crucial para diplomacia da ciência, nota analista

© flickr.com / Edson Vandeira / Marinha do BrasilPesquisadores brasileiros da operação Antártica (Operantar XL) na Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF), em 19 de novembro de 2021
Pesquisadores brasileiros da operação Antártica (Operantar XL) na Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF), em 19 de novembro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 16.01.2025
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Cinco anos após ser reinaugurada, depois do incêndio que destruiu suas instalações, a Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF), a "casa do Brasil na Antártica", tem papel geopolítico e contribui para pesquisas, entre elas a que analisa por que o continente gelado está ficando verde.
O Brasil integra o seleto grupo de 29 países que têm estações de pesquisas científicas na Antártica. Localizada na ilha do Rei George, na baía do Almirantado, a EACF foi atingida por um incêndio de grandes proporções em 2012, que destruiu 70% de suas instalações. Ela foi reaberta novamente em dezembro de 2020, tornando a operar um centro de pesquisa no continente.
Nesta quinta-feira (16), data em que a reinauguração da estação completa cinco anos, a Sputnik Brasil conversou com especialistas que explicam os impactos do incêndio sobre as pesquisas brasileiras na Antártica e qual a principal contribuição científica da estação.
Gabriele Hernandez, doutoranda do Instituto de Estudos Estratégicos (Inest), da Universidade Federal Fluminense (UFF), e do Centro para Estudos da América Latina e Caribe (CLACS), da Southwest University of Science and Technology, afirma que não houve um atraso substancial nas pesquisas por conta do incêndio, pois havia pesquisadores brasileiros atuando em outras estações e acampamentos.
Além disso, imediatamente após o incêndio, o Programa Antártico Brasileiro (Proantar), coordenado pela Marinha do Brasil, enviou uma série de Módulos Antárticos Emergenciais (MAEs), que são espécies de contêineres que servem como laboratórios de pesquisa.

"Então, usando essas instalações, as pesquisas da Antártica não pararam. Era uma preocupação, que não parasse, para não ter nenhum tipo de complicação perante o Tratado da Antártica, porque, para você ter estação lá e ser um membro signatário do tratado, tem que fazer pesquisa", explica.

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Ela acrescenta que a estação foi reinaugurada com sistemas de comunicação e satélite aprimorados, substituindo a infraestrutura anterior, de 1983, que estava datada. Segundo ela, o Brasil acabou injetando mais dinheiro na Antártica do que normalmente injetava, não só para a reconstrução da estação, para a limpeza da região, para a instalação dos módulos antárticos, mas também para fazer ciência.
Hernandez aponta que a questão ambiental é um dos principais temas pesquisados na estação, mas também há trabalhos envolvendo clima, meteorologia, oceanografia, biologia e biologia antártica. Ela acrescenta que as pesquisas realizadas na estação contribuem para entender como a Antártica impacta o clima do Brasil, com risco de o derretimento das calotas polares fazer submergir cidades portuárias, e da América do Sul como um todo.
"O Brasil, por exemplo, tinha uma pesquisa muito importante de arqueologia na Antártica. A Universidade Federal de Minas Gerais tinha uma pesquisa na área de vestimentas que eram deixadas por baleeiros no século XIX, então fazia pesquisa com as botas dos baleeiros para tentar traçar uma linha histórica dessas pessoas que estavam lá na região. A gente tem pesquisas também na área de humanidades, de relações internacionais, defesa, estratégia, pesquisas na área de psicologia também, medicina polar."
Ela afirma que o que acontece na América do Sul, como, por exemplo, as queimadas no Pantanal, impacta a Antártica, e que o aumento da temperatura global também tem afetado o continente.

"A gente teve aí um verão antártico que a temperatura chegou a 30 °C, o que não deveria acontecer de forma alguma. A Antártica está começando a ficar verde, porque é uma região que não tem uma vegetação significativa além de algas. Não tem árvores, por exemplo, não tem flores, nenhum outro tipo de vida nesse sentido, mas a gente está começando a ver mais algas, um número cada vez maior. Isso não é um bom sinal, [é] sinal de que o gelo está derretendo, as temperaturas estão aumentando e esse ecossistema, que é extremamente frágil, que é delicado, está se alterando também", alerta a especialista.

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Ela afirma que o Brasil não figura entre os países latino-americanos mais avançados em pesquisa na Antártica, porque há duas potências antárticas gigantes que são Chile e Argentina.

"Chile e Argentina não são grandes só na América do Sul, eles são as principais potências antárticas em comparação com o resto do mundo também. Não é pequena a participação deles, são países que reivindicam territórios na Antártica, então a presença deles ali é muito maior do que a de vários outros países. São os dois mais próximos da Antártica também. Eles têm um histórico na região muito antigo, a Argentina tem a estação antártica mais antiga, que é a base Orcadas, que está em funcionamento desde o começo do século XX, então eles consideram que essa região faz parte do território deles, e eles têm pesquisas ali há muito mais tempo."

Hernandez acrescenta que não é uma aspiração do Brasil ser o país que tem maior pesquisa na região, porque não tem como competir com esses Estados.
Jefferson Cardia Simões, pesquisador do Centro Polar e Climático (CPC), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), coordenador da Expedição Internacional de Circum-Navegação Costeira Antártica, explica que o incêndio na Estação Comandante Ferraz não afetou as pesquisas brasileiras porque apenas 20% a 25% delas são feitas na instalação, que, segundo ele, tem um papel mais geopolítico que científico, de mostrar que é a casa do Brasil na Antártica. Segundo ele, entre 40% e 60% das pesquisas são feitas no navio polar Maximiano, que é um navio de primeira classe para pesquisa científica, e o restante nos MAEs.

"As pesquisas não pararam, a produção científica não caiu — até aumentou durante esse período —, mas, é claro, tendo uma estação é muito melhor", afirma.

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Ele afirma que pesquisas de impacto ambiental e biologia marinha e algumas pesquisas de química da atmosfera se destacam na pesquisa brasileira antártica.
"A pesquisa coordenada por mim dentro do Programa Antártico e no âmbito do Centro Polar e Climático da UFRGS tem como objetivo duas grandes questões, uma [delas] usar os testemunhos de gelo, que são os melhores registros que nós temos da história do clima e da química da atmosfera ao longo de milhares de anos, para reconstruir o clima da Antártica e examinar conexões com o clima sul-americano e, particularmente, o Brasil."
Ele explica que a estação reinaugurada está preparada para resistir a incêndios, já que foram tomadas medidas antes desconsideradas, como o isolamento das salas de máquinas do resto da estação.
"A estação está em dois grandes módulos, um de trabalho e outro de residência, com a possibilidade de ser cortado no caso de uma emergência. Tudo isso para reduzir a dependência e […] [aumentar] a segurança em caso de algum incêndio. É melhor dizer que sempre o incêndio é uma das grandes ameaças das estações polares, mesmo porque, durante o inverno, no caso de Ferraz, e durante todo o ano em outras estações, a água está em estado sólido. Então é um constante perigo", afirma.
Segundo Simões, ao longo dos 42 anos do Programa Antártico Brasileiro, uma das principais contribuições do ponto de vista brasileiro é relativa a entender que a região antártica é tão importante quanto os trópicos, leia-se também a Amazônia, para o clima da América do Sul.
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"Ou seja, os sistemas estão casados. Nós estamos avançando muito no entendimento, por exemplo, de como as frentes frias ou friagens, que muitas vezes chegam até o sul da Amazônia, se formam no oceano Austral, antigamente conhecido como oceano Antártico. Um avanço mais recente foi detectar a poluição global de arsênio vindo da América do Sul, principalmente pelas minas de cobre do Chile, e também de urânio vindo de minas abertas, a céu aberto, na Austrália."

Ele acrescenta que nos últimos dois anos as pesquisas detectaram que os rios atmosféricos que saem da Amazônia passam pelo Rio Grande do Sul e seguem para a Antártica, trazendo os poluentes.

"No momento nós estamos investigando se o carbono negro, subproduto das queimadas da queima de hidrocarboneto, ou seja, combustível, está chegando à Antártica", afirma.

O especialista destaca que, para além da necessidade do Brasil de manter pesquisas na Antártica para garantir o direito ao voto no Tratado Antártico, a presença do país é crucial para a diplomacia da ciência.

"Hoje a pesquisa não é feita só por um grupo, e muito menos por um indivíduo, nas regiões polares. Nós precisamos de uma estrutura que é cara, e a melhor maneira de facilitar esse trabalho é dividindo recursos. Então o Brasil é essencial, principalmente pela sua liderança na América do Sul e, agora, cada vez mais, pela participação integrada com países do BRICS, notadamente a Índia, a China e a Rússia. É claro, o capital político, e isso eu tenho enfatizado muito, depende da qualidade da ciência", enfatiza o pesquisador.

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