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Brasil 'ainda está discutindo Angra 3': o que o país precisa para avançar no setor nuclear?

© flickr.com / Ministério de Minas e Energia / Saulo CruzPainel da usina nuclear de Angra 1, em Angra dos Reis. Rio de Janeiro, 26 de fevereiro de 2018
Painel da usina nuclear de Angra 1, em Angra dos Reis. Rio de Janeiro, 26 de fevereiro de 2018 - Sputnik Brasil, 1920, 17.03.2025
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Previsões apontam que até 2050 os países do BRICS serão responsáveis por pelo menos metade da produção e do consumo mundial de energia. Na esteira das discussões sobre energia limpa e renovável, a energia nuclear pode ser um fator decisivo para o desenvolvimento energético? E o Brasil, o que precisa para avançar no campo?
Em entrevista ao Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, Astrid Cazalbón, doutoranda em relações internacionais na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coordenadora de projetos do Observatório Latino-Americano da Geopolítica Energética, ressaltou que a energia nuclear é uma das mais ricas, porque ela é diversa e pode ser trabalhada com as tecnologias nucleares, a área da saúde, a área da medicina, agricultura e na própria formação científica.
"Ter uma planta de energia nuclear ou desenvolver tecnologias nucleares num país, numa região específica, vai abrir um leque de oportunidades", afirma.
Entre os países fundadores do BRICS, entende-se que, quanto às vantagens da energia nuclear, o desenvolvimento e a implementação a nível de pesquisa e infraestrutura variam. Ao passo que a Rússia é líder no setor e a China "constrói por ano vários reatores, e ela é, do BRICS, a que mais aumentou a participação em energia nuclear", no Brasil a discussão ficou estagnada e segue estigmatizada aos olhos da população geral.
#575 Mundioka - Sputnik Brasil, 1920, 17.03.2025
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Em um balanço rápido, Cazalbón retoma que desde, pelo menos, 2001, a China tem um crescimento considerado quase exponencial na área nuclear, sendo um dos países do BRICS que mais investe no setor.
A Rússia, por sua vez, possui uma "cultura imensa na área nuclear" e conta "com a empresa Rosatom".

"Eu tive a oportunidade de viajar à Rússia e tive a oportunidade de ver, por exemplo, centros de tecnologias de formação, uma parte acadêmica mesmo, de acadêmicos da área nuclear. […] Eles têm uma cultura nuclear que é o que não acontece aqui", conta a especialista.

Além disso, a Rússia vem desenvolvendo pequenos reatores modulares, que, segundo a pesquisadora, têm várias vantagens no sentido de que não precisam de um investimento tão grande, podendo ser construídos por países emergentes que têm problemas para conseguir financiamento.
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Quanto à Índia, ela também pontua que cresceu, mas menos em relação aos outros dois. A África do Sul, por sua vez, entre os membros fundadores do BRICS, é a mais "atrasada" na discussão, mas, de acordo com Cazalbón, os sul-africanos se mostram interessados em levar à frente a energia nuclear e em desenvolver pequenos reatores.

"Eles têm uma cabeça muito mais aberta para a energia nuclear hoje em dia. Então, mesmo que o programa deles ou que as usinas que têm lá ainda estejam em um estágio menor do que o Brasil, é provável que elas tomem um impulso maior", informa.

Já o Brasil, na visão da analista, ficou estagnado em comparação a outros países. Tanto a falta de investimento quanto a falta de informação são problemas apontados como desafiadores para o país avançar no setor nuclear.

'Brasil tem desafio enorme na área nuclear'

Cazalbón destaca a necessidade de uma mudança de pensamento sobre a energia nuclear de modo geral, que ainda associa o setor a acidentes como o de Chernobyl e de Fukushima, que não aconteceram diretamente como efeitos de reações nucleares.
"No Brasil, é imenso esse problema de poder dialogar com a população para que ela entenda realmente quando se fala de energia nuclear. […] O Brasil teria que, principalmente, formar a população para que ela não tenha essa ideia de colocar primeiro a questão dos acidentes ou a questão do armamento, mas começar a ver realmente como uma área estratégica de desenvolvimento nacional, desenvolvimento local, e que é uma área bem interessante também para fazer cooperação entre os países aqui da região ou com o BRICS", pontua.
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Para exemplificar o problema da estagnação, a pesquisadora faz duas ressalvas: "O Brasil ainda está discutindo Angra 3", que tem obras inacabadas, e a escassez de mão de obra técnica.

"Falta muito pessoal técnico especializado nessas áreas, porque o que era dos anos 50, 60, quando começaram todos esses programas aqui no Brasil, esse pessoal começou a envelhecer, começou a se aposentar, e agora precisamos de mais pessoal, [colaboradores] mais novos que entrem nessa área. Tem pouco pessoal entrando, apesar de ser uma área que tem grande potencial", destaca.

A questão da formação, tanto popular quanto em relação à mão de obra especializada, passa por investimento — outro desafio central que o Brasil precisa superar para avançar.
De acordo com a pesquisadora, os problemas relatados anteriormente inibem o investimento no setor. Para transpor essa situação, na visão dela, o Brasil precisa procurar acordos que sejam benéficos e que possam contar com transferência de tecnologia. Por outro lado, precisa garantir que as parcerias firmadas sejam negócios de médio a longo prazo.

Como o Brasil pode se beneficiar desenvolvendo o setor nuclear?

O Brasil, caso invista no desenvolvimento de energia nuclear no país, poderia avançar ainda mais numa parte estratégica que representa autonomia, segundo a pesquisadora: diversificar sua carteira de matrizes energéticas.
"A gente precisa realmente, para ter uma segurança energética — que é o máximo que um país procura para ter nas suas matrizes energéticas —, a segurança. A segurança é no sentido de não ter cortes, no sentido de ter uma fonte ou ter energia barata, acessível".
No caso da nuclear, uma fonte limpa e estável, no sentido de não sofrer com cortes ou gerar emissões, Cazalbón enxerga que, no setor, um leque de possibilidades é aberto com a construção de uma usina, e não devem ser considerados apenas os custos para o desenvolvimento dessa infraestrutura, desconsiderando todo o benefício que pode ser gerado.
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Além disso, ela cita a possibilidade dos pequenos reatores nucleares como uma opção mais barata, além de usinas menores e usinas que podem ser transportadas. Apesar de algumas dessas tecnologias estarem em fases de teste, o Brasil, para a pesquisadora, deveria fazer estudos de viabilidade, assim como outros países têm feito, para implementar a tecnologia em seu contexto.
Cazalbón insiste que o caminho para o avanço é, sobretudo, a educação sobre o setor. "Eu acredito que a formação seja a educação, a alfabetização energética." Conforme ela ressalta, é preciso conhecer que se constrói um hospital ou um centro de alta tecnologia para desenvolvimento de tecnologias de irradiação de alimentos ou para a questão de isótopos médicos.

"Precisamos falar mais sobre isso. Precisamos colocar isso em pauta e que a população também pressione esses parlamentares que tomam essas decisões que vão adiando o desenvolvimento local", argumenta.

Talvez, seguindo os caminhos sugeridos pela pesquisadora, o Brasil consiga reduzir a "diferença abismal" que ainda tem no setor nuclear em relação a outros países. Afinal, "ainda está discutindo Angra 3".
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