As baixas vão aumentando, embora a ritmos cada vez menores, apesar da criação de documentos tais como os acordos de Minsk, destinados a encontrar uma solução pacífica para esta desavença. Ademais, os analistas estão dando um novo alarme: os passos recentes do governo de Poroshenko podem fazer com que as ações militares que devoraram o leste ucraniano na primavera de 2014 ganhem novo fôlego.
Como surgiu o conflito
Quatro anos atrás, os protestos na Praça de Independência em Kiev, mais conhecidos como Maidan, entraram em sua fase final, envolvendo inclusive tiroteios fatais que resultaram na morte de 53 pessoas — 49 manifestantes e 4 agentes das forças de segurança ucranianas.
Na época, os apoiadores do Maidan culparam dessa tragédia as forças do governo, embora esta versão nunca fosse comprovada por qualquer evidência. Pelo contrário, surgiam cada vez mais provas que o fogo tinha sido aberto por franco-atiradores da oposição; além disso, uma das investigações recentes da Sputnik sobre os supostos mercenários georgianos fala em favor deste cenário.
Na sequência dos tumultos, o então presidente ucraniano, Viktor Yanukovich, se recusou de fato a oferecer resistência, firmando um acordo com os representantes de oposição em 21 de fevereiro de 2014 sobre eleições antecipadas e fugindo do país sob pressão de ameaças.
O problema é que as regiões orientais, especialmente as de Donetsk e Lugansk, que são historicamente mais vinculadas com seu vizinho, a Rússia, não se viram nada em sintonia com os manifestantes e sentiram que seus direitos, especialmente os relacionados com a língua russa e as relações com Moscou, estavam ameaçados.
Primeiramente, tentaram promover a ideia de federalização e a de um status especial, continuando como parte da Ucrânia (vale ressaltar que estas ideias soavam ainda na década de 90, porém, passaram despercebidas para o governo), mas, após se terem deparado com a resistência do novo poder, passaram à declaração de sua independência de modo unilateral.
Assim se formaram a República Popular de Donetsk (RPD) e a República Popular de Lugansk (RPL).
Em resposta a isso, o governo ucraniano lançou uma "operação antiterrorista" nas respectivas áreas que, se encontrando com o antagonismo por parte dos independentistas, se transformou em um conflito armado de larga escala.
Claro que as ações militares ativas no leste da Ucrânia e a anarquia que reinava em várias partes da Ucrânia não poderiam ser ignoradas nem pelo seu vizinho, nem pelas maiores potências europeias que anteriormente tinham prometido a Kiev que a acolheriam na sua grande "família", ou seja, na União Europeia.
Ademais, a retórica em torno do conflito em Donbass se tornou em uma ferramenta geopolítica para a comunidade internacional, com inúmeras acusações lançadas contra Moscou, que tem por repetidas vezes descartado a presença de tropas suas na região.
Deste modo, em setembro de 2014 foi alcançado o primeiro resultado para a pacificação do leste ucraniano, o Protocolo de Minsk.
As cláusulas do documento, de fato, refletiam todo o necessário para pôr fim à guerra, inclusive a retirada dos armamentos pesados, o início de uma supervisão internacional na área e um diálogo entre Kiev e as repúblicas autoproclamadas, entre outras.
Entretanto, a eficácia do documento deixou muito a desejar e este começou logo a ser violado por ambos os lados. Por isso, as partes envolvidas no acordo passaram a se debruçar sobre um documento novo, que está em vigor até hoje, o chamado Minsk-2.
Por que nova lei é perigosa
Passados quase 4 anos desde o início das ações militares, fica evidente que os independentistas não estão dispostos a ceder. Deste modo, para o governo de Kiev restam de fato duas opções — aceitar as respectivas exigências e tentar negociar com as repúblicas, por pouco que o queira, ou forçar estas regiões a obedecer, quebrando deste modo todas os compromissos assumidos e arriscando iniciar uma verdadeira guerra civil no seu país.
Ora, os recentes passos do governo de Poroshenko indicam que este está optando pela segunda opção. Assim, em 20 de fevereiro de 2018, o presidente ucraniano assinou uma lei que estabelece a "reintegração de Donbass", onde os territórios em questão se qualificam como "ocupadas" e a Rússia é 20 vezes chamada de "agressora".
Ademais, a lei garante de fato ao presidente o direito de autorizar o uso da força militar em qualquer parte do país sem aval do parlamento. Kiev se apressou a manifestar que o documento não entra em discordância com o Minsk-2 que, contudo, não é lá mencionado nem uma única vez. Mas será que o "reforço da base legal para o uso das Forças Armadas" contribui para a desmilitarização da região e a chamada "reintegração" — para o diálogo em pé de igualdade?
De fato, Kiev nem o tenta abafar e escreve, em branco e preto, que a lei visa "aperfeiçoar os mecanismos legislativos para a restauração da integridade territorial" do país e "opor resistência à agressão russa" por via militar.
Assim, o conflito entra de novo em uma fase que parece mais decisiva. Agora, das ações de Kiev depende se o leste ucraniano mergulhará em uma guerra implacável com uma suposta intervenção de forças alheias, ou se o processo de paz ainda não será completamente arruinado pelas ambições políticas do governo central.