Buscando uma reconciliação com uma das maiores potências da atualidade, e em meio a disputas entre Washington e Pequim, o chefe de Estado brasileiro visitou o seu homólogo chinês, Xi Jinping, e recebeu dele uma promessa de intensificação das trocas bilaterais.
Apesar de acusações feitas à China antes de assumir o cargo e de anunciar aos quatro ventos um alinhamento automático aos Estados Unidos, Bolsonaro conseguiu, em Pequim, assinar vários protocolos oficiais, para acordos nas áreas de ciência e tecnologia, economia, comércio, energia, infraestrutura, agropecuária, relações exteriores e educação.
Recebido com todas as pompas inerentes ao cargo que ocupa, o atual presidente brasileiro se disse "orgulhoso" pela oportunidade de visitar a China, para a qual tentou vender a ideia de um Brasil que pode ser um "mar de oportunidades" para os chineses. Mas, para alguns críticos, a viagem acabou não rendendo muitos resultados concretos.
Para o diplomata Fausto Godoy, ex-embaixador em países da Ásia e professor de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo, a visita de Jair Bolsonaro à China pode ser vista, em primeiro lugar, como uma tentativa de ampliar uma parceria estratégica iniciada ainda em 1993, baseada principalmente em uma necessidade chinesa de garantir sua segurança alimentar.
Em entrevista à Sputnik Brasil, o especialista opina que, no seu entendimento, o presidente brasileiro foi tentar intensificar esse perfil e, ao mesmo tempo, "procurar espaços alternativos".
"Eu acho que a ampliação do comércio bilateral nessa área foi muito importante. Inclusive, entre os oito atos que foram assinados agora em Pequim, dois dizem respeito a produtos agrícolas. Um é jerk beef, que é carne processada, e outro é farelo de algodão. Maravilha. Agora, também entrou nessa visita um assunto que parece muito importante, que é energia renovável, quero dizer etanol. Por que etanol? Recentemente, a China abriu espaço para um acréscimo de 10% de etanol na gasolina. Agora, você imagine a quantidade de etanol necessária para alimentar todos os automóveis chineses", comentou Godoy.
De acordo com o diplomata, um assunto mais importante nas relações com a China, que ainda não foi tocado dessa vez, diz respeito à tecnologia 5G, sobre a qual o presidente Bolsonaro já disse que pretende aguardar a melhor oferta e que não se posicionará na atual disputa entre Pequim e Washington.
"Eu acho que é o futuro do mundo, e a China está na frente dos Estados Unidos, e nós sabemos da história toda da Huawei, que é a grande empresa tecnológica nessa área, com imbróglio nos Estados Unidos."
O ex-embaixador acredita que há, atualmente, grandes oportunidades para o desenvolvimento das relações entre os dois países, mas a questão é saber até que ponto "as questões ideológicas podem travar todo esse impulso", já que, segundo ele, o Brasil atual demonstra um certo retrocesso no que diz respeito ao pragmatismo diplomático, que coloca os interesses nacionais acima das ideologias.
Também em entrevista à Sputnik Brasil, Marcus Vinicius Freitas, professor de Relações Internacionais e de Direito Internacional Público da Universidade de Relações Exteriores da China, em Pequim, afirma que, dada a importância da China para a economia brasileira, o presidente brasileiro já deveria ter realizado uma visita ao país asiático há mais tempo, "para avançar uma pauta mais rápida entre os dois países".
Segundo ele, independentemente desse atraso, essa viagem serviu sobretudo para separar o chefe de Estado Bolsonaro do candidato Bolsonaro, responsável pela criação de um certo mal-estar com Pequim quando, ainda durante o período de campanha e logo em seguida, adotou uma postura hostil em relação aos chineses.
"Eu acho que, nesse sentido, a avaliação é positiva, particularmente, quando nós olhamos para o futuro da relação", disse ele, destacando a importância desse entendimento bilateral não só para o Brasil, mas para todo o mundo.
Em termos concretos, Freitas considera que, além da questão agrária, o governo brasileiro também merece reconhecimento pelo acordo relativo ao intercâmbio de pesquisadores e estudantes e pela questão da isenção de vistos para cidadãos chineses.
"Essa abertura unilateral do Brasil neste momento, de alguma forma, dá para a China um sinal verde de que a relação pode se aprofundar. E não podemos esquecer que, hoje em dia, o mercado chinês é, sem dúvidas, o maior fornecedor de turismo no mundo."