- Sputnik Brasil, 1920
Panorama internacional
Notícias sobre eventos de todo o mundo. Siga informado sobre tudo o que se passa em diferentes regiões do planeta.

Chantagem ou cooperação: soberania argentina pode estar à venda com aporte financeiro dos EUA

© AP Photo / Alex BrandonO presidente Donald Trump cumprimenta seu homólogo argentino, Javier Milei, na Casa Branca. Washington, D.C., EUA, 14 de outubro de 2025
O presidente Donald Trump cumprimenta seu homólogo argentino, Javier Milei, na Casa Branca. Washington, D.C., EUA, 14 de outubro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 14.10.2025
Nos siga no
Especiais
O presidente da Argentina, Javier Milei, visitou nesta terça-feira (14) a Casa Branca, pela primeira vez no governo de Donald Trump. Com a economia em frangalhos, o chefe da Casa Rosada segue em busca de aportes financeiros, mas as condições norte-americanas podem ter um alto custo, conforme especialistas.
Milei e Trump estiveram juntos também no mês passado, às margens da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Após a reunião entre os líderes, o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, confirmou a negociação de um apoio financeiro de US$ 20 bilhões a Buenos Aires.
Ele também revelou que os EUA comprariam títulos da dívida argentina caso a situação assim exigisse, e que a ajuda poderia incluir ainda um crédito direto por meio do Fundo de Estabilização Cambial.
Já após o encontro desta terça, Bessent mencionou as eleições legislativas na Argentina e disse esperar que Milei siga implementando reformas em seu país. Já Trump preferiu ressaltar que, caso Milei não saia vitorioso, "não seremos generosos com a Argentina."
#726 Mundioka - Sputnik Brasil, 1920, 14.10.2025
Mundioka
Argentina no muro: ajuda ou agiotagem dos EUA?
A reunião na Casa Branca marcou a quarta vez que Milei e Trump se encontraram em menos de um ano. A proximidade, segundo especialistas ouvidos pelo Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, reafirma o alinhamento já explicitado em declarações, sobretudo pelo lado argentino.
Em relação à dependência do crédito norte-americano, Matheus Pereira, professor de relações internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), afirma que esse é um traço histórico da economia argentina, e a importância de Washington nessa questão já é costumária.
Entretanto, o que está sendo feito neste momento é uma linha de ação política que "reforça outros aspectos dessa dependência, para além da questão estritamente financeira".
O especialista recorda que, em outros momentos da história, a Argentina teve governos mais alinhados aos Estados Unidos, como a gestão de Mauricio Macri (2015–2019) e Carlos Menem (1989–1999), mas "os níveis de submissão aos Estados Unidos" apresentados por Milei, ao seu ver, são "inéditos".
O presidente argentino Javier Milei participa de uma sessão conjunta do Congresso para declará-lo oficialmente, junto com sua companheira de chapa, vencedores do segundo turno das eleições presidenciais, em Buenos Aires, Argentina, 29 de novembro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 16.09.2025
Panorama internacional
'Cortando um dobrado': governo Milei enfrenta pior crise com escândalo de corrupção e economia frágil

Apostar alto na relação com os EUA terá consequências?

Conforme o analista, a imprevisibilidade que o governo Trump apresenta até aqui, por si só, já é um fator de risco a ser levado em conta pelo lado argentino e pode atrapalhar Milei a fechar a conta no fim do mês.
Se os acordos não forem executados, a tendência, segundo Pereira, é o retorno de um filme já visto antes pela população: fuga de capitais.
Isso produzirá a necessidade de o governo impor restrições à saída de dólares e ao câmbio, e consequentemente desencadeará "o aumento da inflação, o aumento da pobreza, uma precarização geral das condições de vida do país", explica o internacionalista. "Esse filme já passou várias vezes ao longo da história argentina."
Outro eventual prejuízo que poderia ocorrer a partir de um alinhamento muito estrito, sobretudo a depender das condições para chegar a um acordo, seria um isolacionismo da Argentina no cenário internacional, segundo explica Regiane Bressan, professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

"Quando a Argentina se isola ou se alinha muito diretamente com os Estados Unidos, com um governo tão controverso, de Trump, a gente pode imaginar o quê? Que a Argentina vai sofrer um isolamento e até um constrangimento internacional, ou seja, não vai vir uma retaliação direta contra a Argentina, mas um constrangimento em que eles vão ter dificuldades, por exemplo, de novos parceiros econômicos e comerciais."

Estudante segura um desenho representando o presidente Javier Milei durante protestos por mais financiamento para universidades públicas em Buenos Aires, Argentina, em 12 de novembro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 04.02.2025
Panorama internacional
Milei quer provar subordinação a Trump, mas EUA dificilmente substituiriam o Brasil, dizem analistas

Argentina pode cortar relações com a China?

Em entrevista ao canal Fox News no último sábado (11), Bessent disse que Milei é um grande aliado dos EUA e estava comprometido em expulsar a China da Argentina, "que está em toda a América Latina". A declaração foi dada logo após o secretário do Tesouro norte-americano confirmar o repasse de recursos a Buenos Aires.
Embora narrativas desse tipo sejam ventiladas em vários momentos no cenário da política norte-americana, Pereira atesta que, se os Estados Unidos insistirem nessa condição, ela estará fadada ao fracasso.
"Não existe possibilidade de o governo Milei romper relações comerciais com os chineses. Se ele pudesse fazer algo dessa natureza, já teria feito", afirma o professor, ressaltando que a China é pauta de boa parte das exportações do país.
Já Bressan ressalta que a Argentina ainda depende do swap cambial com a China, mas, ao mesmo tempo, enfrenta a pressão dos Estados Unidos para romper com esse acordo bilateral. Para ela, a postura dos Estados Unidos evidencia que a crise financeira na Argentina está sendo testada para reforçar a influência de Washington na América do Sul.

"Isso é visto como uma violação da soberania econômica. O país, portanto, estaria sendo forçado a escolher um parceiro comercial ou financeiro em detrimento de outro, para obter auxílio, minando, claro, a sua autonomia, a sua soberania", explica a especialista.

Apoiadora de Javier Milei com bandeiras da Argentina e do presidente eleito, em 15 de novembro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 30.04.2024
Panorama internacional
Apesar de falas de Milei, Argentina e China concordam em aprofundar relações, diz ministra argentina

Militares norte-americanos em território argentino: condição é possível?

Javier Milei já teria autorizado a entrada de militares norte-americanos no país para exercícios conjuntos. Segundo especulações, a instalação de militares dos Estados Unidos na Argentina seria uma das condições para o aporte financeiro desejado por Bueno Aires.
Entretanto, o decreto presidencial não é suficiente para permitir a entrada de tropas estrangeiras no país. Segundo a Constituição argentina, é necessário aval do Congresso.
Como Milei não goza de maioria no Legislativo — seu governo vem sofrendo derrotas e pode perder ainda mais base de apoio nas eleições deste mês —, Pereira avalia que o presidente argentino não deverá conseguir implementar a medida.
Polícia tenta conter manifestantes de torcidas organizadas que protestavam perto de um mural com as imagens dos jogadores nacionais Lionel Messi e Diego Maradona. Buenos Aires, 12 de março de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 08.04.2025
Panorama internacional
Torcidas organizadas contra Milei: nova frente popular pode mudar rumo da oposição na Argentina?
Bressan, por sua vez, ressalta que aceitar essa condição teria um custo alto para a população argentina e também para o governo Milei.

"Para grande parte da população e da oposição política, a presença militar americana seria vista como uma entrega de soberania e um retorno às políticas da esfera de influência. Ou seja, isso alimenta narrativas de que o país está sendo forçado a se curvar aos interesses hegemônicos dos Estados Unidos para resolver sua crise financeira."

Nesse sentido, na análise da especialista, um alinhamento direto com os Estados Unidos no campo militar fortaleceria a oposição doméstica e levaria a mais protestos nas ruas. Milei perderia até o apoio de partidos que hoje compõem sua base, o que seria um mau negócio internamente para o mandatário.

"A venda da soberania seria um ponto central, já que, no seu desespero por dólares, por tentar acalmar essa crise econômica que volta à Argentina com tudo, a oposição vai acusá-lo de trocar a soberania nacional por dinheiro dos Estados Unidos", finaliza.

Logo da emissora Sputnik - Sputnik Brasil
Acompanhe as notícias que a grande mídia não mostra!

Siga a Sputnik Brasil e tenha acesso a conteúdos exclusivos no nosso canal no Telegram.

Já que a Sputnik está bloqueada em alguns países, por aqui você consegue baixar o nosso aplicativo para celular (somente para Android).

Feed de notícias
0
Para participar da discussão
inicie sessão ou cadastre-se
loader
Bate-papos
Заголовок открываемого материала