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Ex-agentes das forças de segurança comentam relatório da OEA sobre violência policial no Brasil

Sputnik Brasil conversou com especialistas em segurança pública sobre o mais recente relatório da OEA, que apontou o aumento da violência policial no Brasil.
Sputnik

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), divulgou neste domingo (2) um comunicado com críticas às forças de segurança do Brasil.

Em seu documento a CIDH demonstra "profunda preocupação com os recordes históricos de ações policiais violentas registradas durante o primeiro semestre deste ano nos estados do Brasil e o seu perfil de discriminação racial".

Para o antropólogo e ex-instrutor do BOPE (unidade de elite da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro), Paulo Storani, a avaliação da violência policial no Brasil deve ser analisada com cuidado. O especialista afirmou que a situação na área de segurança pública enfrenta, de fato, graves problemas. Ele acredita, no entanto, que as razões seriam mais sociais, do que raciais.

"A causa é muito mais profunda e tem mais razões sociais, do que poderia se imaginar", alegou o ex-instrutor do BOPE à Sputnik Brasil. O entrevistado cobrou cautela na análise de que a polícia cometeria violência contra minorias étnicas ou de que atua de forma preconceituosa.

"As polícias militares no Brasil são instituições públicas [com contratação] mediante concurso [...] que reúnem a maior diversidade de etnias da população. Principalmente negros e pardos. Então nós estamos falando de instituições que têm nas suas fileiras pessoas de várias etnias, principalmente aquelas que são objeto do próprio relatório", disse Storani.

O ex-instrutor do Bope reconheceu a importância das organizações de direitos humanos, mas destacou a necessidade de uma maior responsabilidade na análise de dados e da forma como são apresentados e divulgados. Para ele, algumas organizações se orientam em uma "visão de mundo, em que todas as ações por parte do Estado, principalmente ações policiais" desconsideram as razões sociais da realidade.

"Não quero dizer que não haja violência policial. Mas quando [organizações de direitos humanos] determinam que existe violência policial contra negros e pardos, principalmente moradores de comunidades, desconsideram as próprias raízes sociais da forma de viver dessas pessoas. Quando na sua maioria, esses moradores são negros e pardos, sem dúvida nenhuma, por conta de uma razão social que remete à forma como a libertação de escravos foi feita e com a diminuição de oportunidades desde aquela época até hoje", afirmou.

Portanto, segundo ele, para a formação de uma polícia cidadã seria necessário melhorar as condições sociais, melhorar as oportunidades para todos, de modo a diminuir a desigualdade e permitir uma mobilidade social das pessoas que moram em comunidades.

Para Storani, o relatório passa uma imagem muito negativa do país e prejudica os esforços para construir e orientar um diálogo para a formação de uma polícia mais humana.

Oportunidade para reformular política de segurança pública

Sputnik Brasil também conversou sobre o tema com Robson Rodrigues, ex-chefe do Estado-Maior da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, comentarista de Segurança Pública e pesquisador da UERJ.

O pesquisador destacou a importância do relatório e sublinhou que o relatório, bem como a recente decisão do STF de proibir ações da polícia em comunidades no estado do Rio durante a pandemia de COVID-19 são uma oportunidade para reformular a política de segurança pública.

Robson Rodrigues destacou que o histórico de mortes praticadas por agentes policiais no estado do Rio caiu drasticamente com a decisão do Supremo. Além disso, ele destacou a diminuição do número de crimes em geral e de mortes de policiais inclusive, segundo relatórios do Observatório de Segurança Pública da Universidade Cândido Mendes. Para ele, isso prova que as operações violentas contra comunidades não teriam impacto no controle de crimes como homicídios e roubos e reduzem a violência em linhas gerais.

"Como política de segurança pública, [esse tipo de operação] precisaria ser reformulada. Evidentemente que essa oportunidade, criada pela decisão judicial, permitiu uma maior reflexão com a ausência desse fator. É preciso entender o que está acontecendo. Eu acredito que as polícias e Ministério Público e o próprio governo do estado tenham muito a contribuir para explicar isso com argumentos plausíveis a serem considerados, já que o discurso oficial era de que você sendo muito mais contundente e repressivo haveria uma redução da criminalidade. A gente já falava que não aconteceria, que não era isso que estava ocorrendo, e agora a gente tem por meio desses dados uma comprovação", afirmou o entrevistado à Sputnik Brasil.

O pesquisador afirmou que a decisão do STF é uma prova de que a situação atual não é sustentável e classificou a medida de "melhor política pública de segurança apresentada nos últimos meses". Essa decisão teria reforçado as atribuições do estado e das polícias, apesar dos números ainda seguirem altos.

"Essa oportunidade vivenciada no Rio de Janeiro pode ser um 'case' para ser observado melhor e talvez gerar reflexões em outras praças e outros estados, em outras organizações e instituições. Para que a gente, com todas as adversidades do nosso sistema de justiça criminal e do setor de segurança pública, com todas as falhas e problemas, poder incluir na agenda de reformulação e de reforma esse tipo de situação que aconteceu no Rio de Janeiro", afirmou o ex-chefe do Estado-Maior da Polícia Militar.

Para o especialista, as evidências de abuso policial no país são claras. Ele destacou a importância de um posicionamento das autoridades sobre o tema e destacou que as próprias instituições de segurança pública deveriam se pronunciar sobre o tema e gerar um debate interno sobre a questão.

"Essa questão deve ser colocada na forma de um debate reflexivo. Eu acho que é interessante e importante que se faça. Mas, com as devidas autocríticas para que a gente possa construir algo melhor. Acho que essa é uma oportunidade de um momento de reflexão para que a gente possa sair daqui para algo melhor. Lamentável vai ser se nós não tivermos nenhum movimento nesse sentido", concluiu Rodrigues.
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