Nesta terça-feira, centenas de policiais civis de várias partes do país ocuparam o gramado do Congresso Nacional em Brasília, tendo a Reforma da Previdência proposta pelo governo como principal alvo de suas reclamações.
"O objetivo é manifestar a insatisfação da categoria policial em relação à proposta da nova Previdência (PEC 06/2019), apresentada pelo governo federal, que desconsidera as particularidades e peculiaridades da atividade de risco desempenhada pelos servidores de segurança pública. Aposentadoria policial não é privilégio. É direito", afirmaram os manifestantes por meio de um comunicado.
Em entrevista à Sputnik Brasil, o dirigente do Sindicato dos Policiais Civis do Rio de Janeiro (Sinpol-RJ), Fernando Bandeira, confirmou que o ato teve em boa dose uma crítica ao governo Bolsonaro, que apresenta "falhas no atendimento aos trabalhadores da segurança pública".
"Estamos reivindicando melhores condições de trabalho e um maior efetivo. As delegacias hoje têm um efetivo muito pequeno e precisam de mais condições […]. Hoje o policial civil, para se aposentar, tem que trabalhar até os 55 anos. Se entrou com 21, 23 anos, tem que completar isso e essa obrigatoriedade é muito prejudicial. Se trabalhou 30 anos, trabalhou até demais. É um trabalho perigoso", explicou Bandeira.
O representante dos policiais civis do Rio reforçou que não se pode aceitar que direitos sejam retirados da categoria, que hoje não vem recebendo o devido respeito, segundo ele. "Estou há mais de 35 anos na polícia e nunca vi um efetivo tão pequeno", acrescentou, pedindo que o governo entenda que é preciso de uma polícia investigativa forte, já que, sem isso, não é possível que a Justiça condene criminosos em benefício da população.
Ainda de acordo com Bandeira, o governo Bolsonaro teve poucos contatos com os representantes da Polícia Civil pelo país, porém ele não é o único culpado, cabendo a responsabilidade ser dividida com os governadores de cada estado do país.
"Houve alguns contatos tanto em Brasília como em outros estados, mas não houve um atendimento. Ficou em algo mais superficial. Temos a expectativa de que o governo federal e, principalmente, os governadores nos atendam […]. No Rio não tivemos contato [com o governador Wilson Witzel], sem qualquer resposta", comentou.
Previdência e desmilitarização
Tolhidos por um código interno comum às Forças Armadas, os policiais militares têm menos liberdade para participar ativamente de manifestações, e são proibidos de se organizar em sindicatos ou realizarem greves. Contudo, isso não impede que os agentes também não estejam temerários quanto à Reforma da Previdência.
Foi isso que revelou à Sputnik Brasil o pesquisador e coronel da reserva da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, Robson Rodrigues. Segundo ele, os agentes da caserna estão hoje mais conscientes dos seus direitos e expressam, dentro da legalidade, as suas posições críticas ao governo.
"Com relação a essas manifestações dos policiais civis, acho que são bastante positivas, e em um cenário democrático, os policiais como cidadãos têm esse direito de se manifestar. Embora tenhamos legislações anacrônicas aos militares, eles hoje também estão mais conscientes e têm se manifestado através de sites, redes sociais, de maneira muito responsável, sobre o que preocupa a categoria", declarou.
Rodrigues ponderou que, em linhas gerais, os oficiais da PM atuam por 30 anos no serviço ativo antes de irem para uma reserva remunerada – o correspondente à aposentadoria –, salvo alguns casos que envolvam funções de confiança, como como comandante-geral ou chefe de estado-maior, por exemplo.
O coronel da reserva revelou, todavia, que há uma preocupação sobre eventuais perdas de conquistas que possam vir com a Reforma da Previdência sugerida pelo governo Bolsonaro. E o descontentamento não envolve apenas os direitos dentro da PM, mas também com o atual estado do funcionamento da corporação.
"Há um dilema aos policiais. A maior parte dos PMs é formada por praças que desejam o fim do militarismo da corporação, que apresenta muito cerceamento e há um pleito para que isso seja transformado. Isso já foi constatado por pesquisa […]. Há este pleito, mas em contrapartida há a preocupação pela perda de conquistas no âmbito da Previdência", concluiu.