Venezuela corta 5 zeros do bolívar: matemática de Maduro pode resolver crise?

O Banco Central da Venezuela põe em circulação as novas cédulas de bolívar, eliminando 5 zeros da moeda nacional. A Sputnik Brasil conversou com o economista Mauro Rochlin sobre os impactos da medida, e se a simples mudança na moeda será suficiente para arrumar a economia venezuelana.
Sputnik

Enfrentando uma grave crise política e econômica, o presidente Nicolás Maduro ordenou o corte de zeros no bolívar numa das tentativas de reverter a hiperinflação, que vem gerando grandes problemas sociais e a migração de venezuelanos para países vizinhos, como o Brasil e a Colômbia. 

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A entrada em vigor da nova moeda foi originalmente agendada para 4 de junho, com 3 zeros a menos. Mas o Governo adiou o evento duas vezes, a última delas em 25 de julho, já com 5 zeros a menos, diante de uma inflação projetada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) em 1.000.000% em 2018. A nota mais alta, de 500 bolívares, é equivalente a 50 milhões de bolívares atuais.

O professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), economista Mauro Rochlin, em entrevista à Sputnik Brasil, explicou a origem da crise da Venezuela no contexto das políticas de distribuição de renda do país. Segundo ele, as medidas de cortar os zeros da moeda nacional não surtirão efeito. 

"Na minha opinião, as medidas são completamente inócuas. O problema venezuelano é um problema de emissão exagerada de moeda. O Estado venezuelano é hoje dono de um déficit orçamentário bilionário. O Estado não é capaz de arrecadar o necessário para cobrir as suas despesas; as políticas de gastos do governo vêm comprometendo as contas públicas há muito tempo", explicou. 

"O governo vem gastando o que não pode já há alguns anos. Durante muito tempo o governo pôde mover políticas de transferência de renda para camadas mais carentes da sociedade, e isso era financiado a partir das receitas do Estado com a exploração do petróleo, porém a queda no preço do petróleo, associada à queda da própria produção venezuelana comprometeu essas receitas, e o Estado continua mantendo esses programas de transferência de renda à custo da impressão de moeda", acrescenta o economista. 

Segundo ele, "enquanto o Estado venezuelano continuar gastando muitíssimo mais do que arrecada, enquanto ele continuar financiando esse déficit com emissão de moeda, os preços vão continuar subindo".

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Ainda de acordo com o especialista, as medidas adotadas pelo governo da Venezuela não terão nenhum efeito e nem conseguirão trazer algumas melhoras momentâneas na inflação do país. 

"Não vai acontecer exatamente nada, porque o novo sistema simplesmente, em termos sintéticos, se limita a cortar zeros da moeda, e não ataca a raiz do problema. Ou seja, continua mantendo o Estado como um grande financiador da sociedade, e esse financiamento vai continuar sendo feito através da emissão de moeda e nada mais. Então não consigo imaginar nenhum benefício que essa medida possa ter no curto prazo", destaca. 

O economista aponta que a medida de cortar os zeros da moeda nacional tem como pano de fundo a dificuldade da população de lidar com valores astronômicos "em termos matemáticos". 

"Hoje na Venezuela produtos como arroz, carne, vegetais, que custam milhões de bolívares, e esses valores são devido à alta de preços. Na verdade, o que está se fazendo é um procedimento matemático, que é simplesmente cortar 5 zeros de todos os valores. Ou seja, os preços relativos continuam os mesmos […] o que vai acontecer é uma facilitação para se lidar com a moeda", completou Mauro Rochlin. 

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