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Povo e militares estão unidos para romper imperialismo francês no Sahel, afirma jornalista brasileiro

© AP Photo / Sam MednickPovo nigerino comemora saída das tropas francesas do país, em julho de 2023. Cartaz em francês diz: "Abaixo à França, viva Putin"
Povo nigerino comemora saída das tropas francesas do país, em julho de 2023. Cartaz em francês diz: Abaixo à França, viva Putin - Sputnik Brasil, 1920, 03.10.2025
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Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, o jornalista Pedro Stropasolas, do Brasil de Fato, contou detalhes da gravação do documentário "Sahel: pátria ou morte" e as percepções que teve durante as filmagens.
Burkina Faso, Mali e Níger constroem, nos últimos anos, uma das uniões mais fortes em vigência entre países da África, por meio da Aliança dos Estados do Sahel (AES). O grupo, criado em 2023 e estabelecido a partir do conceito de defesa mútua, protege a soberania desses três países enquanto busca prosperidade social e econômica.
Uma das ações mais conhecidas da AES é a tentativa de ruptura definitiva com o imperialismo francês, que perdurou na região por mais de um século a partir da Conferência de Berlim, em 1884, quando países europeus dividiram a África para exploração das riquezas do continente.
Essa revolução social e militar no Sahel encontrou em China e Rússia a parceria de que precisava para prosperar em diferentes campos, desde a exploração de minerais até a construção de fábricas para o processamento de alimentos.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, o repórter Pedro Stropasolas, do Brasil de Fato, afirmou que a região vive uma nova fase de otimismo e prosperidade. Autor do documentário "Sahel: pátria ou morte", o jornalista declarou que a sinergia entre sociedade civil e militar chama atenção.

"Todas as agências de notícias que produzem algo sobre o Sahel têm essa tendência de trazer uma visão mais francesa desse processo, como levantes antipopulares, autoritários, um golpe militar comum, como outros que aconteceram e acontecem no continente africano. A primeira coisa que me chamou a atenção foi a sinergia, a relação orgânica, do povo com esses militares."

Atualmente, as três nações que compõem a AES são governadas por militares, os quais comandam um movimento classificado por Stopasolas como "uma ruptura que impressiona".

"O Sahel se tornou, dentro do espectro das esquerdas, dos movimentos populares ao redor do mundo, uma prioridade no momento porque representa uma revolução em curso. É uma ruptura que impressiona porque desde, talvez, [Muammar] Kadhafi, […] [Thomas] Sankara, lá em 1980, não tinha tido um movimento tão efetivo de ruptura contra as forças colonialistas e ocidentais no continente africano."

Stopasolas explica que, desde o início da revolução na região, os países passaram a desfrutar de uma série de avanços sociais, como saúde gratuita e queda de preço de alimentos e itens de construção civil, como cimento. Na visão do jornalista, essa é uma grande vitória para a população mais pobre, mas que ainda carece de apoio internacional.

"Acho que tem uma presença muito forte ali da Rússia, da China, mas o Brasil deveria participar mais, tem muito a oferecer em parcerias com esses países."

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O começo do fim do imperialismo

Embora Burkina Faso, Mali e Níger tenham conquistado a independência da França em 1960, as mãos de Paris continuaram pairando por décadas sobre as nações africanas. Apesar de, no papel, a metrópole não ter mais influência sobre as colônias, na prática, pouca coisa mudou.
Stopasolas conta que o urânio do Níger, que provia energia elétrica a um terço da França, era vendido a Paris por US$ 0,80 (cerca de R$ 4,27 na cotação atual) o quilo. Os franceses, por sua vez, compravam o urânio canadense por uma quantia muito maior: US$ 200 (R$ 1.069,84 nos valores de hoje).

"O Níger não tinha acesso à energia elétrica regular. O país convivia com muitos apagões. Setenta porcento da energia do Níger, apesar de ser imenso, ter uma riqueza em torno do urânio imensa, dependiam da Nigéria. Eles não tinham como processar esse urânio, como desenvolver acesso de energia elétrica às suas regiões. Enquanto isso, a França iluminava, literalmente, a torre Eiffel com esse urânio."

Essa sensação de um neocolonialismo francês fez com que as juventudes das nações da AES se revoltassem e buscassem um novo destino. A revolução, todavia, ainda esbarrava na necessidade desses países de se proteger de grupos terroristas que atuam no Sahel.
O jornalista do Brasil de Fato explica que essas organizações começaram a surgir na região após a guerra na Líbia e a morte de Kadhafi, no início da década passada, levantando questionamentos do envolvimento do Ocidente nessa instabilidade.

"O Kadhafi era um grande líder regional, tinha muita vinculação com as lutas e com esse pan-africanismo no Sahel. Era um grande lutador pela União Africana. E, para derrubar Kadhafi, a Organização do Tratado do Atlântico Norte [OTAN], a França e os Estados Unidos levaram mercenários, ramificações da Al-Qaeda [organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países] e de outros grupos terroristas, que lutaram para derrubar Kadhafi. Estudos e lideranças colocam que, após essa morte de Kadhafi, muitas dessas ramificações da Al-Qaeda descem para a região do Sahel."

Além da Al-Qaeda, Stopasolas conta que núcleos do Daesh (organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países), além de mercenários estrangeiros, como da Ucrânia, atuam na região. Segundo o jornalista, o líder de Burkina Faso, Ibrahim Traoré, denunciava que as bases francesas no Sahel tinham como principal objetivo proteger os negócios de empresas francesas, em vez de combater, efetivamente, esses grupos terroristas.
"A população reclamava que ninguém sabia o que acontecia nessas bases francesas, se de fato havia um combate ou o que existia ali. Era praticamente um território estrangeiro no país deles. Todo esse contexto, aliado ao aumento dessa violência, fez com que as bases militares, primeiramente, fossem o símbolo dessa ruptura."
A expulsão francesa do Sahel fez com que novos acordos de cooperação no campo da segurança fossem assinados pelo presidente da França, Emmanuel Macron, com países africanos. Na Costa do Marfim e em Senegal, por exemplo, não há mais bases fixas das forças de Paris, que agora atuam com assessoria de inteligência e bases móveis.
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Rússia no Sahel

Os conflitos mundo afora envolvem cada vez mais tecnologia — e não é diferente no Sahel. As organizações terroristas que atuam na região utilizam drones e rastreamento por satélite para atacar as tropas da AES, conta Stopasolas, que destaca que a Rússia tem se empenhado em munir Burkina Faso, Mali e Níger no combate ao terrorismo com drones e outros equipamentos de ponta.

"A Rússia também tem o papel de facilitar o acesso a esses satélites de leitura geoespacial dessa região onde o terrorismo atua. Essa nova fase envolve a necessidade, também, de tecnologia para esses países enfrentarem esses grupos terroristas."

O jornalista enfatiza que os líderes dos países no Sahel não enxergam a relação com a Rússia como imperialista, mas, sim, de parceria entre as nações.
Essa percepção positiva diante da postura de Moscou é histórica — desde o não envolvimento do Império Russo na Conferência de Berlim até o apoio da União Soviética aos chefes pan-africanistas perseguidos no último século, passando também pelo papel dos países na Segunda Guerra Mundial.

"[Traoré levanta] Essa questão da luta conjunta contra o nazismo na Segunda Guerra, de como os seus antepassados foram enviados forçadamente para lutar contra o nazismo, pela França, e como esse enfrentamento para, de fato, derrubar o nazismo, foi feito pelos africanos com os russos. Há uma ligação na qual a luta conjunta aproximou esses povos."

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