https://noticiabrasil.net.br/20250311/transformar-guardas-em-mini-pms-e-fazer-puxadinho-da-seguranca-publica-notam-analistas-38799173.html
Transformar guardas em 'mini-PMs' é fazer 'puxadinho' da segurança pública, notam analistas
Transformar guardas em 'mini-PMs' é fazer 'puxadinho' da segurança pública, notam analistas
Sputnik Brasil
Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas afirmam que o debate sobre transformar guardas municipais em polícias municipais reflete a falência das polícias... 11.03.2025, Sputnik Brasil
2025-03-11T18:36-0300
2025-03-11T18:36-0300
2025-03-12T12:38-0300
notícias do brasil
ignacio cano
rio de janeiro
são paulo
eduardo paes
brasil
supremo tribunal federal (stf)
stf
sputnik brasil
proposta de emenda à constituição (pec)
https://cdn.noticiabrasil.net.br/img/07e9/03/0b/38799716_0:0:2048:1153_1920x0_80_0_0_5fc4b14c313f9a5c848ed2db16b7de92.jpg
Em fevereiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que as guardas municipais podem fazer policiamento em vias públicas. A decisão é parte da discussão da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública, apresentada pelo governo federal, que, entre outras coisas, visa centralizar e constitucionalizar o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP).A PEC mira um dos principais problemas apontados pela sociedade brasileira, a violência, e é debatida em um momento que as facções criminosas brasileiras se internacionalizam, se infiltram na política e cooptam agentes de segurança pública.Na esteira da determinação do STF, prefeituras de cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belém apresentaram projetos para transformar suas respectivas guardas municipais em polícias municipais, ampliando as funções dos agentes para abranger o policiamento ostensivo.À Sputnik Brasil, Ignacio Cano, professor do Departamento de Sociologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coordenador do Laboratório de Análise da Violência (LAV), avalia que a PEC da Segurança Pública é bem-intencionada no sentido de que tenta articular o sistema de segurança pública no Brasil, "que existe no papel, mas não existe na prática".Segundo ele, seria muito importante que fossem traçadas diretrizes, critérios gerais, federais, que todos os estados tivessem que cumprir.Ele ressalta, no entanto, que transformar as guardas municipais em "mini-PMs" significa perder a oportunidade de ter uma instituição de segurança pública com um perfil diferenciado."Essa ideia de proteção do patrimônio, uma guarda mais comunitária, com outro tipo de relação com as pessoas, e […] não era armada, portanto com menos riscos para os próprios membros e para a sociedade, isso vem mudando rapidamente. Isso tem várias explicações. Uma delas é que os municípios grandes que têm recursos querem ter um plano próprio de segurança pública com uma polícia própria", explica.Citando São Paulo e Rio de Janeiro como exemplo, Cano afirma que cidades com muitos recursos e lideradas por prefeitos que têm projetos políticos tendem a querer uma guarda municipal com mais atribuições e com atribuições de polícia ostensiva, o que vem acontecendo na prática aos poucos, sobretudo no estado de São Paulo, há algum tempo.Ele acrescenta que, na prática, isso significa a falência das polícias militares, uma vez que, se elas estivessem funcionando de maneira correta, não estaria sendo cogitada a criação de uma polícia municipal.Cano afirma ainda que a criação de polícias municipais traz o risco de criar duas forças de segurança: uma delas bem-treinada e equipada, e outra defasada, sem que haja uma coordenação traçada entre as duas."Além da dificuldade de coordenação, a gente vai enfrentar uma grande heterogeneidade, vai ter guardas melhor equipadas, melhor treinadas, guardas mal-treinadas, mais descontroladas… A gente corre o risco de um uso abusivo da força letal, que é um padrão geral das polícias militares brasileiras, que agora pode se estender às guardas municipais. Então os riscos são variados, os benefícios são que a gente vai ter uma PM ou outra PM com mais efetivos. Mas qual é a diferença entre o papel de uma e outra? Qual é o mandato de cada uma? Como vão se coordenar? Tudo isso não está previsto ainda e apresenta desafios significativos."Carolina Ricardo, mestre em direito pela Universidade de São Paulo (USP), socióloga e diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, afirma à Sputnik Brasil que o debate em torno da possibilidade de as guardas municipais realizarem policiamento ostensivo já vem ocorrendo desde 2014, embora tenha ganhado impulso agora. Segundo ela, em 2023 foi aprovado o Estatuto das Guardas, um decreto que organiza a possibilidade de fazerem policiamento ostensivo, prisões em flagrante, e o que a decisão do STF fez foi garantir "uma certa segurança para as guardas que já atuam dessa forma".No recorte do Rio de Janeiro, ela afirma que há uma tentativa do prefeito Eduardo Paes (PSD) de capitalizar politicamente a agenda da segurança pública, e sublinha que mais importante que isso seria desenhar uma guarda com carreira clara e transparente, com protocolos de atuação, com mecanismos de uso da força, com ouvidoria e corregedoria.A especialista enfatiza que no Brasil há o desafio de traçar uma agenda de segurança pública apartada de ideologia política."O campo progressista acha que precisa resolver todas as mazelas sociais para lidar com a violência, e a extrema-direita acha que tem que violar todos os direitos e ir para cima da bandidagem, violência policial como resposta para o crime. Esse tem sido o grande problema histórico do nosso país."Ricardo firma que é possível, sim, ter políticas conciliatórias, e para isso é necessária uma agenda que "não seja nem de direita nem de esquerda, mas que seja capaz de lidar com a complexidade do problema".Ela afirma que a militarização das guardas traz também o risco de milicialização, apontando a relação promíscua das polícias civis e militares com o crime organizado, e alerta que aumentar o poder de polícia ostensiva da guarda municipal, sem estabelecer controles e contornos muito claros para essa atribuição, traz o risco de "ter na guarda municipal mais um agente de milícia"."Senão a gente vê casos como o de São Paulo, em que uma operação do Ministério Público na cracolândia aqui identificou que guardas municipais vendiam segurança aos comerciantes naquela região e repassavam armas ao crime organizado. Então só dá para avançar com a guarda nesse papel de policiamento ostensivo se os contornos, a profissionalização e os controles forem muito bem definidos."Ricardo acrescenta que a ampliação de atribuição das guardas deve vir acompanhada de contrapartidas de profissionalização e proteção aos agentes, como garantia de equipamentos de proteção, acompanhamento psicológico e serviços de assistência social aos agentes.
rio de janeiro
são paulo
brasil
Sputnik Brasil
contato.br@sputniknews.com
+74956456601
MIA „Rossiya Segodnya“
2025
notícias
br_BR
Sputnik Brasil
contato.br@sputniknews.com
+74956456601
MIA „Rossiya Segodnya“
https://cdn.noticiabrasil.net.br/img/07e9/03/0b/38799716_228:0:2048:1365_1920x0_80_0_0_cef38684d3cc5c5bfc2a2cda23ab1bcf.jpgSputnik Brasil
contato.br@sputniknews.com
+74956456601
MIA „Rossiya Segodnya“
ignacio cano, rio de janeiro, são paulo, eduardo paes, brasil, supremo tribunal federal (stf), stf, sputnik brasil, proposta de emenda à constituição (pec), guarda municipal, força de segurança municipal , polícia municipal, exclusiva, segurança pública, crime organizado
ignacio cano, rio de janeiro, são paulo, eduardo paes, brasil, supremo tribunal federal (stf), stf, sputnik brasil, proposta de emenda à constituição (pec), guarda municipal, força de segurança municipal , polícia municipal, exclusiva, segurança pública, crime organizado
Transformar guardas em 'mini-PMs' é fazer 'puxadinho' da segurança pública, notam analistas
18:36 11.03.2025 (atualizado: 12:38 12.03.2025) Especiais
Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas afirmam que o debate sobre transformar guardas municipais em polícias municipais reflete a falência das polícias militares, e alertam que a medida, se tomada sem a imposição de controles e contornos claros, traz o risco de milicialização das guardas.
Em fevereiro, o
Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que
as guardas municipais podem fazer policiamento em vias públicas. A decisão é parte da discussão da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública, apresentada pelo governo federal, que, entre outras coisas, visa centralizar e constitucionalizar o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP).
A PEC mira um dos principais problemas apontados pela sociedade brasileira, a violência, e é debatida em um momento que as
facções criminosas brasileiras se internacionalizam, se infiltram na política e cooptam agentes de segurança pública.
Na esteira da determinação do STF, prefeituras de cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belém apresentaram projetos para transformar suas respectivas guardas municipais em polícias municipais, ampliando as funções dos agentes para abranger o policiamento ostensivo.
À
Sputnik Brasil, Ignacio Cano, professor do Departamento de Sociologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coordenador do Laboratório de Análise da Violência (LAV), avalia que a
PEC da Segurança Pública é bem-intencionada no sentido de que tenta articular o sistema de segurança pública no Brasil,
"que existe no papel, mas não existe na prática".
Segundo ele, seria muito importante que fossem traçadas diretrizes, critérios gerais, federais, que todos os estados tivessem que cumprir.
"Seria também muito importante que as informações de segurança pública fossem repassadas de forma regular a um ente federal, para ele poder consolidar e ter um panorama nacional, que hoje quem faz isso é uma ONG, porque o governo federal tem receio político de fazer isso e acabar suscitando sensibilidade nos estados", afirma.
Ele ressalta, no entanto, que transformar as guardas municipais em "mini-PMs" significa perder a oportunidade de ter uma instituição de segurança pública com um perfil diferenciado.
"Essa ideia de proteção do patrimônio, uma guarda mais comunitária, com outro tipo de relação com as pessoas, e […] não era armada, portanto com menos riscos para os próprios membros e para a sociedade, isso vem mudando rapidamente. Isso tem várias explicações. Uma delas é que os municípios grandes que têm recursos querem ter um plano próprio de segurança pública com uma polícia própria", explica.
Citando São Paulo e Rio de Janeiro como exemplo, Cano afirma que cidades com muitos recursos e lideradas por prefeitos que têm projetos políticos tendem a querer uma guarda municipal com mais atribuições e com atribuições de polícia ostensiva, o que vem acontecendo na prática aos poucos, sobretudo no estado de São Paulo, há algum tempo.
Ele acrescenta que, na prática, isso significa a falência das polícias militares, uma vez que, se elas estivessem funcionando de maneira correta, não estaria sendo cogitada a criação de uma polícia municipal.
"Também significa, em casos como o Rio de Janeiro, em que a Polícia Militar entra em tantos confrontos armados, tantos tiroteios, que, se você arma a guarda, primeiro gera um risco muito maior, obviamente, para os integrantes da guarda e, segundo, aumenta o risco de tiroteios para a população."
Cano afirma ainda que a criação de polícias municipais traz o risco de criar duas forças de segurança: uma delas bem-treinada e equipada, e outra defasada, sem que haja uma coordenação traçada entre as duas.
"Além da dificuldade de coordenação, a gente vai enfrentar uma grande heterogeneidade, vai ter guardas melhor equipadas, melhor treinadas, guardas mal-treinadas, mais descontroladas… A gente corre o risco de um uso abusivo da força letal, que é um padrão geral das polícias militares brasileiras, que agora pode se estender às guardas municipais. Então os riscos são variados, os benefícios são que a gente vai ter uma PM ou outra PM com mais efetivos. Mas qual é a diferença entre o papel de uma e outra? Qual é o mandato de cada uma? Como vão se coordenar? Tudo isso não está previsto ainda e apresenta desafios significativos."
Carolina Ricardo, mestre em direito pela Universidade de São Paulo (USP), socióloga e diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, afirma à Sputnik Brasil que o debate em torno da possibilidade de as guardas municipais realizarem policiamento ostensivo já vem ocorrendo desde 2014, embora tenha ganhado impulso agora. Segundo ela, em 2023 foi aprovado o Estatuto das Guardas, um decreto que organiza a possibilidade de fazerem policiamento ostensivo, prisões em flagrante, e o que a decisão do STF fez foi garantir "uma certa segurança para as guardas que já atuam dessa forma".
"Por outro lado, a gente vive uma questão, que eu considero mais preocupante, que é as guardas se verem como a grande força de segurança, de fazer exclusivamente o policiamento ostensivo, de ir para cima da bandidagem nos moldes do que a Polícia Militar vem fazendo no Brasil e que, na verdade, não tem trazido grandes resultados para nossa segurança pública. Então essas decisões do STF são importantes por um lado, mas por outro lado elas legitimam uma forma de agir da guarda municipal que não é a vocação para a qual elas foram criadas", avalia.
No recorte do Rio de Janeiro, ela afirma que há uma tentativa do prefeito Eduardo Paes (PSD) de capitalizar politicamente a agenda da segurança pública, e sublinha que mais importante que isso seria desenhar uma guarda com carreira clara e transparente, com protocolos de atuação, com mecanismos de uso da força, com ouvidoria e corregedoria.
A especialista enfatiza que no Brasil há o desafio de traçar uma agenda de segurança pública apartada de ideologia política.
"O campo progressista acha que precisa resolver todas as mazelas sociais para lidar com a violência, e a extrema-direita acha que tem que violar todos os direitos e ir para cima da bandidagem, violência policial como resposta para o crime. Esse tem sido o grande problema histórico do nosso país."
Ricardo firma que é possível, sim, ter políticas conciliatórias, e para isso é necessária uma agenda que "não seja nem de direita nem de esquerda, mas que seja capaz de lidar com a complexidade do problema".
"Uma visão que reprima o crime, porque as pessoas estão sofrendo violência, elas estão com medo, legitimamente com medo. Uma pessoa pobre que sai da sua casa na periferia com seu celular morre de medo de ter o celular roubado, assim como uma pessoa rica, em bairro rico. A gente vê os homicídios, ainda que caindo no Brasil, ainda em patamares muito altos, o crime organizado fortalecido", observa.
Ela afirma que a militarização das guardas traz também o risco de milicialização, apontando a relação promíscua das polícias civis e militares com o crime organizado, e alerta que aumentar o poder de polícia ostensiva da guarda municipal, sem estabelecer controles e contornos muito claros para essa atribuição, traz o risco de "ter na guarda municipal mais um agente de milícia".
"Senão a gente vê casos como o de São Paulo, em que uma operação do Ministério Público na cracolândia aqui identificou que guardas municipais vendiam segurança aos comerciantes naquela região e repassavam armas ao crime organizado. Então só dá para avançar com a guarda nesse papel de policiamento ostensivo se os contornos, a profissionalização e os controles forem muito bem definidos."
Ricardo acrescenta que a ampliação de atribuição das guardas deve vir acompanhada de contrapartidas de profissionalização e proteção aos agentes, como garantia de equipamentos de proteção, acompanhamento psicológico e serviços de assistência social aos agentes.
"Como tudo no Brasil é um puxadinho, se esse aumento da atribuição for mais um puxadinho, sem o investimento necessário nesses aspectos que eu mencionei, a gente vai ter guardas extremamente esgarçadas, cansadas, querendo fazer muita coisa, sem o investimento necessário para dar conta disso. E o meu medo é que essa ânsia por enfrentar o crime a qualquer custo, para ir para cima da bandidagem, […] faça com que as nossas instituições de segurança já nasçam meio esgarçadas, meio capengas, que é o que pode acontecer com as guardas municipais", afirma a especialista.
Acompanhe as notícias que a grande mídia não mostra!
Siga a Sputnik Brasil e tenha acesso a conteúdos exclusivos no nosso canal no Telegram.
Já que a Sputnik está bloqueada em alguns países, por aqui você consegue baixar o nosso aplicativo para celular (somente para Android).