Cruzada da Rússia contra o dólar parece ser séria

A Rússia vendeu em abril metade de seus títulos do Tesouro dos EUA, se livrando assim de 50% de seus reservas internacionais em dólares e mostrando que os títulos dos EUA já não são atrativos. Por que o Banco Central russo tomou essa decisão? Será que a China pode fazer o mesmo?
Sputnik

Segundo os dados publicados pelo Departamento do Tesouro dos EUA, o Banco Central russo vendeu títulos do Tesouro dos EUA no valor de 47,5 bilhões de dólares (R$ 170 bilhões), reduzindo assim seus investimentos nesses ativos para 48,7 bilhões de dólares (R$ 185 bilhões), equivalente a 10% do total das reservas internacionais do Banco da Rússia.

De um dia para outro, Moscou passou de 18º para 22º na lista dos principais compradores da dívida norte-americana, segundo os dados publicados pelo Departamento do Tesouro dos EUA. Embora a Rússia nunca ocupasse o primeiro lugar na lista, esse valor de 10% do total das reservas pode ser considerado mísero, explicou a analista Natalia Dembinskaya.

Uma decisão estratégica

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Os especialistas sublinham que a venda massiva de títulos dos EUA por parte da Rússia é uma resposta à pressão das sanções norte-americanas que foram introduzidas contra Moscou em abril. 

"O Banco Central russo deixa bem claro: Moscou não está disposta a financiar o orçamento de um país que pratica abertamente uma política hostil", sublinhou Dembinskaya.

A medida não apenas resulta lógica do ponto de vista político, mas também do econômico. Depois da adoção de sanções contra a empresa de alumínio russa Rusal e outras grandes empresas russas, o mercado financeiro russo sofreu um colapso.

Para Mark Goighman, analista da empresa Teletrade, a venda dos títulos do Tesouro dos EUA em abril esteve relacionada, sobretudo, com a adoção de sanções contra o próprio país e contra as empresas russas.

De fato, esta é uma decisão que visa responder não apenas às sanções que já estão em vigor, mas também às que podem vir a seguir. 

Não apenas sanções

Entretanto, as sanções podem não ser a única razão pela qual a Rússia decidiu se livrar de seus títulos de dívida pública dos EUA, sublinhou Roman Blinov, diretor do departamento de análise do Centro Internacional de Finanças em Moscou.

"As sanções são apenas metade dos problemas. Existem outros fatores como o aumento da taxa de juros pelo Fed [Banco Central dos EUA] que também influi na rentabilidade dos títulos de Tesouro norte-americano", acrescentou Blinov.

Rússia se livra de metade de seus títulos de dívida pública do Tesouro dos EUA
O fato de que a Rússia se livrou das obrigações do Tesouro dos EUA significa que o país agora é menos dependente dos EUA. Nos últimos tempos, a Rússia tem escolhido o ouro, ativo que é responsável por 18% das reservas do país. Esse passo ajuda a Rússia a se defender dos riscos monetários.

"É um seguro contra as sanções e, evidentemente, uma oportunidade para ganhar dinheiro", explicou ela.

Todos os analistas acreditam que a venda dos títulos dos EUA pela Rússia não tem precedentes. O país nunca vendeu tantos títulos, nem mesmo em um ano.

No fim de abril, quando a taxa de rendimento dos títulos do Tesouro dos EUA a 10 anos superava os três por cento e o valor das próprias obrigações baixou, os participantes do mercado entenderam que isso iria provocar o aumento das taxas de juro. "É um cenário que provoca receios sobre o futuro colapso do mercado", disse o proeminente investidor Jeffrey Gundlach.

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A China pode ser a seguinte 

Os analistas avisam que, se Washington continuar a sua guerra comercial contra a China, Pequim poderá adotar a mesma decisão que a Rússia no que se refere à venda dos títulos do Tesouro. Esse cenário será ainda mais desolador, tendo em consideração que a China, apesar de suas divergências com Washington, é o maior comprador da dívida norte-americana. 

Em 2017 a China já se livrou de uma quantidade de títulos superior à dos anos anteriores. Se a China continuar a venda, essa medida pode custar caro à economia norte-americana. Outros países poderiam seguir o exemplo de Pequim e desferir outro golpe contra a supremacia dos Estados Unidos no sistema económico internacional.

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