O ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu na última sexta-feira (23) que o Brasil deveria poder fazer acordos comerciais sem precisar da autorização de países-membros do Mercosul.
O ministro destacou a importância da união dos países sul-americanos em acordos com blocos econômicos de outras regiões, mas disse que o Brasil quer "conversar sozinho" com o Canadá, Coreia do Sul, Japão e outros países.
Para Regiane Bressan, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), especialista em assuntos que envolvem países do Mercosul, a proposta de Guedes poderia trazer pontos positivos, mas também possui lados negativos.
"O Brasil poderia ganhar de um lado, em relação a esses acordos, poderia fazer acordos em pares, como ele já tentou fazer junto ao Uruguai. No entanto, o Brasil perderia com a concorrência que aconteceria em relação aos demais países do bloco. Por exemplo, o Chile poderia ganhar mais mercado na Argentina já que o Brasil, com o Mercosul, ainda possui uma preponderância, uma primazia em relação ao comércio argentino", explicou.
Paulo Guedes participou de uma sessão remota realizada pelo Senado Federal para debater e celebrar os 30 anos do Tratado de Assunção, que criou o Mercosul.
O encontro chamado de "Mercosul: avanços, desafios e perspectivas" reuniu a economista Zélia Cardoso de Mello, ministra da Economia, Fazenda e Planejamento do Brasil no período de 1990 a 1991, e o jurista Francisco Rezek, ministro das Relações Exteriores no período de 1990 a 1992, quando da assinatura do Tratado de Assunção. A iniciativa do debate partiu do senador Fernando Collor (Pros-AL), que presidia o país por ocasião da criação do Mercosul.
Regiane Bressan disse que as discussões sobre "flexibilização" do Mercosul ocorrem em um momento de antagonismo entre o Brasil e Argentina, principais países do bloco.
"Sabemos que as diferenças ideológicas acabam respingando na área econômica, senão afetando o andamento do próprio bloco. O posicionamento em relação às questões econômicas e ao direcionamento da política externa brasileira sobre a política externa argentina de fato acaba afastando os países", disse.
O discurso de "modernização" também é levantado por outros líderes do bloco. Em março, o presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, propôs, durante a cúpula de 30 anos do Mercosul, que se discuta formalmente a flexibilização do bloco.
O chanceler se referiu ao discurso do presidente Jair Bolsonaro durante a cúpula dos 30 anos do Mercosul que também pediu uma revisão da TEC.
'Flexibilização não significa que Mercosul esteja perto do fim'
Segundo Regiane Bressan, o governo brasileiro tem priorizado o comércio com países do chamado Norte global, como os Estados Unidos e países europeus.
"O bloco está passando por um momento em que os países estão se retraindo na região, sobretudo o Brasil, que está olhando muito mais para os países do Norte, priorizando os países europeus e os Estados Unidos, em detrimento daquela cooperação Sul-Sul, daquela retórica de Sul global", explicou.
Apesar das discussões sobre flexibilização do bloco, Bressan não acredita que o Mercosul esteja passando por uma crise derradeira e que possa chegar ao fim.
"É possível imaginar que com uma troca de governo, com novos interesses regionais, o bloco venha a ganhar força não somente na área econômica, mas também em outras frentes de atuação, como o interesse dos países do Mercosul em ratificar o acordo comercial com a União Europeia que está em negociação", completou.